Relações instáveis entre EUA e Europa debatidas em encontro da FLAD
Os dois intervenientes da sessão de trabalho que decorreu esta tarde na sede da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), em Lisboa, não deixaram de lançar algumas críticas à atual estratégia da diplomacia norte-americana, num cenário de grande competição com a China.
Paulo Portas, ex-vice-primeiro-ministro e ministro dos Negócios Estrangeiros, que entre outras funções exerce agora o cargo de vice-presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP), definiu-se como um "conservador não protecionista e não isolacionista", e manifestou preocupação pelas atuais perspetivas em termos de comércio mundial.
Após sublinhar a sua admiração pela simbiose entre capitalismo e emigração nos Estados Unidos, e recordar que "40% das grandes empresas dos EUA foram feitas por emigrantes", não deixou de criticar a posição protecionista de Washington, ao recordar que a última vez que o mundo assistiu a uma crise global do comércio foi após a Grande Depressão de 1929, com o surgimento do protecionismo.
"E podemos revisitar essa experiência e devemos aprender sobre as consequências económicas do protecionismo a curto e médio prazo", assinalou no encontro de dois dias que juntou congressistas federais, senadores, deputados estaduais norte-americanos de ascendência portuguesa e personalidades nacionais dos setores político, empresarial e científico.
Numa referência aos desafios colocados pela China, o ex-ministro e ex-líder do CDS/PP detetou, contudo, uma semelhança de posições entre os Estados Unidos e a União Europeia (UE).
"Se formos à Organização Mundial do Comércio (OMC), o criticismo da UE sobre se a China cumpre as regras da organização é muito semelhante em substância ao dos Estados Unidos", disse.
"Mas a abordagem é diferente, queremos um acordo, não queremos minar a confiança mundial com um conflito mundial, e por isso espero que o espero que os EUA nunca se retirem da OMC", uma organização definida como uma plataforma de arbitragem para resolver conflitos comerciais.
"A ideia de que no mundo global tudo se resolve com acordos bilaterais não é viável, porque as cadeias de produção estão integradas. A abordagem bilateral não é suficiente. E os padrões da OMC devem ser um incentivo a uma abordagem mais significativa da China aos padrões internacionais", referiu no período de debate com a assistência, com todas as intervenções produzias em inglês.
Nas suas intervenções, o antigo embaixador Francisco Seixas da Costas realçou por sua vez o "amplo consenso" em Portugal sobre a política externa de Lisboa e a importância das relações transatlânticas, mas sem deixar de criticar o isolacionismo da atual administração norte-americana e do Presidente Donald Trump.
"Ao tornarem-se isolacionistas, os EUA estão a perder a sua anterior autoridade, uma espécie de abordagem egoísta em contraste com o que esperávamos dos Estados Unidos", considerou.
Em consonância com Paulo Portas, considerou que a China "é um problema" e não apenas para os Estados Unidos, e num momento em que a Rússia está remetida a uma "potência regional".
"Tal como sucedeu na Guerra fria com a Rússia, temos de estar atentos ao que acontece na China e à sua influência no cenário global. O projeto chinês 'Uma Faixa, Uma Rota' vai confrontar algumas das áreas geopolíticas, como a Rússia, que vai ser afetada por esta iniciativa de Pequim. Mais tarde ou mais, cedo, na Ásia central, no Cáucaso, veremos", assinalou.
A ausência de "uma dimensão em política externa e mesmo em diplomacia capaz de sustentar esta ambição" por parte da China constitui para Seixas da Costa uma das principais fragilidades de Pequim, da qual os aliados ocidentais poderão beneficiar num atual cenário mundial muito competitivo e de múltiplas tensões geopolíticas.
"Da parte dos EUA seria necessária, diria uma aliança, um diálogo, com os parceiros tradicionais que partilham uma série de valores e princípios, para confrontar e ser capaz de responder à China", defendeu.
Neste contexto, considerou que a atual estratégia de Washington "não é a forma de confrontar a União Europeia", e deve ser alterada.
"A União necessita de ser respeitada como merece, e tendo em conta que foi sempre um aliado dos Estados Unidos. Na UE e em Portugal estaremos muito atentos para não permitir que nenhum vetor em termos de segurança e defesa seja contraditório com a NATO. É um elemento chave da nossa política e quero sublinhá-lo", concluiu.