Retirar a nacionalidade: processo raro e difícil

Lei só é aplicável a quem tenha dupla nacionalidade, para evitar apátridas, e viva em França há menos de dez anos.
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Para Manuel Valls, é preciso "retirar a nacionalidade àqueles que desrespeitam a alma de França". Mas a procedimento proposto pelo primeiro-ministro francês é não só raro, como difícil de aplicar, uma vez que obedece a regras restritas. Aplicável a quem pratique "um delito contra a nação, o Estado ou a paz pública", como é o caso de um ato terrorista, a retirada da nacionalidade está limitada, desde 1998, a indivíduos com dupla nacionalidade, para não criar apátridas.

Além disso, o artigo 15 da Constituição francesa estabelece que só cidadãos que vivam em França há menos de dez anos (ou 15 em caso de "crime ou delito que atente contra os interesses da nação") podem ser privados da nacionalidade.

Com origens em 1848, quando o decreto que abolia a escravatura esclarecia que todos os franceses que a continuassem a praticar seriam privados da nacionalidade, este procedimento foi mais tarde alargado, sobretudo em época de conflitos. Durante o regime de Vichy (apoiante dos nazis) na II Guerra Mundial, chegou mesmo a ser aplicado em massa, com a desnaturalização de mais de 15 mil pessoas, na larga maioria judeus.

Mas hoje retirar a nacionalidade a alguém é um procedimento extremamente raro. Segundo o Le Figaro, desde os anos 90 houve apenas 21 casos que avançaram mesmo, oito dos quais (entre 2000 e 2014) de indivíduos que haviam cometido atos terroristas. O último caso é o de Ahmed Sahnouni, considerado o cérebro da Al-Qaeda em Marrocos. A retirada da nacionalidade, que obtivera em 2003, foi então assinada por decreto pelo primeiro-ministro Manuel Valls e pelo ministro do Interior, Bernard Cazeneuve. Os dois dirigentes pediram na mesma altura um processo semelhante para outros cinco franceses condenados por terrorismo, mas viram o pedido contestado junto do Conselho de Estado, mais alta jurisdição administrativa em França.

Estado de emergência

Depois de um fim de semana de recolhimento e homenagens, os franceses preparam-se hoje para o primeiro dia de semana depois dos atentados de Paris. As escolas e universidades vão reabrir, mas o presidente François Hollande deverá apresentar quarta-feira, no Conselho de Ministros, um pedido para o prolongamento do estado de emergência durante três meses. Esta medida foi decretada logo na sexta-feira à noite, depois dos ataques. Por lei, para durar além dos 12 dias previstos, terá de ser aprovado pelo Parlamento.

O estado de emergência só foi usado duas vezes na V República: uma em 1985, na Nova Caledónia, durante confrontos no arquipélago francês no Pacífico, outra em 2005 na França metropolitana devido aos motins nos subúrbios de Paris. Este permite às autoridades restringir a liberdade de circulação em determinadas zonas e a certas horas (recolher obrigatório), proibir reuniões públicas ou encerrar temporariamente locais de reunião, fazer buscas administrativas sem mandato, apenas com a presença de um agente da judiciária ou colocar em prisão domiciliária qualquer pessoa que ponha em causa a segurança.

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