Regresso ao trabalho: "Voltar ao confinamento seria desastroso"
Há empresas que gostavam de ter já um regresso presencial ao local de trabalho após o fim das férias, mas a situação de contingência - que o primeiro-ministro anunciou que irá vigorar a partir de dia 15 - poderá frustrar as suas ambições. Do que ninguém quer ouvir falar é de novas restrições à mobilidade. "Seria a desgraça", diz o líder da Associação Empresarial de Portugal (AEP).
O Governo avisou que alargará a todo o país a situação de contingência a partir de 15, baralhando as contas a quem já planeava o regresso aos escritórios. O passo atrás na estratégia pretende acautelar as alterações na rotina que normalmente surgem com o mês de setembro, explicou Mariana Vieira da Silva. "Importa desde já antecipar e preparar, e o Governo considera que esta mudança nas rotinas, na utilização dos transportes, o regresso às aulas e um regresso mais significativo aos locais de trabalho podem necessitar de medidas adicionais", especificou a ministra da Presidência. Os pormenores serão conhecidos mais perto da data - o que deverá acontecer nesta semana. Um atraso que organizações como a AEP ou a Confederação do Comércio e Serviços (CCP) lamentam, destacando a urgência de conhecer as medidas concretas da contingência.
"Havia vontade de ter os colaboradores a regressar ao posto de trabalho, embora haja setores mais predispostos a continuar com o teletrabalho, como a área dos serviços e a comunicação", reconhece Luís Miguel Ribeiro, presidente da AEP. Sublinha, porém, "que não há um modelo ou uma vontade que possam ser interpretados como transversais, quer no sentido do regresso quer no do teletrabalho".
O presidente da AEP reconhece que "uma marca deste tempo é que as situações são muito voláteis, e as decisões são sempre pensadas e repensadas" - e a situação de contingência poderá trazer novas mudanças aos planos das empresas. "Provavelmente aquilo que era o pensamento e a estratégia das empresas, de regressar aos escritórios, pode condicionar o modelo de organização destas empresas - e aí o teletrabalho poderá continuar a ser uma opção."
A diferente modalidade de trabalho dependerá "do setor de atividade e da evolução do surto". "Não sabemos quais vão ser as medidas decretadas pelo Governo, mas uma coisa todos sabemos: o país não pode voltar a uma situação de confinamento como aquela que vivemos. Seria desastroso."
Também João Vieira Lopes, da CCP, reconhece um sentimento de "expectativa", especialmente quando "muitas empresas viram a atividade reduzida também em agosto". "Há uma preocupação bastante grande, porque se a contingência introduzir restrições à mobilidade, a área do comércio e dos serviços ao consumidor sentirá repercussões."
Com a possibilidade de algumas organizações continuarem em teletrabalho, tanto a CCP como a AEP veem com bons olhos a discussão sobre a regulamentação do teletrabalho, especialmente tendo em conta o grande número de pessoas a trabalhar à distância.
"A discussão é pertinente. O teletrabalho já existe há muitos anos em alguns setores, mas não da forma ou da dimensão de hoje e em setores em que há uns tempos não se perspetivava que tal viesse a acontecer", recorda Luís Miguel Ribeiro. "Claro que deve ser regulamentado." Também João Vieira Lopes considera ser um momento adequado para discutir. "Tendo em conta que tem números muito superiores ao que era tradicional, tudo o que possa clarificar as regras é uma discussão que defendemos."
Cátia Rocha é jornalista do Dinheiro Vivo