"Queremos definir o que se faz nesta área a nível internacional"

Ser parceiro no consórcio internacional do ESPRESSO foi o resultado de um crescimento robusto e planeado, diz José Afonso, coordenador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço
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A participação no consórcio do ESPRESSO representa uma nova fase para a comunidade científica nacional nesta área?

Sim. No passado tivemos participações muito importantes em instrumentos para o telescópio VLT, mas neste é a primeira vez que lideramos com outros parceiros internacionais todo o processo, desde o problema científico à conceção do instrumento, construção e instalação no telescópio, que é um dos melhores do mundo. Isso inclui também a definição do aproveitamento científico para este instrumento.

É uma nova fase de maturidade da comunidade científica nesta área, em Portugal?

Estamos a atingir uma maioridade no panorama internacional que nunca tivemos. Houve um crescimento robusto que agora atinge o expoente, somos um parceiro internacional que é desejado pelos nossos colegas dos outros países.

A constituição do Instituto de Astrofísica e do Espaço (IA), em 2014, foi decisiva para isso?

Sim, o IA foi decisivo para mudarmos de escala. Uma unidade de investigação pequena pode participar em projetos internacionais e aproveitar do ponto de vista científico, e nós fizemo-lo. Mas o que é importante, e o que queremos, é definir o que se faz cientificamente e estar envolvidos ao mesmo tempo na parte científica e na instrumental. A fusão dos centros de astrofísica das universidades de Lisboa e Porto foi pensada para dar resposta a essa necessidade.

Isso abre caminho a outras participações internacionais?

Sim, logo a seguir ao ESPRESSO surgiu a oportunidade para outro instrumento para o VLT, o MOONS, para estudar a evolução das galáxias, e a coerência é a mesma: estamos lá desde a definição do instrumento, ao seu conceito, desenho, construção, instalação e aproveitamento científico. Além disso, a continuidade do ESPRESSO e do MOONS, nos instrumentos da geração seguinte, já está planeada e já estamos a trabalhar nos conceitos. Mostramos ter a estabilidade suficiente para um projeto que leva dez anos a concluir e também para o futuro, mas ter esta estabilidade é um desafio. Se não há estabilidade nas equipas o conhecimento perde-se.

É um risco no vosso caso?

É. Contamos ser capazes de manter toda esta capacidade que está a ser criada. Mas não é garantido.

Depende de quê?

Uma grande parte das pessoas nas equipas não estão ligadas a longo prazo às universidades ou às instituições, temos de conseguir recursos para as manter. Em Portugal é muito complicado fazer planos a muito longo prazo. Temos planos a 10, 15 anos, mas não temos nenhuma garantia de financiamento estável a 10, 15 anos, ou sequer a cinco ou seis anos, o que é o maior dos problemas.

O que é preciso mudar?

É preciso visão de longo prazo. As instituições são financiadas a três anos, mas nestas áreas é fundamental prever os problemas científicos e o desenvolvimento da instrumentação a 10 ou 15 anos. Inevitavelmente temos de arriscar porque ainda não temos uma perspetiva de financiamento a longo prazo, mas noutros países há perspetiva a mais longo prazo, o que lhes dá garantias para o envolvimento nestes projetos. Isso ainda é mais gritante para os projetos espaciais da ESA [a agência espacial europeia], por exemplo, em que também estamos envolvidos. Neste momento estamos a discutir missões para 2028 e para 2034 e ainda não sabemos qual é o nosso financiamento para daqui a dois anos. É um risco, mas não pode ser de outra forma. Fazer de outra forma seria não ter agora um ESPRESSO a ser instalado no VLT, seria não pensar que vamos estar a fazer a melhor ciência daqui a dois anos, e nos anos seguintes, e isso para nós não é aceitável.

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