Ruanda vota continuação de presidente Kagame até 2034

Consulta eleitoral resultou de uma petição que teve 3,7 milhões de assinaturas.
Publicado a
Atualizado a

"Estou ainda a ouvir o que querem de mim. E o que querem de mim vai depender do resultado do referendo e a minha resposta será dada depois de ser conhecido o resultado", declarou ontem o presidente do Ruanda, Paul Kagame, depois de ter votado naquela consulta popular em que se perguntava se a Constituição devia ser revista para permitir um terceiro mandato para o chefe do Estado.

Paul Kagame, de 58 anos, é presidente desde 2003 e, a ser aprovada a revisão constitucional, poderia permanecer no cargo por um terceiro mandato de sete anos, a iniciar-se em 2017, seguido de mais dois de cinco anos cada. Isto significa que Kagame poderia ficar no poder até 2034, quando teria 77 anos.

O referendo foi convocado na sequência de uma petição que reuniu 3,7 milhões de assinaturas.

A principal força da oposição, o Partido Democrático Verde, dirigido por Frank Habineza, tentou anular o referendo na Justiça, mas essa pretensão foi indeferida. Foi uma "decisão ilegal", afirmou Habineza à Reuters. Uma responsável da ONG Human Rights Watch, Carina Tertsakian, explicou que, se "é evidente Kagame ter largo apoio popular, é difícil realmente saber o que a maioria dos ruandeses pensa", criticando a falta de "real liberdade de expressão". Um mulher, a coberto do anonimato, afirmou à Reuters que "as eleições nunca foram transparentes e, por isso, se votasse pelo não, também "não" isso contaria para nada".

Homem forte do país desde 1994 - quando as milícias da Frente Patriótica do Ruanda (FPR) entraram na capital, Kigali, expulsando os responsáveis pelo genocídio em que foram mortos 800 mil tutsis e hutus moderados -, Kagame insiste não querer ser "presidente vitalício". Espera-se que após a divulgação dos resultados, a suceder hoje, Kagame anuncie qual a sua decisão, mas não é difícil imaginar qual será.

O referendo no Ruanda sucede num momento em que pretensão semelhante no vizinho Burundi, com o presidente Pierre Nkurunziza decidiu, em abril, candidatar-se a um terceiro mandato, originou uma vaga de violência, tendo sido alvo de um golpe de Estado falhado. Desde então, foi eleito com a violência a espalhar-se pelo país, com milhares de pessoas a procurarem refúgio no exterior.

Confrontos na capital do Burundi, Bujumbura, causaram quase 90 mortos na passada semana, levando a União Africana a anunciar o envio de cinco mil efetivos numa força de paz para proteger os civis. As autoridades de Bujumbura recusam-se a autorizar a entrada daquela missão, o que vem aumentar receios de um reacender da violenta guerra civil que se viveu entre 1993 e 2005 entre a maioria hutu, a que pertence Nkurunziza, e a minoria tutsi. Novo conflito poderia ser utilizado como pretexto pelo Ruanda para intervir ao lado dos tutsis no Burundi.

Críticas dos EUA e Europa

As autoridades de Washington e diferentes governos europeus afirmaram dias antes do referendo que Kagame deveria "resistir à tentação do poder". Principal dador de ajuda, os Estados Unidos têm elogiado a atuação de Kagame na reconstrução do país e no relançamento da economia, mas defendem ter chegado o momento de se "abrir caminho para uma nova geração na liderança do Ruanda". Seria um "exemplo para toda a África", pois "ninguém é indispensável", declarou no início do mês a embaixadora dos EUA nas Nações Unidas, Samantha Power.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt