Sair do armário

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Como é que Portugal pode andar para a frente? Não compreendo", Joe Berardo confessava a sua mágoa numa entrevista dada ao Público, a 21 de novembro de 2003.

Inevitavelmente, hoje respondemos-lhe: "Nem nós, senhor comendador."

Tinha eu 13 anos quando todos os jornais lhe prestavam vénias e na TV passavam anúncios sobre a vida extraordinária e profundamente inspiradora que levava, longe de saber o que ia encontrar - hoje - e, acima de tudo, o que ia descobrir no Portugal onde os meus pais me educaram.

Houve alturas, como diria o senhor comendador, em que "me sinto completamente perdido. Não sei o que fazer.", referia-se às negociações com o governo a propósito da ida da sua coleção para o CCB, mas confesso que descreve bem o sentimento generalizado da minha geração.

Disseram-nos qual era o caminho: uma escola, uma universidade e - a maravilha das maravilhas - a Europa. Mas, o senhor comendador acertou: "Fiz esta coleção a pensar em Portugal." Nós também nos fizemos a pensar em Portugal.

"Espero nunca ter de a vender! E muito menos para fora de Portugal.", disse o senhor comendador. Também todos tivemos a sedução de sair.
E estamos em sintonia: não "nos vemos fora do país", também nunca quisemos vender o nosso esforço, o nosso trabalho, para fora de Portugal.

Mas este Portugal que vive de mão estendida, envergonhado e massacrado pela corrupção e pelo compadrio, abandonado por aqueles a quem não soube dar uma vida digna, é hoje o país que o senhor comendador ajudou a destruir.

E o embuste Berardo da primeira década dos anos 2000 não é o único - nem o verdadeiro - responsável por esse Portugal. Foi um espantalho sorridente e vestido de preto que, como o próprio diz, é "um cidadão que quis ajudar os bancos". Risível se não fosse trágico.

Não estava, com certeza, a referir-se aos mesmos bancos que os restantes portugueses conhecem. Aludia aos bancos de um país que se ajoelhou perante um poder que ainda não tem nome, cara ou dono, mas que vai sendo descoberto, devagarinho, como tudo em Portugal. Pode ser que agora, uma década depois, o espantalho fale. Tão sorridente como antes, mas com a verdade.

Ana Catarina Mendes disse a este propósito que "a crise de 2008-2009 pôs à evidência como é que os bancos funcionavam". É mentira. É factualmente mentira. Sabemos hoje, dez anos depois, como é que os bancos e o PS funcionavam. E isso, como diz o deputado Pedro Delgado Alves, devia ser debatido. O PS preferiu varrer para debaixo do tapete. Pode tentar, mas não à frente de quem paga a conta: a minha geração.

Saiam do armário, percebamos finalmente o que Portugal foi.

E digam-nos com franqueza: deixou de ser?

Deputada do PSD

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