Russos matam líder checheno
"Para o lugar de Dudaiev veio Maskhadov e para o lugar de Maskhadov outro virá." Foi assim que a resistência chechena reagiu, ontem, ao anúncio de que Aslan Maskhadov, presidente independentista da Chechénia, fora morto, horas antes, pelos serviços de segurança russos. O mesmo sucedera, em Abril de 1996, a Djokhar Dudaiev e, em Fevereiro de 2004, a Zelimkhan Iandarbiev, o homem que, após a morte de Dudaiev e o assumir de funções de Maskhadov, fora presidente interino.
Não será fácil e sem riscos, porém, encontrar um novo líder, até porque Maskhadov, contestatário de atentados terroristas contra civis, era uma voz moderada no seio de uma resistência que possui agora em Shamil Basayev, o autor moral da tragédia de Beslan, o seu rosto mais visível.
Basayev, que se intitula emir da Brigada Islâmica dos Mártires dos Jardins dos Justos, anda a monte e tem, como tinha Maskhadov, a cabeça a prémio (recompensa de dez milhões de dólares). E que não esconde o seu desejo de "incendiar" o Cáucaso - verdadeiro barril de pólvora onde coexistem frustrações nacionalistas e extremismos islâmicos.
Daí que Varsóvia, uma das primeiras capitais a reagir à notícia, pela voz do ministro dos Negócios Estrangeiros, Adam Rotfeld, fale de "erro político". Um "erro" com consequências imprevisíveis "Não excluo a possibilidade de os autores do assassínio terem pretendido eliminar as possibilidades de diálogo", salientou Rotfeld, considerando Maskhadov "o único com quem era possível procurar um acordo para o Cáucaso".
O mesmo receio é expresso pelo analista Alvi Zakriev "Uma vez que o único que propunha negociações com Moscovo foi morto pelos russos, estou convencido de que, em breve, os extremistas islâmicos vão mostrar aquilo que sabem fazer."
Um alerta sem rodeios para o eventual lançamento de atentados terroristas de grandes dimensões por parte dos wahabitas (radicais sunitas) de Basayev, como o atentado de Beslan, que, em Setembro de 2004, matou 344 pessoas numa escola da Ossétia do Norte. "Ficam com o caminho livre" e o conflito que opõe a Chechénia à Rússia agravar-se-á. "Não será menos sangrento. Pelo contrário", vaticina Alexandre Tcherkassov, membro da Memorial, organização não governamental de defesa dos direitos humanos.
Quanto mais não seja porque Moscovo conta, no terreno, com um aliado de peso, para além do Presidente pró-Kremlin, Alu Alkhanov o jovem, mas temível, Ramzan Kadyrov, filho de Akhmed Kadyrov, morto num atentado em Grozny, em Maio de 2004. À frente de uma milícia, conhecida por "Kadyrovtsy", composta por um número indeterminado de homens - entre mil e seis mil - tem espalhado o terror nos meios independentistas da república rebelde, sen- do-lhe imputados sequestros, violações, desaparecimentos e assassínios.
Aliás, mesmo sem confirmação de Moscovo, Ramzan Kadyrov garantiu que as suas milícias também tinham participado na operação que resultou na morte de Maskhadov, cuja localização na aldeia chechena de Tolstoi-Iurt terá sido fornecida por "traidores". Resta saber se a definição se aplica aos combatentes independentistas capturado recentemente ou a civis anónimos, pois Moscovo já veiculou as duas versões dos acontecimentos.
Maskhadov estaria, de acordo com um porta-voz dos serviços de segurança russos, "num bunker subterrâneo de betão", pelo que terá sido necessário "fazê-lo explodir".
Outra fonte, o site independentista Chechenpress.com, assegura, contudo, que Maskhadov não foi morto nem ontem nem por soldados russos, mas sim no domingo pelas milícias de Kadyrov - que, consumada uma espécie de vingança pela morte do pai, atribuída aos rebeldes, aceitara que Moscovo recolhesse os "louros" da operação.
Quem o matou será, em todo o caso, condecorado, assegurou o Presidente russo, Vladimir Putin, que pediu expressamente à hierarquia militar para ser informado dos respectivos nomes.
"bandidos". Confirmando a morte "em combate do líder independentista, Akhmed Zakaiev, emissário no estrangeiro de Aslan Maskhadov, garantiu, contra ventos e marés, "a resistência vai continuar". E quem suceder ao antigo oficial do Exército soviético "terá uma única tarefa permanecer fiel ao nosso governo".
Tanto Moscovo, que se apressou a divulgar as imagens do cadáver na televisão, como Grozny fazem finca-pé na tese do "banditismo" checheno, susceptível de inviabilizar qualquer hipótese de diálogo. "Há ainda muito trabalho a fazer. Temos de redobrar os esforços para proteger a população da república e toda a Rússia dos bandidos", limitou-se a declarar Vladimir Putin. Mais eloquente, Taus Djabrailov, do Conselho de Estado da Chechénia, adiantou "Com a liquidação de Maskhadov, um golpe fatal foi desferido contra o que resta dos combatentes rebeldes. A sua morte anula os argumentos dos que insistiam em negociações com os separatistas ."
Djabrailov está convicto de que "com o desaparecimento de Maskhadov, a república vai reencontrar uma vida normal".
Os Estados Unidos, onde reside uma significativa comunidade chechena, não acolheram a notícia com grande agrado. O porta-voz da Casa Branca limitou-se a dizer "A nossa política não mudou. Pensamos que deve existir uma solução política para a situação na Chechénia e continuaremos a fazer valer este ponto de vista."
A diáspora chechena teme o pior o radicalismo islâmico levado às últimas consequências por rebeldes que se suspeita contarem com o apoio da Al-Qaeda.