Reorganização da RTP deverá estar concluída até final do ano
O presidente do Conselho de Administração da RTP diz, em entrevista à Lusa sobre o balanço de um ano no cargo, que o processo de reorganização, que visa tornar a empresa mais eficiente, deverá estar concluído até final de 2022.
Nicolau Santos, que assumiu a presidência da RTP há um ano, salienta que a primeira questão que a nova administração teve de resolver dizia respeito à área laboral: reenquadramento e contratações.
"Havia 70 reenquadramentos e cerca de 50 contratações que vinham de anos anteriores, do ano 2019, e que estavam por concretizar e, portanto, conseguimos que isso acontecesse até ao final do ano passado. Demorou mais do que pensávamos, mas de qualquer maneira conseguiu-se concretizar e penso que foi muito importante para, de algum modo, descrispar o ambiente laboral da RTP", salienta o gestor.
Depois, "demos início ao processo de reorganização da empresa", em que foi constituído o grupo Reset que abrange sete áreas: imagem, internacional, produção, planeamento, formação, contratação e simplex.
"São áreas onde há grupos de estruturas intermédias que estão a trabalhar, estão a chegar a conclusões e depois do final dessas conclusões iremos falar com as direções e combinar com elas" como é que as medidas - há de curto, médio e longo prazo - "podem ser aplicadas desde já com ganhos de eficiência e ganhos de produtividade", refere.
"Essa é uma área importante e não está concretizada, esperemos que se concretize até ao final deste ano, mas está avançado em termos de trabalhos", prossegue Nicolau Santos.
Também na área de conteúdos haverá uma reorganização, já que existe "neste momento uma organização da RTP que é muito por silos".
Ou seja, "cada diretor tem a sua área e tem o seu orçamento e, por vezes, há áreas ou interesses que se sobrepõem e que se houvesse uma estrutura que pudesse de algum modo ser um interlocutor para essas direções seria seguramente mais fácil distribuir eventos desportivos, musicais, séries, filmes", entre outros, explica Nicolau Santos.
"O que estamos a tentar fazer - e veremos como vai ser aplicada esta orientação - é criar responsáveis temáticos por determinadas áreas", como o desporto, a ficção nacional, entretenimento, entre outros, "que terão também o seu próprio orçamento".
Essas áreas "serão aquelas que contratarão ou por pedido que lhes seja dirigido ou porque conhecem os mercados e, portanto, sabem aquilo que pode interessar à RTP", refere o gestor.
Depois, os diretores do canal irão receber de cada um desses responsáveis temáticos aquilo que lhes interessa" para os seus próprios canais.
A ideia é "ter uma estrutura mais ágil, uma estrutura onde se fale mais, onde toda a gente fale mais e onde no final haja um aumento de eficácia claramente em relação àquilo que interessa ao grupo RTP", defende Nicolau Santos.
O objetivo é "tornar a empresa mais operacional, mais eficaz" e as pessoas a colaborarem mais entre si, aponta.
"Isso é fundamental, "quer dentro dos oito canais da RTP televisão, quer dentro dos sete canais da RTP rádio", defende, salientando que também a colaboração entre a rádio e a televisão "é muito importante", aliás, durante a guerra da Ucrânia tal foi visível.
"Houve muita colaboração entre a rádio e a televisão, entre as equipas que foram para o terreno, apoiaram-se muito e é isso que queremos implementar em todas as áreas, é tentar que essa colaboração exista cada vez com maior naturalidade e que quando exista alguma coisa, as pessoas se lembrem que este grupo não é apenas de rádio, não é apenas televisão, mas é também cada vez mais um grupo multiplataforma", no qual se inclui o digital e 'streaming', que têm de ser alimentados.
Ainda sobre o balanço do primeiro ano na RTP, Nicolau Santos salienta que a administração teve "uma preocupação relativamente às instalações da RTP e ao equipamento tecnológico com que a RTP trabalha e nalgumas áreas foi possível avançar mais rapidamente, nomeadamente nos Açores".
