Salve, César! vence... mas só na passadeira vermelha

O filme dos irmãos Coen cumpre o que se esperava: burburinho e multidão frenética. Mas foi no Fórum que se viu grande cinema
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Quem produz mais gritaria na passadeira vermelha do Palais da Postdamer Platz, George Clooney ou Channing Tatum? Diríamos um empate técnico, os fãs alemães das estrelas de Hollywood são de uma histeria... americana. Nem eles imaginam como a imprensa aqui em Berlim está a desancar no filme em que são estrelas, Salve, César!, dos irmãos Coen, ontem com direito a gala de abertura. Pelos corredores do festival a pergunta que se faz é: será este mesmo o pior filme dos manos?

Ontem, na conferência de imprensa, o habitual: poucas perguntas sobre o filme e muito disparate em forma de questões a George Clooney, como por exemplo uma jornalista polaca a perguntar se gosta de um certo petisco turco. Inenarrável. Clooney, que raramente dá entrevistas à imprensa internacional, está traumatizado. Mais grave foi o moderador nunca ter passado a palavra ao verdadeiro protagonista do filme, Josh Brolin, completamente ignorado na conferência. Talvez por isso, Tilda Swinton já cancelou as entrevistas que tinha marcadas para amanhã e Scarlett Johansson nem tenha viajado até à capital alemã. Na verdade, ao contrário do que a promoção do filme faz crer, a atriz tem um papel muito reduzido.

Se na seleção oficial a Berlinale arranca coxa, na secção Fórum, onde se divulgam as novas tendências de cinema do mundo, o arranque ontem foi auspicioso, em particular dois filmes: Lily Lane/O Caminho de Lane, de Bence Fliegauf, da Hungria, e Tempestad, de Tatiana Huezo, do México.

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Psicanálise com bom gosto

O filme húngaro coloca-nos na convulsão de um verão onde entramos por via poética na relação de uma jovem mãe excêntrica com o seu filho. Um relato de aparições, fantasmas e traumas de perda e divórcio que é uma espécie de ida ao bosque escuro. Conta-se histórias de papões e convoca-se muita negritude. Cinema de psicanálise com bom gosto visual fortíssimo. Em Portugal, já se conhecia o talento deste cineasta através de Apenas o Vento, estreado em 2012, em que o tema era um episódio verdadeiro de um crime de ciganos na Hungria rural.

Quanto ao documentário mexicano, Tempestad, o que se pode dizer é que é um daqueles casos de verdadeira descoberta. Pode parecer redundante dizer que vamos ouvir falar muito desta obra, mas é a mais pura das verdades: um road movie que percorre dois mil quilómetros de um México desolado para contar em voz off duas histórias de inferno de duas mulheres espoliadas de justiça: uma foi presa inocente e afastada do seu filho e outra viu a sua filha raptada com conivência das forças policiais. O notável na câmara desta cineasta de São Salvador é o seu olhar magoado de uma paisagem que encontra sempre um ponto humanista nos rostos do povo mexicano. É um filme de uma visceral beleza.

As Cartas já se fazem notar

No mercado, confirma-se as tentações dos biopics: Jackie, de Pablo Larrain, sobre Jackie Kennedy, teve algumas cenas mostradas a potenciais compradores e a imprensa da indústria confirmou que a Pathé assinou com o realizador de 45 Anos, Andrew Haigh, para realizar a biografia do falecido designer de moda Alexander McQueen.

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Cartas da Guerra, de Ivo M. Ferreira, não é propriamente um biopic de António Lobo Antunes, mas acaba por retratar um período da vida do escritor português. O candidato português ao Urso de Ouro está com cartazes internacionais (Letters from War) em grande destaque nas imediações do Palais e o trailer editado pelo realizador Sandro Aguilar já foi descoberto pela imprensa americana, mesmo a tempo de servir como apetite da estreia mundial aqui, já neste domingo.

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