Rui Madeira, um arquiteto ao volante da empresa da família

Primeiro português a ganhar um título mundial de ralis mantém paixão pelos carros mas dedica-se a outro projeto: é arquiteto na empresa de construção civil da sua família
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A meta sempre esteve à vista de Rui Madeira, enquanto acelerava por terra e asfalto, pelos principais palcos nacionais e mundiais de ralis: o seu destino era a arquitetura e a empresa de construção civil fundada pelo pai. É esse volante que o piloto, de 48 anos e semiretirado, agora segura - embora ainda mantenha a paixão pela competição automóvel.

"Temos uma empresa familiar de construção civil, fundada pelo meu pai em 1979, chamada Construciv. Somos três irmãos a trabalhar cá, um como engenheiro, outro a tratar da contabilidade e eu como arquiteto", descreve, ao DN, Rui Madeira, explicando que os seus planos sempre estiveram ligados às raízes, ali, em Almada. "Enquanto construía a minha carreira desportiva, sabia que ser piloto profissional em Portugal era impossível. Só tive apoio da minha família para continuar a competir porque fui cumprindo com as minhas obrigações de estudante. Felizmente, consegui conciliar as duas coisas e completar o curso de Arquitetura", aponta.

Quando se tornou o primeiro português campeão mundial de ralis - ao conquistar o título da classe de Produção, em 1995 -, Rui Madeira já era arquiteto. E desde que deixou de competir de forma regular (a partir de meados da década passada) que os seus dias se fazem dos desafios da construção civil. "A arquitetura está em permanente evolução e nós tentamos evoluir no dia-a-dia, projetando novas condições de habitabilidade, conhecendo novos produtos e solucionando os problemas que surgem, seja a construir moradias unifamiliares ou edifícios coletivos", descreve.

No fundo, Rui Madeira está ligado à construção civil quase desde o cordão umbilical. "O meu pai sempre trabalhou no meio, o meu avô era carpinteiro... toda a família estava ligada à construção e eu sabia que cá iria parar. Sempre gostei de acompanhar obras, desde pequeno, e ainda hoje gosto... disso e de dar umas voltinhas nos carros", explica. Afinal, a paixão dos ralis não está esquecida: "Tenho grandes saudades da competição."

A nostalgia é natural, para quem competiu, nos anos 90, nos principais palcos do campeonato mundial de ralis. Rui Madeira tenta saciá-la de tempos a tempos. "Tenho a sorte de poder manter dois dos carros com que corri, um Ford Sierra RS Cosworth e um Mitsubishi Lancer Evolution II, e faço uma ou outra prova por ano. Ambos já quase clássicos", diz o almadense.

Foi o Ford Sierra Cosworth que acompanhou Rui Madeira numa das últimas aventuras competitivas, a participação na edição de 2015 do Rally Legend, um megaevento que reúne em San Marino velhas lendas (automóveis e pilotos) do mundial de ralis. "Aquilo é a nostalgia total. Com carros dos anos 70 aos anos 90, está toda a história dos ralis ali presente. Tem mais de 200 participantes, as marcas oficiais apoiam e é um sucesso brutal. São três dias de rali com o espírito de antigamente", descreve o piloto.

É desse "espírito de antigamente" que Rui Madeira - que gostava de um dia lançar um rali de clássicos em Portugal - mais sente falta, ao olhar para as provas atuais. "Felizmente, evoluímos de forma positiva quanto à segurança dos espectadores mas agora os ralis têm horário de escritório, das nove às cinco. Era bom que pudesse voltar a haver troços à noite...", sugere, juntando-se também ao coro dos que pedem o regresso das míticas etapas de Arganil ao programa do Rali de Portugal.

Todas essas lembranças estão ligadas às melhores memórias da carreira de Rui Madeira: o título mundial de 1995; a vitória no Rali de Portugal de 1996 ("tinha de ganhar para conseguir patrocinadores, felizmente correu bem, mesmo tendo feito pouco mais de cem quilómetros de adaptação ao carro"); e, "sobretudo, o convívio com os grandes pilotos e grandes seres humanos, como [os antigos campeões do mundo] Carlos Sainz, Juha Kankkunen, Didier Auriol, Tommi Mäkinen e Colon McRae".

"São todos inesquecíveis, com nenhum tique de vedetismo. Também tive a sorte de ser colega do Marcus Grönholm numa Taça FIA de equipas, que ganhámos, ao serviço da Grifone, em 1998: foi um ano maravilhoso. Fiz amizades para a vida e vou mantendo contacto com eles e com outros, que voltam mais frequentemente a Portugal, como o Markku Alén", enuncia o ex-piloto.

Com essas relações, as participações esporádicas em ralis e os jovens pilotos que lhe vêm "pedir opiniões ou ajuda", Rui Madeira continua a sentir de perto o cheiro da terra e do asfalto. Afinal, mesmo que as filhas, de 14 e 18 anos, tenham preferido seguir outros caminhos desportivos (surf e voleibol), ele nunca há de perder o bichinho da competição automóvel.

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