O presidente da RTP destacou que o Centro Regional da Madeira e o Centro de Produção do Norte são duas áreas que preocupam a administração, pois precisam de investimentos, quer em tecnologia, quer em melhoria de instalações.
"Estamos também a trabalhar nisso", assevera.
A situação de guerra "tornou mais complicado a chegada de equipamentos com a rapidez que pensávamos", refere.
Sobre a revisão do Contrato de Concessão, cujo processo foi reaberto pela tutela, o Conselho de Administração está a trabalhar na sua proposta.
"A tutela da RTP mostrou-se disponível para que pudéssemos reabrir o processo e para que o Conselho de Administração apresentasse propostas relativamente a essa área. E é isso que nós estamos a fazer e, portanto, esperamos chegar a bom porto nestas matérias", afirma.
Questionado sobre o que espera do segundo semestre, depois de uma primeira metade do ano complicada, o presidente da RTP afirma que "está tudo muito dependente do que se vai passar na guerra da Ucrânia".
Quer do ponto de vista da inflação, quer do preço dos equipamentos, quer do custo das equipas que estão enviadas, "tudo está muito, muito dependente disso", prossegue Nicolau Santos.
"Confesso que neste momento não estou muito otimista, acho que há situações de grande vulnerabilidade nas economias europeias e essas vulnerabilidades não são só do ponto de vista energia", mas também de produtos alimentares.
"E, portanto, tudo isso pode ter um impacto nalgumas áreas (...) mesmo disruptivo", considera.
"Esperemos que a guerra se resolva por negociações o mais rapidamente possível, mas claramente vamos ter um ano bastante mais difícil, com um arrefecimento do crescimento económico em toda a Europa e, provavelmente também, nos Estados Unidos, em todo o mundo e com a possibilidade de agitação social e de convulsões bastante acentuadas", estima.
"Vamos cruzar os dedos e esperar que não seja assim e que, mais uma vez, estas previsões estejam completamente erradas", remata.
O presidente da RTP diz que foi pedido às direções um corte de 5% do seu orçamento, tendo em conta o aumento dos custos, sublinhando que a empresa "é sustentável" com resultados positivos há 12 anos.
No início de junho, o presidente do Conselho de Administração da RTP, Nicolau Santos, afirmou que provavelmente a RTP vai ter prejuízos este ano, tendo em conta o aumento de custos, a guerra, a que se soma o encargo de 12 milhões de euros do Mundial de Futebol no Qatar, contrato em 2011, mas que só agora vai ser contabilizado.
"Primeira questão, a RTP é uma empresa sustentável, há 12 anos que dá resultados positivos", começa por sublinhar Nicolau Santos, referindo que, "ao contrário do que se possa pensar e a ideia de que todas as empresas públicas dão prejuízo, não é verdade, a RTP há 12 anos que dá resultados positivos e é muito importante que isso seja claro para toda a gente".
Ou seja, o que mudou este ano, em primeiro lugar, foi "um aumento brutal dos custos da energia", aponta.
"Nós tínhamos orçamentado 1,5 milhões de euros de custos de energia, que era mais ou menos o normal e, de repente, somos confrontados com um aumento três vezes superior, passamos para 4,5 milhões de custos de energia só para este ano", contabiliza Nicolau Santos.
Depois, "somos confrontados com uma situação que está a afetar a generalidade das empresas e, sobretudo, aquelas que necessitam muito de equipamentos tecnológicos, que é o aumento a dois dígitos dos fornecedores de tecnologia", pelo que cada contrato de 100 mil euros na RTP, "quando tem um aumento em cima de dois dígitos, obviamente cresce muito a fatura", prossegue.
Além disso, há a guerra na Ucrânia, o que resulta no envio de equipas da rádio e da televisão para fazer a cobertura, o que "oneram claramente o orçamento", diz, ultrapassando os orçamentos que estavam previstos para informação dos dois meios.
Há ainda os aumentos salariais, que estavam previstos, mas que que ainda não está fechado: "Esses aumentos salariais não existem na RTP desde 2019, portanto vai haver este ano".
Sobre o montante, "ainda não podemos precisar exatamente qual será em termos de encargos de aumento da massa salarial para a RTP", refere.
Por último, e não menos importante, está a decisão tomada em 2011 pela administração liderada por Guilherme Costa, "que decidiu comprar a transmissão de todos os jogos do Mundial de futebol do Qatar", que se realiza no final do ano naquele país.
"Esse encargo é de 12 milhões de euros, foi contratado em 2011, mas é este ano que vai ter de ser contabilizado", sublinha Nicolau Santos.
Questionado se o prejuízo da RTP vai ser de um ou dois dígitos, o gestor salienta que está dependente destas várias situações e das medidas que estão a ser tomadas diariamente.
"Nós pedimos, por exemplo, a todos os diretores, a todas as direções para fazer um esforço de cortarem em pelo menos 5% do orçamento que tinham e já temos esses dados", diz, salientando que a empresa está a tentar conter despesas em várias áreas, bem como a sensibilizar a menor utilização de energia.
"Algo que vai pesar aqui claramente é a nossa negociação com os canais privados, com as estações privadas que obviamente não quererão estar a dois meses no final do ano sem nenhum espetáculo desportivo e, portanto, vão seguramente negociar com a RTP para comprar parte deste pacote de 12 milhões que nós comprámos em 2011", pelo que "valor final das contas da RTP em 2022" também decorrerá disso, acrescenta.
Nicolau Santos adianta que este ano "aumentou tudo, não há nada que não tenha aumentado significativamente e esse é um dos problemas cruciais da RTP e que tem a ver com a sustentabilidade da empresa".
O que se tem assistido este ano, com particular relevo, "mas é uma trajetória que vinha sendo seguida, é o aumento constante e consistente dos custos", destaca.
Por exemplo, só pelo Acordo de Empresa, a RTP tem um crescimento "da massa salarial de cerca de 500.000 euros todos os anos", sem aumentos, a que acresce todas as outras despesas.
"Só que este ano as coisas estão a ser mais graves", com a guerra na Ucrânia, os aumentos dos fornecedores de energia, entre outros.
E, em contrapartida, "no lado das receitas", lembra que a empresa está "muito" limitada".
A Contribuição do Audiovisual "está congelada desde 2014 e as nossas receitas comerciais também de algum modo estão limitadas, porque continuamos a ter na RTP1, onde é possível adquirir mais publicidade", um limite de de seis minutos por hora de emissão.
Portanto, "tudo isto leva a que as nossas receitas sejam razoavelmente congeladas e os custos têm vindo a crescer", aponta, considerando que "este caminho não é sustentável" e que "é preciso encontrar soluções".
Ou seja, "é preciso fazer uma profunda reflexão sobre o modelo de financiamento da RTP e sobre o que é que se quer da RTP. E estou a falar do grupo RTP", no seu todo, sublinha.
"Só para se ter uma ideia, os custos e os encargos salariais neste momento já são mais de 50% da Contribuição do Audiovisual. Portanto, não é possível continuar com este caminho sem uma profunda reflexão sobre que RTP queremos no futuro", remata.
Quanto a 2021, "os resultados ainda não estão completamente fechados, mas serão na casa dos 900 mil euros", diz o gestor.
Relativamente aos precários, Nicolau Santos adianta que os trabalhadores que estavam para entrar no âmbito da Comissão de Avaliação Bipartida (CAB) estão resolvidas. Nos últimos quatro anos entraram na RTP 261 pessoas que levaram a que os encargos com pessoal crescessem 10 milhões de euros.