Se tu ainda me amasses...

Mais do que as recente eleições regionais, que ditaram uma derrota amarga para o partido de Nicolas Sarkozy, o que tem agitado a França, nos últimos dias, são as notícias da imprensa internacional sobre a estabilidade do casamento do Presidente com a ex-top model e cantora Carla Bruni. A história teve origem no Twitter e uma das visadas garante que se trata de «um boato absurdo». <br />
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«CARLA BRUNI anda a dormir com Biolay # boato # Sarko encornado». Bastaram estes poucos caracteres escritos no Twitter para que os media franceses e, sobretudo, internacionais fossem inundados com a notícia de que algo estava a correr mal entre o casal presidencial francês. O tweet depressa saltou do microblogue onde nasceu para se transformar em notícia. E não só a primeira-dama foi acusada de manter uma relação extraconjugal com o cantor Benjamin Biolay, como o diário canadiano La Presse se apressou a dizer que a cantora e antiga modelo já havia voado com o amante para a Tailândia, para onde o Presidente Nicolas Sarkozy teria despachado um avião para recuperar a mulher infiel.

Especulações que a imprensa francesa, mais cautelosa, conseguiu evitar, não resistindo contudo a dar a notícia sobre as suspeitas de traição, tendo sempre o cuidado de sublinhar que se tratava de um boato lançado no Twitter. Já a imprensa britânica, sempre sedenta por escândalos pessoais sobre os políticos, foi mais longe e escreveu que, enquanto Bruni juntava mais um cantor à sua lista de namorados, Sarkozy encontrava consolo nos braços da sua colaboradora de longa data e actual secretária de Estado da Ecologia, Chantal Jouanno, a bela campeã de França de karaté. Coisa para levar Bruni a dizer, como numa das suas canções, «Si tu m’aimais encore…» («Se ainda me amasses…»). Talvez não.

Não foi preciso mais do que uma dúzia de caracteres escritos despreocupadamente no Twitter para lançar Biolay e Jouanno nas bocas do mundo. Praticamente desconhecidos fora do seu país, ambos viram-se assim inundados com telefonemas de jornalistas desejosos de obter uma reacção às alegadas infidelidades presidenciais. Tudo isto apesar de Carla Bruni se ter apressado a explicar, numa entrevista à televisão britânica Sky News, que toda esta história não passava de boatos.

A bela franco-italiana, de 42 anos, fez ainda questão de garantir que o amor que sente por Sarkozy continua tão forte como no primeiro dia, quando ambos se apaixonaram, em finais 2007, durante um jantar em casa do publicitário Jacques Séguela. Além disso, esta filha de aristocratas que deixaram a Itália para fugir às ameaças dos terroristas das Brigadas Vermelhas garantiu estar convencida de que o marido nunca a trairia. O Eliseu, por seu lado, preferiu não comentar um assunto pessoal da vida do Presidente.

Indignada ficou Chantal Jouanno. Esta mulher, casada e mãe dos pequenos Sibylle, Côme e Sixtine, pode até ter um cargo público mas gosta de manter a discrição. Alta e elegante, a morena Chantal, de olhos verdes profundos, aceitou responder às perguntas dos internautas no site do diário Libération. E a quem lhe perguntou que comentários tinha a fazer sobre os rumores que circulavam na imprensa britânica sobre a sua vida privada, respondeu: «É um boato absurdo e mesmo terrível porque não só põe em causa a minha honra, mas também porque afecta a honra da minha família.»

A proximidade entre a cabeça de lista da União para um Movimento Popular (UMP, o partido de direita do Presidente) por Paris nas regionais dos dias 14 e 21 – Jouanno chumbou no seu primeiro teste nas urnas – e Sarkozy parece ser a única explicação para que o seu nome tenha sido envolvido nesta história. Formada em Comércio Internacional, esta filha de um dono de uma fábrica de cartões de Vernon passou a adolescência em cima de um tapete de treino.

Doze vezes campeã de França de karaté (a última das quais já este ano quando, aos 40 anos, voltou à competição para vencer o campeonato por equipas depois de vários anos de afastamento das competições), Jouanno começou a carreira como assistente de exportações na Citroën, em 1988, com um área de negócios que abrangia a África e a América Latina.

Mais tarde, trabalhou para o Banco Internacional para a África Austral, mas a política depressa entraria na sua vida. É com um mestrado em Administração Económica e Social, tirado na Sorbonne, e formação em Ciência Política, na Escola Nacional de Administração, no currículo que Jouanno se apresenta à então ministra socialista do Trabalho Martine Aubry, em 1992, oferecendo-se para fazer um relatório sobre o trabalho transfronteiriço. E depois de uma breve experiência no gigante da energia francês EDF, esta mulher discreta volta à política, desta vez para o Ministério do Interior. Será aí que vai conhecer Sarkozy que em 2002, já ministro, a escolhe para escrever os seus discursos.

