SEF deteve mulher suspeita de traficar crianças de Angola

Menores são retirados às famílias e trazidos para Lisboa para seguirem para a Europa. Passadores recebem 5 a 6 mil euros
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Raquel tem 6 anos e foi colocada em frente a um homem que seria, supostamente, o seu pai, numa pequena sala do aeroporto de Lisboa. Os inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) perguntaram-lhe se aquele era, de facto, o seu pai, mas, timidamente, Raquel acenou negativamente com a cabeça. Foi o suficiente para confirmar a suspeita que tinha surgido quando, momentos antes, os polícias tinham observado a família no controlo de passaportes. Afinal, um falso pai, uma falsa mãe e uma falsa filha, todos vindos de Luanda.

A situação ocorreu em setembro no aeroporto da Portela. Aliás, Raquel já regressou à sua terra, o Uíge. Mas o caso levou a uma investigação, e confirmadas as suspeitas, o SEF conseguiu ontem deter uma mulher, de 43 anos, natural de Angola e residente na Amadora, por suspeita da prática do crime de tráfico de menores. A mulher tinha como missão receber Raquel em Portugal e encaminhá-la para França. Em comunicado, o SEF dava conta de que foram realizadas buscas em duas residências na Amadora e de que foi apreendida documentação diversa, telemóveis e "outros indícios de atividade criminosa". A mulher, empregada de limpeza, é também suspeita de "colaborar noutras situações de entrada e de encaminhamento de crianças na Europa".

O Serviço de Estrangeiros e Fronteira não tem dúvida de que se está perante uma "forma organizada de tráfico de menores de Angola para Portugal". Um fenómeno que identificou, pelo menos, há dois anos e que já levou a várias detenções e condenações (ver caixa). Fonte autorizada desta polícia disse ao DN que a situação está a causar "enorme preocupação", até porque ainda não se conseguiu saber "qual o objetivo deste tráfico", cujo destino é França. "Estamos a trabalhar com as autoridades francesas e angolanas. É uma grande angústia não se saber para que fim estas crianças são traficadas e até onde vai e o que pretende esta rede", justifica a mesma fonte. "Já houve um caso, que nos foi comunicado pela polícia francesa, de uma destas crianças ter sido encontrada perdida no metro de uma grande cidade. E isto preocupa-nos tremendamente", salienta.

Crianças vêm do Uíge

De acordo com o que soube o DN, inspetores da Unidade Anti-Tráfico de Pessoas do SEF estiveram naquele país africano a trabalhar com a polícia local. Tal permitiu perceber que a origem das crianças é a zona do Uíge, no norte do país, e que estas são retiradas às famílias, aparentemente com a sua conivência e com a dos líderes étnicos. Sabe-se também que são entregues a "passadores" que recebem entre cinco e seis mil euros.

Neste momento, o SEF tem seis inquéritos a decorrer, relacionados com esta rota de tráfico de menores e da qual faz parte Portugal. Fonte deste serviço classifica a investigação como de "grande complexidade". Até agora, já se conseguiu travar o tráfico de cerca de duas dezenas de crianças angolanas, mas "temos a certeza de que um número muito alto de menores já passou pela fronteira". Aliás, há um outro facto que leva o SEF a acreditar que a rede continua ativa: o de haver um número elevado de pedidos de visto para menores que pretendem viajar para Portugal.

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