Roleta Russa
Esta semana, a guerra russa na Ucrânia atinge a simbólica marca de 100 dias. Não há como negar: o mundo mudou desde a injustificável e bárbara invasão. Um país arrasado, muitos milhares de vítimas, milhões de refugiados. Um sentimento de que a paz é frágil, que um conflito mundial pode estar ao virar da esquina.
A resposta da União Europeia foi rápida e solidária: abrir a porta aos refugiados, apoio económico e militar à Ucrânia e imposição de sanções, em particular nos setores financeiro e energético, incluindo o congelamento de bens dos oligarcas russos ligados ao Kremlin - que na verdade são quase todos, pois Putin transformou a Rússia num Estado autoritário e corrupto, onde os amigos e aliados do Kremlin se tornaram milionários, enquanto a população pouco ou nada melhorou a sua vida.
À medida que a guerra se prolonga, também o regime de sanções vai sendo mais apertado. A torneira do petróleo está gradualmente a fechar e prepara-se o regime legal para que os bens congelados possam ser confiscados.
A passividade com que se recebeu o dinheiro russo na Europa nas últimas décadas facilitou a lavagem de dinheiro, tornando-nos cúmplices por omissão. Ao assobiarmos para o lado perante a entrada das fortunas de oligarcas russos e milionários de outros regimes cleptocráticos, contribuímos para a legitimação e sobrevivência desses regimes.
Acresce que alguns estados-membros têm sido particularmente defensores de regimes legais que ocultam os verdadeiros proprietários dos bens. Como é óbvio, é meio caminho andado para o branqueamento de capitais.
Como reação à guerra, a luta contra estas práticas poderá porventura acelerar e fazer caminho.
A Comissão Europeia deu o pontapé de saída para reorientar a nossa abordagem, apresentando uma diretiva sobre recuperação e confisco de ativos que vai permitir o rastreamento e identificação de bens suspeitos, assim como o seu congelamento urgente, evitando que sejam desviados ou ocultados enquanto decorre a investigação criminal, e reforçando a possibilidade de os confiscar. De caminho, acaba-se com o escândalo dos pagamentos em dinheiro acima de dez mil euros.
Para referência, a Europol estima que atualmente apenas 1% de todos os ativos de natureza criminosa são confiscados...
Por isso, precisamos de andar depressa e bem, acrescentando esta proposta sobre o confisco de bens ao pacote legislativo que já estávamos a negociar nesta área, que inclui a criação de uma Autoridade Europeia contra o Branqueamento de Capitais - tarefa na qual estou empenhado no Parlamento Europeu.
Com este pacote de medidas temos de ser capazes de colmatar as lacunas do atual sistema europeu, para que a UE não estenda a passadeira vermelha aos inimigos da democracia.
O ex-Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos e do Politécnico de Setúbal - onde ao longo de 12 anos demonstrou que é possível criar centros de excelência fora da Capital - foi nomeado presidente da Comissão de Acompanhamento do PRR. Dotado de visão e ambição, é por natureza um construtor de consensos. Uma boa escolha.
Eurodeputado