Apesar de ter tido pouco contacto com o novo patrão, Jouanno não hesita. «Quem não aceitaria esta oportunidade?», confidenciou, em 2008, ao Libération. Mais ou menos de direita, de orientação política pouco definida, Chantal Jouanno mergulhava assim nos corredores do poder. E de Sarkozy só tem elogios a fazer. Na mesma entrevista ao Libération, sublinhou a «coragem física e intelectual» do agora Presidente, além da sua «sensibilidade e humanidade». Mas reconhece que o neto de emigrantes húngaros que subiu a pulso na vida é um patrão «muito exigente».

Ao longo dos anos, e dos discursos, esta mulher de visual clássico e penteado sempre perfeito foi aprendendo a conhecer Sarkozy e a entrar na sua cabeça. «Ao início achava que lhe faltava profundidade. Mas aprendi a conhecê-lo», confessa. É também nos tempos que passa no Ministério do Interior francês que se interessa pelo ambiente. Primeiro por dever profissional, depois por convicção. «Chego a ser uma chata com os outros», confessa Jouanno sobre as suas preocupações ambientais. Mas a sua posição pretende «desideologizar» a questão e torná-la transversal, tanto em termos políticos como em termos geracionais.

Estas preocupações bem terrenas vêm-lhe desde a infância, quando a mais nova de duas irmãs via o pai trabalhar sem parar, mesmo que fosse domingo. «É uma pessoa de convicções», garantia em 2008 a então secretária de Estado da Ecologia, Nathalie Kosciusko-Morizet. Foi esta que Jouanno substituiu em Janeiro de 2009, tornando-se na nova «senhora Verde» de França. Desde então, mostrou-se empenhada em conseguir um acordo na Cimeira de Copenhaga sobre o Ambiente, mas mantém a sua política: só falar quando tem alguma coisa importante para dizer. «Um conselheiro quarentão, sem passado, qual é a sua legitimidade para se pronunciar?», perguntava-se há dois anos. Agora teve de vir a público pronunciar-se. E pela primeira vez sobre um caso mais pessoal do que político.

Habituado às luzes dos holofotes – em cima de um palco ou nas páginas das revistas cor-de-rosa, devido à sua relação com a actriz Chiara Mastroianni –, Benjamin Biolay também se viu agora catapultado para a imprensa estrangeira. O cantor, conhecido por não ter papas na língua, preferiu, desta vez, manter o silêncio. A verdade é que Benjamin Biolay, quando recebeu o prémio de artista francês do ano nas Victoires de la Musique, no início do mês, recebeu uma chamada de Carla Bruni a felicitá-lo. Nada de estranho entre colegas de profissão. Mas a relação de ambos não parece ir mais longe do que isso. E o casal presidencial já ameaçou processar por difamação todos os jornalistas que tenham escrito o contrário.

Praticamente desconhecido do grande público até ao ano 2000, quando a canção Jardin d’Hiver, composta e produzida por Biolay, tal como o resto do álbum, traz o veterano Henri Salvador de volta à ribalta, o artista só no ano seguinte se atreve a editar um álbum a solo. Rose Kennedy é uma história romanceada sobre o mais famoso clã americano que Biolay conta bem ao estilo indie pop, que mais tarde viria a torná-lo famoso.

Nascido em 1973, num meio popular, em Villefranche-sur-Saône, Biolay herda dos homens da família a sua paixão pela música. O bisavô paterno, trompetista na guarda republicana, foi quem começou a tradição, seguida pelo avô, baterista no paquete France, e pelo pai, clarinetista e membro activo da orquestra municipal. Foi deste último a ideia de inscrever o pequeno Benjamin nas aulas de violino. O menino depressa odeia aquele instrumento. Mas não a música. Aos 15 anos, consegue alguma independência ao ir estudar trombone para o conservatório, em Lyon. Sai de lá com dois dos primeiros prémios mas é graças à MTV que a pop entra na sua vida. A pop e a guitarra, o piano e uma série de outros instrumentos que aprende a tocar sozinho.

Como qualquer adolescente que gosta de música, Biolay não podia deixar de ter uma banda. Chegou a gravar um disco num concerto ao vivo. Sem sucesso. Este só chegaria com a ajuda de Hubert Mounier, o antigo membro do grupo L’Affaire Louis Trio conhecido sob o nome artístico de Cleet Boris. Será este a despertar a sua veia criativa e a obrigá-lo a compor. Será também da responsabilidade deste a ida de Biolay para Paris, em 1996.

Decidido a tentar a sua sorte, o jovem divide o tempo entre a escrita de canções e a biblioteca, onde devora livros sobre história e política, duas das paixões deste militante socialista confesso. Apesar do contrato com a EMI, seria preciso esperar pelo encontro com a cantora Keren Ann Zeider para a carreira de Biolay arrancar verdadeiramente. A química artística entre os dois é imediata e a parceria mantém-se em vários álbuns daquela.

