REPORTAGEM: Moradores que vivem em zona de servidão militar em Fernão Ferro recusam sair
De acordo com a Associação de Proprietários de Pinhal de Freiras e Quinta da Lobateira, em Fernão Ferro, o Plano Diretor Municipal (PDM) prevê para metade daquela área a edificabilidade.
"Os termos de referência da Unidade Operativa de Planeamento e Gestão obrigam a que para a urbanização do espaço liberto da servidão militar seja cedida área para alojar aquelas pessoas [as que vivem na área de servidão militar]. É a forma encontrada pela Câmara Municipal Seixal e que nós temos de seguir por ser legal, e a única que neste momento possuímos", disse à agência Lusa o presidente da associação, Bernardino Milheiras.
Segundo o representante, a infraestruturação que está a ser feita na zona está a ser fiscalizada, mas sem investimento municipal.
"A associação de proprietários foi considerada pelo PDM, consta do próprio PDM, como um interlocutor privilegiado para resolver este problema. Temos contacto e acompanhamento com a Câmara, todo o projeto deu entrada na Câmara e está a ser acompanhado e fiscalizado. Estamos a infraestruturar a zona, mas é a única ajuda. Não temos qualquer ajuda económica da Câmara Municipal do Seixal", afirmou.
Apesar dos esforços realizados pela associação e pela Marinha ao longo das últimas décadas, os moradores da zona de servidão militar, que recorrem a "furos" e a "puxadas de eletricidade" para terem acesso a serviços básicos, não estão disponíveis para sair.
"Não tenho dinheiro para fazer outra casa, dão-me o terreno, mas não posso ir para lá e ficar numa tenda. Assim cá estamos, vou ficando", disse Irene Silva, que vive há 22 anos na zona de servidão militar.
Segundo a associação de proprietários, a transferência dos moradores desta zona para a área que está a ser infraestruturada "apenas transfere direitos".
"Não há forma de os indemnizar, não há forma de fazer a transferência das construções. Não sei por onde passará essa solução, penso que irá ser uma resolução complicada para as pessoas", afirmou Bernardino Milheiras.
Questionado pela agência Lusa sobre a duração prevista para a infraestruturação de toda a área e transferência da população para uma zona onde não corra risco, o presidente da associação afirma que "é muito difícil prever um fim" de todo o processo.
"Existimos há cerca de 19 anos, os passos têm sido muito lentos. Iniciámos com um plano de pormenor tendo em vista a alteração do uso do solo que não foi concluído porque, no entretanto, a Câmara Municipal do Seixal pretendeu alterar o uso do solo através da revisão do PDM e fê-lo. Neste momento estamos dependentes de outras entidades, nomeadamente o Ministério da Defesa, que faz a gestão da servidão militar", explicou.
A associação ficou incumbida de definir o traçado de uma alternativa à Estrada Nacional 378, que faz a ligação Sesimbra-Fogueteiro e está a tentar que essa via cause os menores danos possíveis em termos urbanísticos e em termos de ocupação de espaço urbanizável.
"Todo o espaço urbanizável é necessário para que se consiga fazer a transferência destas pessoas", disse o representante.
De acordo com a associação e a Marinha, há dezenas de famílias a viver ilegalmente nesta zona de "risco bastante elevado" na área de servidão militar.
"Fazemos com frequência o manuseamento desses materiais energéticos, neste caso explosivos, e aí o risco é um pouco maior. A Marinha está preocupada com as pessoas. O objetivo é que, se houver um acidente, não haja baixas desnecessárias por estarem numa situação clandestina", afirmou o diretor do Depósito de Munições NATO de Lisboa (DMNL), Antunes Pereira.
Sobre o motivo que permitiu a fixação de dezenas de famílias na área de servidão militar, através da construção de várias moradias, o comandante referiu tratar-se de um problema que se "arrastou muito no tempo" e considerou que terá começado com a autorização "para construir pequenas infraestruturas de apoio à agricultura".
Segundo a associação de proprietários, a infraestruturação que está a ser feita na zona fora da servidão militar, com a colocação de asfalto e serviços de saneamento básico, contribui para a "promoção imobiliária", apesar de todo o trabalho que é feito para "alertar as pessoas para o risco que correm".
Contactada pela Lusa sobre a construção de habitações nesta área, o município recusou-se a comentar "por se tratar de competências do Ministério da Defesa".