Sánchez vence a primeira batalha, mas ainda não garantiu investidura

Socialista Francina Armengol eleita presidente do Congresso com maioria absoluta, após acordo com independentistas do Junts. Feijóo mais longe da Moncloa após rutura com Vox.
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Luz verde para o uso do catalão (e as outras línguas cooficiais) no Congresso espanhol; uma comissão de investigação parlamentar sobre a utilização do software de espionagem "Pegasus" e outra em relação aos atentados terroristas de 2017 em Barcelona; e a "desjudicialização" do processo independentista (uma formulação que tem diferentes leituras e já está a criar problemas). Foram estas as cedências feitas ao Junts per Catalunya e à Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) que permitiram que a socialista Francina Armengol fosse eleita, à primeira volta e com maioria absoluta, presidente do Congresso.

O líder do PSOE, Pedro Sánchez, venceu esta quinta-feira a primeira batalha diante de Alberto Núñez Feijóo, cujos planos de chegar ao palácio da Moncloa ficaram ainda mais complicados com a rutura entre o Partido Popular (PP) e a extrema-direita do Vox por causa da formação da Mesa do Congresso. Mas os independentistas avisam o primeiro-ministro que as cedências foram só para garantir a presidência do Congresso e que será preciso ceder mais para conseguir a investidura. "A investidura está exatamente onde estava no dia seguinte à eleição", escreveu no Twitter o líder do Junts, Carles Puigdemont, que deixou para a última hora a decisão de apoiar ou não Armengol.

A ex-presidente do governo das Ilhas Baleares foi eleita com os 178 votos do PSOE, do Sumar, da ERC, do Junts, do Bildu, do Partido Nacionalista Basco e do Bloco Nacionalista Galego. A candidata do PP, Cuca Gamarra, só conseguiu 139 votos - os do seu partido mais o da Coligação Canária e o da União do Povo Navarro. Os 33 deputados do Vox votaram em Ignacio Gil Lázaro, depois de o PP não garantir ao partido de Santiago Abascal - o terceiro mais votado nas eleições de 23 de julho - um lugar na Mesa do Congresso. Esta acabou por ficar formada por cinco elementos do PSOE e Sumar e quatro do PP.

Sánchez espera conseguir os mesmos 178 votos que Armengol, mas precisará novamente de negociar com o partido de Puigdemont. Este tem feito valer caro os seus votos, apostando em pedir a autodeterminação e a amnistia para os independentistas em troca - a presidente do Junts, Laura Borràs, insistiu nestes aspetos. Além disso, após as cedências aos catalães, também os bascos lembram a Sánchez que é preciso negociar para garantir os seus votos.

Quanto às exigências que foram feitas para permitir a eleição de Armengol, já foram dados os primeiros passos na questão das línguas. A nova líder do Congresso já deu autorização para que o catalão, o galego e o basco sejam usados no hemiciclo. Além disso, o chefe da diplomacia espanhola, José Manuel Albares, enviou uma carta à presidência do Conselho da União Europeia (atualmente é a própria Espanha) a pedir que estas línguas sejam oficiais e de trabalho.

Em relação à "desjudicialização" do processo independentista, o líder parlamentar do PSOE, Patxi López, já veio esclarecer que não há promessa de qualquer amnistia aos condenados pela organização do referendo ilegal. Em causa está apenas um compromisso em não levar para os tribunais o conflito com a Catalunha. Mas o líder da ERC, Oriol Junqueras, um dos que estiveram presos, defende que essa "desjudicialização" tem que avançar recorrendo a todas as ferramentas legais e jurídicas, incluindo uma Lei da Amnistia.

O PP criticou que o primeiro-ministro tenha cedido às "chantagens" do Junts, enquanto o Vox acusa os socialistas de "venderem Espanha por um punhado de votos". No PSOE, o presidente da Junta de Castela- Mancha, Emiliano García-Page, lamentou que Puigdemont tenha o "comando à distância" da legislatura, por causa do "diabólico resultado" das urnas.

A surpresa da manhã foi o facto de os deputados do Vox não terem votado na candidata do PP. Diante da divisão da Direita torna-se mais difícil para Feijóo, que venceu as eleições mas ficou aquém da maioria necessária, solicitar ao rei Felipe VI que o encarregue da investidura. Ele, contudo, não desiste. Com o Vox, ainda tinha a esperança de empatar a 171 votos com Sánchez (caso este não consiga o apoio do Junts). Abascal, que tinha oferecido o seu voto na investidura a Feijóo para evitar "um governo de destruição nacional", exige agora explicações ao PP antes de decidir.

Até à votação há ainda passos a dar - o primeiro é Armengol ser recebida, já esta sexta-feira, pelo monarca para o informar da formação das Cortes, seguindo-se as audiências de Felipe VI com os partidos (não há ainda data, mas podem começar na segunda-feira). A ERC, como noutras ocasiões, recusa ir. O rei escolhe depois o candidato à investidura, que terá que ter maioria absoluta na primeira votação ou simples na segunda caso queira chegar à Moncloa. Se não conseguir, poderá ser necessário repetir as eleições.

Ao contrário do que acontece no Congresso, no Senado um partido tem a maioria absoluta - o Partido Popular (PP). Por isso não houve surpresa na eleição de Pedro Rollán para a presidência do Senado. Este conseguiu 142 votos. O Vox também aqui optou por votar no seu candidato: Ángel Pelayo Gordillo teve 3 votos. Os restantes partidos votaram todos em branco (114 votos). O PP espera usar o Senado como força de bloqueio contra um eventual novo governo de Pedro Sánchez. Apesar de os senadores não terem o poder para revogar totalmente as leis que cheguem do Congresso, poderão alargar os prazos para a sua aprovação. Podem, por exemplo, recusar uma lei ou aprovar emendas, obrigando o texto a voltar aos deputados, que por maioria absoluta podem ultrapassar qualquer bloqueio. Os senadores também podem atrasar a publicação das leis no Boletim Oficial do Estado (o equivalente ao Diário da República em Portugal).

susana.f.salvador@dn.pt

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