Mas se a carreira de Biolay precisou de esperar até 2003 com o álbum Négatif, em que o dandy da canção francesa se revela, o casamento com Chiara Mastroianni já fizera dele uma estrela mediática. Afinal, não se é genro de Catherine Deneuve impunemente em França. Talvez influenciado pela mulher e pela sogra, Biolay dá entretanto os primeiros passos no cinema, em filmes como Didine ou Sang Froid.

Separado da filha de Deneuve com o falecido Marcello Mastroianni, Biolay começou este ano uma tournée internacional e uma série de concertos no Casino de Paris. Mas mais uma vez foi a sua vida privada – ou os boatos sobre esta – que voltou a colocá-lo no centro das atenções, ao aparecer como amante de Carla Bruni.

Jovem e moreno, Biolay tem charme suficiente para tornar os rumores credíveis. Sobretudo se tivermos em conta que a actual primeira-dama de França tem no seu passado uma extensa colecção de namorados. De Eric Clapton a Mick Jagger, foram vários os cantores com os quais terá tido relacionamentos. E muitos mais os homens com quem a imprensa lhe atribuiu romances, como o milionário Donald Trump ou o actor Kevin Costner. Nos seus tempos de modelo e depois de cantora, Bruni parecia pouco preocupada com os rumores sobre a sua vida sentimental, chegando a afirmar: «Sou monogâmica de vez em quando, mas prefiro a poligamia.»

Em 2000, quando vivia com o editor Jean-Paul Enthoven, Bruni apaixonou-se pelo filho deste, oito anos mais novo do que ela. Os dois acabaram por se casar e ter um filho, Aurélien, tudo depois de Enthoven se separar da mulher, Justine Levy, filha do filósofo francês Bernard-Henri Levy. Mas o casamento não durou e, em 2007, Bruni conheceu Sarkozy, tendo casado com o Presidente após um namoro-relâmpago.

Curiosamente, se o currículo de Bruni pode dar algum crédito às suspeitas de romance com Biolay, não se conhecem amantes a Sarkozy. Excepção feita talvez a Cécilia, a mulher pela qual se apaixonou, em 1984, no dia em que celebrou o seu casamento, na condição de presidente da Câmara de Neuilly-sur-Seine, e com a qual iniciou um romance quando ainda era casado com a primeira mulher e mãe dos seus dois filhos mais velhos, Marie-Dominique Culioli.

Separado em 1989, Sarkozy acabaria por casar com Cécilia em 1996, um ano antes do nascimento do seu filho Louis. Durante esta relação tempestuosa, seria Sarkozy a ser traído, com Cécilia a escapar para Nova Iorque com Richard Attias, o homem com quem viria a casar depois de terminada a relação com o actual Presidente de França. Seria no rescaldo do divórcio que Sarkozy conheceria Bruni. Agora, passada esta primeira tempestade, o casal pode continuar a viver «comme si de rien n’était». Afinal, Como Se não Tivesse Acontecido Nada é o nome do último disco de Bruni.

Anne Pingeot, 35 anos na sombra de Mitterrand

Naquele dia de Novembro de 1994, a França descobria, espantada, que François Mitterrand tinha uma filha ilegítima. A fotografia do presidente com a jovem Mazarine na capa da revista Paris Match revelava finalmente um segredo com mais de três décadas. Foi em 1961 que Mitterrand, então um ambicioso ministro de 45 anos, casado com Danielle e pai de três filhos já adultos, conheceu a jovem Anne Pingeot, durante umas férias de Verão.

Aos 18 anos, a rapariga impressiona o socialista com a sua elegância e a sua desenvoltura. Este aceita o pedido dos pais de Pingeot para a «meter debaixo da sua asa» em Paris, para onde a jovem vai estudar no Outono. Assim começa um romance que vai durar até à morte de Mitterrand, em 1996. Anne está portanto grávida de Mazarine quando Mitterrand perde as presidenciais de 1974 para Valéry Giscard d’Estaing por um ponto. E quando ele é finalmente eleito para o Eliseu, em 1981, Anne vive «o pior dia da minha vida». Com o amante no mais alto cargo político de França, a curadora de museus é relegada para uma clandestinidade ainda maior, mesmo se os mais próximos colaboradores do presidente e até alguns jornalistas sempre souberam da sua existência.

Mas o segredo foi mantido no n.º 11 da Rua Quai Branly, onde Mitterrand gostava de se refugiar. Quando esta vida dupla foi descoberta, não faltaram as críticas e as acusações de que Mitterrand estava a usar fundos públicos para manter uma segunda família. Mas já doente, o presidente terminava o segundo mandato, de sete anos, em 1995, morrendo no ano seguinte. O seu funeral foi ocasião para a reunião das suas duas famílias, um desejo que este sempre exprimiu. Anne Pingeot está hoje reformada e dá aulas no Museu do Louvre, enquanto Mazarine é uma escritora de sucesso.

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