Saúde Oral: retomar o caminho
Os desafios inerentes ao setor da saúde que se perspetivam tornam iminentes ações e medidas concretas que se façam sentir a curto, a médio e a longo prazo. Segundo a fita do tempo, passaram já mais de seis meses desde a tomada de posse do Ministro da Saúde, Manuel Pizarro, bem como começam a ser conhecidas algumas das medidas e objetivos da nova Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS) liderada por Fernando Araújo. Começam, também, a ser conhecidos os primeiros Planos Municipais de Saúde dos municípios e, dessa forma, vai-se materializando no terreno o processo de delegação de competências.
Para além dos problemas prementes que ocupam os noticiários e, desse modo, as pessoas e utentes do nosso Serviço Nacional de Saúde (SNS) e mesmo do nosso Sistema de Saúde, é de realçar a vontade de mudar e de atuar imprimida pela nova DE-SNS. A somar a esta vontade, o foco na assunção da realidade, reconhecendo alguns dos erros cometidos, mas querendo que esta nova fase, com uma nova gestão de cariz técnico, traga confiança na previsibilidade do sistema de forma a também dar mais confiança ao cidadão.
A propósito das comemorações do Dia Mundial da Saúde Oral, saúda-se o facto de a DE-SNS fixar como um dos seus objetivos "cativar e fixar médicos dentistas no SNS, através da criação de condições laborais que dignifiquem a profissão" de forma a relançar o acesso aos cuidados de saúde oral no serviço público. Faz precisamente cinco anos que escrevi neste mesmo jornal um artigo de opinião a propósito desta data e cujo título era precisamente "Finalmente, Médicos Dentistas no Serviço Nacional de Saúde" a propósito do projeto-piloto de integração de Médicos Dentistas nos Cuidados de Saúde Primários, lançado em 2016.
É curioso relembrar que, nesse articulado, já subsistia a esperança na criação da justificadamente ansiada carreira e que, passados estes anos, não mais se viu efetivada, sendo agora de novo colocada na "agenda". Decorrido este tempo, é importante avaliar o trabalho até aqui desenvolvido e fazer o devido enquadramento com os novos contextos que vão entrar em vigor, como a criação de Unidades Locais de Saúde e a delegação de competências para as autarquias, elas que foram essenciais no alargamento do programa através das parcerias estabelecidas com as Administrações Regionais de Saúde na aquisição do equipamento necessário para muitos consultórios estarem ao serviço dos seus munícipes.
A vontade e a ambição política de fazer justiça para com estes profissionais no Programa Saúde Oral no SNS 2.0 é um tónico importante para esse desiderato. Será igualmente uma oportunidade de rever aqueles que são os indicadores dos Cuidados de Saúde Primários das Unidades de Saúde Familiar, que não são revistos há mais de 15 anos, devendo ser também incluídos novos indicadores que incluam a saúde oral dos utentes. É preciso, no caso dos indicadores, reformular, atualizar, adicionar novos e retirar outros que já não fazem sentido!
Mas a reflexão que devemos fazer sobre a Saúde Oral deve ir para além do SNS e pensar no Sistema como um todo, relembrando que é necessário dar um novo impulso ao Programa "Cheque Dentista" que vá para além do que foi recentemente anunciado nos últimos anos. Um programa que aproveita a rede de prestadores no país e que permitiu obter ganhos em saúde deve ter em conta aquela que é a nossa demografia atual e futura, oferecendo soluções para as pessoas mais idosas por forma a que estas possam ter acesso a cuidados de saúde oral diferenciados que lhe permitam ter qualidade de vida.
Falamos de reformas nesta área que vão de encontro aos desafios que se impõe a todo o setor da saúde. Medidas como a criação do processo clínico único do utente ou mesmo uma imperiosa aposta na digitalização, com novos e modernos sistemas de informação que concretizem uma efetiva interdisciplinaridade e interoperabilidade são essenciais.
A saúde oral dos portugueses e, consequentemente, a saúde dos portugueses sairá beneficiada com a concretização de algumas destas medidas. Queremos muito acreditar que estamos mais próximos e queremos, efetivamente, mais confiança para que consigamos cumprir aquele que é o desígnio da Federação Dentária Internacional para esta data e que é base da campanha da Ordem dos Médicos Dentistas em 2023: que os portugueses tenham orgulho na sua boca.
Artur Miler, Médico Dentista