Sampaio quer Turquia na União
Para bom entendedor, meia palavra basta. Atente-se, pois, no que o Presidente português disse ontem, em Roma, perante os seus interlocutores italianos, empenhados ao extremo no relacionamento com Washington, ao ponto de, ainda agora, reiterarem a sua vontade de continuar militarmente presentes no Iraque. «Nenhum laço bilateral, por mais antigo e forte que seja, poderá substituir a parceria comunitária», alertou Jorge Sampaio. O mesmo é dizer: «Há cada vez menos lugar para posições isoladas ou para acções motivadas por propósitos unilaterais.»
Sobretudo num altura em que, percebe-se à saciedade, não há «partilha total de interesses e valores». Em que o «nosso mundo globalizado» está confrontado com «novas rupturas e ameaças». E em que emergem «reivindicações fortes por parte das opiniões públicas europeias, que não devem nem podem ser ignoradas». Em Roma, por exemplo, vêem-se, um pouco por todo o lado, bandeiras multicolores, apenas com uma palavra em letras brancas: Pace (Paz).
No âmbito de uma conferência sobre «A Europa em movimento: novas relações de vizinhança», proferida no Palácio de Montecitorio, o estadista português lamentou que, no âmbito do Tratado Constitucional, subsista «toda a ambiguidade acerca da Política Externa» da UE, «ao ser-lhe conferido um lugar à parte, misto de competência residual da Comissão e competência inclusiva da União...» Com reticências, assim mesmo, porque, por mais premente que seja o diálogo transatlântico, falta uma «visão estratégica» no sentido de «afirmar na cena internacional uma identidade política europeia».
Seja como for, como se diz em linguagem jurídica, um mau acordo é sempre, apesar de tudo, melhor que uma boa demanda e Sampaio assume-se, desde já, como um dos mais fervorosos adeptos de uma rápida ratificação da Constituição Europeia.
turquia. País com cerca de três milhões de imigrantes, a católica Itália, seguindo o mesmo diapasão de uma Washington que encara Ancara como «tampão» ao terrorismo, tem-se destacado no poio manifestado à entrada da Turquia na UE, aqui encontrando no agnóstico Sampaio um simpatizante da mesma causa, mas não necessariamente pelos mesmos motivos. Para o Presidente português, a adesão turca significará também novos horizontes para a UE e um «sistema de valores aberto». O que não impede que compreenda o empenho que Roma coloca, nomeadamente, no diálogo com a Líbia, de Khadafi, por forma a estancar os fluxos migratórios. É que a Itália está em crise. Aqui, a cada esquina, fala-se da quebra do poder de compra das famílias. O Presidente Carlo Ciampi bem tem procurado, com palavras, revitalizar a economia italiana, considerando que o «sentimento patriótico» deve ser a «Estrela Polar» dos seus concidadãos. Isto porque «a nossa economia anda há anos a perder competitividade». E, a despeito de um recente aumento das exportações, «a produtividade também não aumentou». Quando assim é, impõe-se «sonhar», a conselho de Luca Cordero de Montezomolo, o presidente da Cofindustria italiana, que reagrupa 117 mil empresas. Até porque numa referência implícita à morte do actor americano Christopher Reeve, «o Super-Homem» já não existe. Foi precisamente com Montezomolo, também presidente da Ferrari, que Sampaio tomou ontem o pequeno-almoço, discutindo as formas de reforçar os laços económicos entre os dois países (a Itália é o quarto «fornecedor» de Portugal e o seu sexto «cliente»).
Amanhã, no Vaticano, com João Paulo II, o Presidente português deverá, ao que tudo indica, abordar, entre outras questões, a recente Concordata, que foi ontem referendada pelo primeiro-ministro, devendo agora voltar a Belém, antes da sua publicação em Diário da República no dia 16.