"Rankings" escolares: uma "luta livre ideológica"

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A semana passada foi de "rankings". Como sucede todos os anos, o espaço mediático foi preenchido com análises e comentários para todos os gostos, acerca das seriações elaboradas pelos jornais, cada um com os seus critérios, com base nas classificações dos exames, fornecidas pelo Ministério da Educação.

Proliferaram as notícias sobre as melhores e as piores escolas, como se fosse possível reduzir a qualidade do trabalho de uma organização escolar às classificações dos seus alunos numa prova de exame que mede, essencialmente, conhecimentos e capacidades associados ao domínio dos conteúdos substantivos de uma determinada disciplina. Não fosse já um exercício suficientemente pobre, acresce o facto de que, em 2021, os exames não foram sequer obrigatórios para a conclusão do ensino secundário. Estes foram, portanto, "rankings" apenas das provas de acesso ao ensino superior.

Não estou, nem quero, desvalorizar a relevância das provas nacionais, sejam elas os exames do ensino secundário ou as provas de aferição no ensino básico. É importante existirem provas, de vários tipos e em todas as áreas curriculares, que vão gerando informação comparável ao longo do tempo. Mas é disparatado destacar as classificações das provas de exame de uma ou duas disciplinas e, com base nisso, categorizar as boas e as más escolas.

Todavia, foi com isto que o país se entreteve, numa "luta livre ideológica", no feliz dizer de Maria João Marques (Público de 13/7/22), comparando escolas privadas com escolas públicas, porventura a mais desonesta comparação que é possível fazer a partir destas seriações. Mesmo para os que querem reduzir todo o trabalho das escolas à mera classificação numa prova de exame, a comparação continua a ser profundamente desonesta e desprovida de sentido. Por uma razão muito simples: as escolas privadas são autónomas no seu modelo de gestão, escolhem os seus professores e escolhem os seus alunos. As escolas públicas não.

A comparação poderia eventualmente ser tentada se os docentes das escolas privadas aí fossem colocados pelo concurso nacional de professores, os seus alunos distribuídos pelo portal nacional das matrículas, na observância do despacho normativo que regula o processo, e o seu modelo de gestão regulado pelo regime jurídico de administração e gestão das escolas. Ou, pelo contrário, se as escolas públicas tivessem total autonomia para recrutar os seus professores, selecionar os seus alunos e definir o seu modelo de gestão. Dito de outro modo, se as escolas privadas se equiparassem a públicas ou estas se equiparassem a privadas.

Daqui resulta o absurdo de comparar o incomparável: escolas privadas e escolas públicas. Trata-se de uma discussão enviesada e insidiosa. Bem mais útil será a definição e estabilização de um conjunto de instrumentos e indicadores de avaliação do trabalho das escolas, necessariamente mais abrangentes, geradores de uma maior diversidade de dados, que conduzam a debates e discussões de maior profundidade acerca do que se passa nas organizações escolares.


Professor do ensino superior

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