Quem dança no baile socialista?

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O baile socialista começou mais cedo que o esperado. Embalado pela demissão de António Costa e pela dissolução da Assembleia anunciada por Marcelo Rebelo de Sousa, o PS tremeu e José Luís Carneiro apressou-se a entrar no salão onde Pedro Nuno Santos há muito reservara lugar.

Agora discutem-se os parceiros - melhor seria se discutissem a música com que um, inevitavelmente, dançará até março, o mês das eleições legislativas com que ninguém contava. José Luís Carneiro marcou o ritmo, logo na entrada da Comissão Nacional do PS, apresentando a ideia de "pagar o que devemos" como essencial e dando o primeiro passo em volta do adversário, cuja ameaça, em tempos de troika, de não pagar a dívida do Estado à Alemanha ficou famosa. Seguiu-se um twist, um passo para definir a localização no salão: Carneiro apresenta-se ao centro e prontamente garantiu que não será por si que "o Chega chega ao poder" - um sinal de abertura de que poderá viabilizar um Governo social-democrata em caso de derrota. Passo em falso? Pedro Nuno Santos não deixou escapar. À esquerda na sala, o antigo responsável pela coordenação política da geringonça acelerou: os seus estão "concentrados exclusivamente em derrotar a direita", com PSD, naturalmente, incluído. Ontem, no Fórum da TSF, à dança juntou-se Maria da Luz Rosinha, da coordenação da campanha de Carneiro, para explicar que afinal tudo não passou de uma frase menos feliz e que "não está no horizonte do PS viabilizar um Governo do PSD". E faz sentido traçar cercas sanitárias em torno de partidos democráticos?

Por estes dias em Espanha, onde Pedro Sánchez apresenta o Governo, não faltam exemplos de como, para quem ambiciona governar, o melhor é não excluir parceiros de dança e de como o mais sensato será discutir políticas e medidas, as que unem, as que afastam e as que ficam para lá das famosas linhas vermelhas e que excluem eventuais parceiros de dança. Quanto mais não seja, porque, ao definir bem a programação do baile, os desalinhados acabarão por sair do salão, condenados pela falta de substância ou coerência entre propostas e discurso. Lá, como cá, não falta quem esteja disposto a cantarolar qualquer canção para chegar a posição de influenciar o rumo do país. Lá, como cá, o baile tem sido rápido e os passos nem sempre bem medidos.

As legislativas do próximo mês de março estarão entre as mais imprevisíveis da democracia portuguesa. Alguém ficará surpreendido se ganhar um partido do centro-direita num Parlamento maioritariamente de esquerda? E se ganhar o PS e a maioria ficar à sua direita? Em tempos de baile acelerado, quase improvisado, pode ser mais sensato definir a música antes de escolher o parceiro. Quanto mais não seja porque às vezes todos acabamos de mãos dadas com quem menos esperamos. Quem se lembra de quando PS e CDS se juntaram, nos idos de 1978, para que Mário Soares dançasse de mãos dadas com o então líder democrata-cristão, Freitas do Amaral?

Subdiretor do Diário de Notícias

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