Saltadores não comem as queijadas, mas promovem o destino Açores

O britânico Gary Hunt e a australiana Rhiannan Iffland foram os vencedores da etapa açoriana do Red Bull Cliff Diving World Series, que decorreu este fim de semana, no ilhéu de Vila Franca do Campo. Durante dois dias, foram observados por centenas de pessoas em São Miguel e admirados por milhões em todo o mundo.
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Foi nas queijadas da Vila do Morgado que em 2017 foi realizado o sorteio dos saltos da prova açoriana do Red Bull Cliff Diving World Series. Terá sido nesse ano que os saltadores dos penhascos comeram mais queijadas, o doce típico de Vila Franca do Campo, em São Miguel, onde há oito anos consecutivos se realiza uma etapa da competição - e onde voltará a decorrer uma fase no próximo ano. "Vêm com o itinerário bem apertado. Chegam em cima da competição e têm que se preparar. Não costumam vir cá", conta Rita Morgado, filha do proprietário, Adelino Morgado. "Mas o staff come queijadas. Já se criou uma família com quem vem cá há mais anos". Refere-se ao "pessoal da organização, da logística, da Red Bull, do vídeo e do áudio, da segurança, até aos carpinteiros que montam as plataformas dos saltos".

Como envolve um número muito elevado de pessoas, Rita Morgado diz que a prova que decorreu entre quinta-feira e sábado na vila de São Miguel "mexe com a economia de Vila Franca". Atendendo às características do local, sobre o qual falaremos mais à frente, a prova só pode ser vista de barco por algumas centenas de pessoas - e dezenas de jornalistas nacionais e internacionais. "Não acredito que haja muita gente a vir aos Açores de propósito para ver a prova". Mas o alcance da competição é global. De acordo com os dados da Red Bull, a prova açoriana foi visualizada por 134 milhões de pessoas em 2018 nas várias plataformas digitais onde é transmitida.

No final da etapa deste ano, Marta Guerreiro, Secretária Regional da Energia, Ambiente e Turismo, assegurou a continuidade da etapa açoriana no próximo ano (4 e 5 de setembro) e destacou que este é um "evento com imensa notoriedade para a região", com "potencial para trazer imensos fluxos turísticos para a região". Algo que "só é possível porque temos um património fantástico, que sabemos preservar", disse a secretária regional, acrescentando que "é incrível ver estes mergulhos diretamente das rochas para a nossa água e perceber o impacto que isto tem para os Açores".

Marta Guerreiro falava aos jornalistas no final da prova açoriana da competição de cliff diving, que terminou este sábado à tarde, com a vitória de Gary Hunt e Rhiannan Iffland. Foi num cenário paradisíaco - no "paraíso do cliff diving", como lhe chama Rhiannan - que os campeões em título aumentaram o seu domínio do circuito mundial de saltos para a água de grande altura. Ele dos 27 metros, ela dos 20, de acordo com as regras desta modalidade. Paradisíaco, note-se, mas agitado, devido às ondas e ao vento. De tal maneira agitado que o brasileiro Jucelino Junior, wildcard (convidado), nem saltou das rochas na última ronda. Mas o melhor momento do atleta foi mesmo o pedido de casamento à namorada no final do salto de quinta-feira.

"Não haveria local melhor no mundo para agregar algo mais à minha vida do que estar aqui, nos Açores, um local que é a cara do cliff dving", disse aos jornalistas. Refere-se à ilhota vulcânica - conhecida como o "anel da princesa" - que se localiza a cerca de 500 metros da costa de Vila Franca e onde se realiza uma etapa da competição há oito anos. Uma etapa especial, dizem os atletas, pois é a única onde os atletas têm a oportunidade de fazer saltos diretamente das rochas, tal como nas origens do desporto, que nasceu há mais de 200 anos, no Havai. É também nos Açores que têm a possibilidade de viver "quatro estações num só dia", como diz Jaki Valente, wildcard brasileira. Essa instabilidade obrigou a antecipar o início da prova para quinta-feira e a adiar as rondas de sexta para sábado. No decorrer da final, as caravelas-portuguesas ameaçaram estragar a festa, mas a organização conseguiu controlar os animais para que não ferissem os atletas.

Uma tese de mestrado sobre a etapa

Considerando que são escassos os estudos sobre o impacto de provas desportivas, Melissa Avelar, açoriana, de 31 anos, decidiu realizar um estudo para dissertação sobre "Os Impactos dos Eventos Turísticos Desportivos: O caso do Red Bull Cliff Diving" para o Mestrado de Gestão de Turismo Internacional. Tratando-se de um evento "com impacto mundial", a jovem diz que a prova "é muito positiva para os Açores, pois gera grande notoriedade". Não se sabe ao certo quantas pessoas assistem às provas nos barcos, junto ao ilhéu, "mas em casa são milhões a assistir".

Entre os 164 indivíduos inquiridos por Melissa em 2018, a maioria dos quais espetadores, 46.7% já tinham presenciado pelo menos uma versão anterior da prova - o que mostra satisfação com o evento. Aqueles que tiveram despesas com as viagens gastaram, em média, 263 euros em transporte diário, sendo as despesas diárias estimadas em cerca de 200 euros por pessoa.

De acordo com a informação recolhida pela jovem, a organização envolve aproximadamente 300 pessoas, das quais 200 comem e dormem em Vila Franca do Campo. Do total do investimento - cerca de 600 mil euros - 75% é gasto na região.

Mas nem tudo é positivo. O impacto ambiental é, segundo Melissa Avelar, o que gera maior preocupação, nomeadamente entre os locais. De acordo com a informação que recolheu, o facto de as pessoas não desligarem os barcos enquanto assistem aos saltos e a aplicação das pranchas diretamente nas rochas do ilhéu - que é uma reserva natural - são as consequências menos positivas do evento.

Orlando Duque nos Açores com experiência turística

Um dos destaques desta edição foi a ausência de Orlando Duque, que se viu obrigado a desistir devido a uma queda que sofreu no ano passado.Pela primeira vez fora do quadro permanente, só participa em algumas etapas como wildcard. Considerado uma lenda desta modalidade, o veterano esteve nos Açores com um grupo de turistas, no âmbito da iniciativa Red Bull Destination, que incluiu, entre outras experiências, o acompanhamento de toda a etapa e workshops de saltos para a água com o atleta.

Nos saltos oficiais, Jonathan Paredes bateu um recorde que há muito perdurava ao conseguir seis notas 10 ao longo da etapa, o que obrigou Gary Hunt a um esforço extra. "Esta foi sem dúvida uma das etapas mais emocionantes em que participei! Saltar nos Açores é uma experiência única, com elevado grau de dificuldade - o que não favorece os estreantes. Quando aqui saltei pela primeira vez senti isso, mas agora já tenho outra confiança e o resultado de hoje prova isso mesmo", afirmou Hunt no final da prova.

Já a australiana Rhiannan Iffland somou a quarta vitória consecutiva em quatro etapas. "Sem dúvida que saltar aqui nos Açores é algo extremamente desafiante para todos nós e ao mesmo tempo muito motivador. Ainda não me sinto uma lenda deste desporto, mas estou orgulhosa da minha prestação", referiu após a competição.

Resultados

MASCULINOS
1º Gary Hunt - 600 pontos
2º Jonathan Paredes - 350 pontos
3º Andy Jones - 350 pontos

FEMININOS
1º Rhiannan Iffland - 600 pontos
2º Lysanne Richard - 370 pontos
3º Jessica Macauly - 360 pontos

* a jornalista do DN viajou a convite da Red Bull

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