Foi eleito sem oposição num voto no Parlamento sul-africano, mas a facilidade aparente de uma vitória previsível não esconde as dificuldades reais com que Cyril Ramaphosa terá de enfrentar e resolver enquanto novo presidente daquela que é a economia mais desenvolvida de África..Desafios que são principalmente económicos. O desemprego está nos 28%, vive-se em recessão, a notação das agências coloca a África do Sul no nível "lixo" e há a perceção que as empresas públicas não estão a cumprir o seu papel e que se vive numa atmosfera generalizada de corrupção. Este último aspeto deve-se, pelo menos em parte, ao presidente cessante, Jacob Zuma, que viu o nome associado a uma série de escândalos. Um desses casos conheceu ontem um desenvolvimento, com um dos três irmãos Gupta, Ajay, suspeitos de ligações ao ex-presidente, a iludir a captura pela polícia, tendo sido declarado "fugitivo à justiça" pelo procurador-geral da África do Sul. Um dos filhos de Zuma, assim como a sua filha, trabalharam nas empresas dos Gupta e os irmãos teriam usado a ligação à família do presidente para obterem vantagens para as suas empresas. Segundo dados da investigação, os Gupta chegaram a intervir na designação de ministros e terão tentado obter passaportes diplomáticos..Zuma, que cumpria um segundo e último mandato, tentou resistir até ao fim à indicação da direção do ANC para abandonar o cargo. O mandato só deveria terminar no próximo ano. Este será agora completado por Ramaphosa, que era vice-presidente e assumiu a liderança do ANC em congresso realizado em dezembro e em que Zuma viu o seu candidato, sua ex-mulher Nkosazana Dlamini-Zuma, ser derrotado. As próximas eleições deverão realizar-se em maio de 2019..No plano político, o ANC, que governa o país desde o fim do apartheid em 1991, tem visto cair o nível de apoio, tendo sofrido vários revezes eleitorais. No entanto, segundo recentes sondagens a sua hegemonia na África do Sul não está em causa, recolhendo sempre mais de 40% das intenções de voto enquanto a principal força da oposição, a Aliança Democrática, nunca sobe mais do que 20 a 22%..Na intervenção após a eleição, Ramaphosa, de 65 anos, disse claramente que "as questões da corrupção, do reforço da eficácia do setor público e como devemos lidar com a captura do Estado por interesses particulares estão no centro da nossa atenção". Sinal de que a saída de Zuma e posse de Ramaphosa foram vistas de forma positiva pelos mercados viu-se na bolsa sul-africana, cujo índice subiu ontem mais de 4% - a maior subida em dois anos..Quase 30 anos após o fim do regime da minoria branca, a África do Sul permanece um país com profundas desigualdades sociais e ainda polarizado nas questões raciais, com os sucessivos governos do ANC a ficarem aquém das expectativas da população negra. Um facto reconhecido por Ramaphosa, que disse estar "pronto a trabalhar arduamente para não desiludir os sul-africanos". O seu primeiro discurso oficial como presidente irá suceder hoje na Cidade do Cabo e nele, como referiu ontem Ramaphosa, começarão a ser anunciadas "medidas para combater os problemas que conhecemos"..A eleição de Ramaphosa foi boicotada pelo segundo partido da oposição, Combatentes pela Liberdade Económica de Julius Malema, que nasceu de uma cisão no ANC..Ramaphosa, o principal representante do ANC nas negociações que puseram fim ao apartheid, foi também um dos protagonistas da elaboração da Constituição sul-africana pós-1991. A Reuters recordava ontem que a importância de Ramaphosa naquelas negociações foi tal que, ao referir-se este processo, é geralmente acompanhado da expressão "antes de Ramaphosa" e "depois de Ramaphosa"..Membro de uma minoria étnica na África do Sul, os vendas, e líder sindical sob o apartheid, virou-se para os negócios quando foi preterido por Thabo Mbeki para o cargo de vice-presidente de Nelson Mandela. Enquanto acionista da Lonmin, empresa proprietária da mina de Marikana, viu o nome associado ao massacre de 12 de agosto de 2012, em 34 mineiros foram mortos pela polícia. Uma investigação posterior absolveu-o de qualquer responsabilidade nos acontecimentos.