Reiventar a banca

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O professor Clay Christensen, da Harvard Business School, acabou de publicar um novo livro com o título Competing against Luck - Competir contra a Sorte -, no qual afirma que as empresas dedicam demasiado tempo a olhar "para dentro" e a ver o que podem fazer, em vez de "olhar para fora" e questionar-se sobre o que querem os clientes. O que esperam de nós.

Os bancos dedicam demasiado tempo a temas internos. Reunimo-nos com os reguladores em Basileia, em Washington e em Frankfurt. Discutimos sobre regulação e resiliência, que são temas importantes e incontornáveis que merecem toda a nossa atenção porque queremos estar à altura das exigências do cenário atual.

Tudo isso está certo, mas os bancos e os reguladores têm, acima de tudo, uma responsabilidade partilhada: a de apoiar o crescimento sustentável e inclusivo. Temos claro que, para alcançá-lo, a prioridade são os clientes. Eles desenham o caminho e marcam o ritmo, como querem que nos reinventemos, como podemos proporcionar-lhes a melhor experiência possível e contribuir para o seu desenvolvimento.

Os bancos são as artérias da economia. Quando cumprimos a nossa função, e os clientes confiam em nós, todos ganhamos. Os colaboradores crescem profissionalmente, os clientes prosperam e, com eles, também os nossos acionistas e a sociedade.

Os clientes pedem-nos serviços mais personalizados e rápidos. Vivemos num mundo de "alta velocidade". Responder em tempo real, ser o prestador de serviços financeiros e de soluções de pagamento preferido de todos os clientes em todos os mercados em que operamos - essa é a nossa ambição.

Temos uma grande responsabilidade, que vai muito além da clássica "responsabilidade social corporativa". Tudo o que fazemos deve ser socialmente responsável. O nosso trabalho diário na nossa atividade bancária: quando a fazemos bem, tem um enorme impacto positivo nos nossos clientes.

Para poder apoiar os clientes necessitamos de profissionais com talento. Pessoas que estejam empenhadas em criar valor para todos, incluindo para os mais inovadores e exigentes. Procuramos empreendedores com quem possamos colaborar. Empreendedores nos quais possamos investir. E empreendedores que consigamos contratar. Queremos as suas ideias e a sua paixão. Queremos ser uma empresa atrativa para pessoas com talento e estamos abertos para colaborar com todos.

A banca baseia-se na confiança. Confiança que se constrói através de relações pessoais. Com o tempo, a relação de confiança nas instituições converteu-se num pilar básico das sociedades modernas, que por sua vez impulsiona instituições públicas fortes e um maior crescimento económico sustentável. Esta confiança ficou muito debilitada nos últimos anos e é responsabilidade de todos (governos e instituições privadas) recuperá-la.

Os bancos querem contribuir começando em primeiro lugar por recuperar a confiança dos clientes no nosso relacionamento com eles. E a maneira de a alcançar é agindo de forma responsável.

Isto significa agir com mais integridade e transparência. Mas também com eficiência para garantir a nossa solidez financeira. O capital social e o capital financeiro são os dois alicerces sobre os quais se fundamenta a confiança na banca.

Em relação ao capital financeiro, os bancos europeus aumentaram a sua base de capital em 600 000 milhões de euros desde o início da crise. Mas para que funcione a transmissão da política monetária necessitamos de clarificação sobre os requisitos de capital.

Os bancos são a principal fonte de financiamento das PME europeias e a segunda para as grandes empresas. O financiamento bancário é de 70% do total da Europa que compara com 30% nos Estados Unidos. A Europa não é os Estados Unidos. As regras globais, para serem justas, têm de ter flexibilidade na sua adaptação.

Taxas de juro baixas podem ajudar à reativação económica, mas apenas se se aumentam os volumes do crédito. As taxas importam, mas o que importa ainda mais é o volume. E o crescimento dos volumes depende de o setor financeiro ter claro o capital que se lhe vai exigir no futuro.

A melhoria da economia europeia dependerá também de que se completem as reformas estruturais. É cedo para cantar vitória, mas os últimos dados indicam que o esforço de todos está a ter efeitos positivos.

Olhando para o futuro, um dos maiores desafios sociais e comerciais será a questão de como incorporar a tecnologia. Em cada dia surge uma startup que nos obriga a repensar como fazemos as coisas.

Os bancos têm a opção de esconder-se atrás das barreiras regulatórias esperando sobreviver ou liderar a transformação.

Regressando à questão de Clay Christensen: o que esperam os nossos clientes de nós?

Os nossos clientes querem saber que os seus depósitos estão seguros. Que têm acesso ao crédito a taxas justas. Que os seus investimentos se administram de forma responsável. Que as suas operações se executam de forma rápida e eficiente.

Se queremos continuar a ter a preferência dos nossos clientes temos de mudar. Em alguns aspetos a mudança pode ser incremental, noutros terá de ser radical.

Mervyn King, antigo governador do Banco de Inglaterra, no seu último livro, O Fim da Alquimia, sugere que deixemos de utilizar as ferramentas económicas tradicionais para prever o futuro e que aceitemos que existimos num estado de "incerteza radical".

King propõe que, no seu lugar, nos foquemos nas tendências de fundo que impulsionam as alterações sociais. Quem sabe se, se tivéssemos seguido o seu conselho, teríamos acertado no vencedor do Prémio Nobel da Literatura deste ano.

Como dizia Bob Dylan na sua canção, quando os tempos começam a mudar, "ou nadas ou afundas-te como uma pedra".

Presidente do Banco Santander

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