Que Macron interessa a Portugal? - agora
Escrevi há 5 anos para o DN um artigo com o título Que Macron interessa a Portugal?. Cinco anos de mandato acabados, com uma reeleição menos renhida que receava face a Marine Le Pen, interessa novamente colocar esta questão.
Há 5 anos, com os mesmos protagonistas, escrevia que a eleição de Emmanuel Macron deixava a França sem soluções à vista. "A eleição de Emmanuel Macron à presidência francesa não resolve nenhum dos problemas." A dita "frente republicana" funcionou, os eleitores nacionalistas de Zemmour não se mobilizaram tanto para Marine Le Pen e os democratas do meu e muitos outros partidos preferiram evitar uma aventura perigosa. Pois bem, evitámos, de facto, agora uma situação complicadíssima para a Europa e para as liberdades em França, mas falta projeto.
O que faz subir o populismo, seja de esquerda ou de direita, em França como em outros países do nosso mundo? Para os franceses, há temas reais. A falta de controlo das nossas fronteiras, a passividade relativamente a algumas pessoas que não respeitam, e até desafiam, os nossos costumes e a nossa cultura, levam as nossas sociedades a fechar-se a quem vem de fora. Sou um imigrante em Portugal há 29 anos, mas falo português, canto o vosso hino e trabalho para a vossa economia. Para serem bem recebidos em Portugal, os franceses têm de perceber que devem aprender a língua, respeitar os costumes e apoiar a sociedade. Localmente, escolhi para a minha campanha a referência "Dois países, uma comunidade", porque é disso que se trata: reconhecer a comunhão de interesses entre os portugueses de França, quase todos muito bem integrados e apreciados, e dos franceses que escolhem viver neste maravilhoso país à beira-mar. A realidade é bastante mais dura com outros imigrantes e não podemos mais deixar quem desafia a nossa cultura abusar da nossa benevolência. Para cada direito existe um dever.
CitaçãocitacaoVai ser muito interessante verificar se Macron consegue novamente ganhar uma maioria dos deputados, ou se vai ter de pedir aulas para gerir uma "geringonça" francesa.esquerda
Outro problema "gordo" é a economia. Aqui também, França e Portugal partilham o mesmo gosto de fuga para o abismo. Não se pode gerir um Estado com défice permanente, deixando subir a dívida que as gerações futuras terão de pagar. Não se pode resolver tudo com mais funcionários públicos, que trabalham menos horas. Temos de fazer todos escolhas, de modo a reduzir muito mais os custos dos impostos para a nossa economia e a nossa competitividade. Macron chegou prometendo tornar o Estado mais eficiente e comedido, acabou por ceder: não fez uma única reforma relevante durante o seu primeiro mandato.
Na Europa, estamos sem sucessor à vista para o papel que Merkel desempenhou, com subserviência de Macron e dos governos do sul. O líder de um país endividado, cheio de problemas internos, como são a Itália, Espanha ou França, não está em condições de dar lições e definir o rumo do futuro. Primeiro, é preciso demonstrar capacidade de reforma em casa. A Europa continua a precisar desta liderança e Macron deve "mudar o chip" e agarrar, de facto, os problemas económicos, sociais e ambientais da França, construindo, com os deputados que vamos eleger em junho, uma ampla plataforma reformista.
O sistema francês, desde De Gaulle, funciona com um equilíbrio muito particular entre o Presidente da República, que preside ao Conselho de Ministros e nomeia o primeiro-ministro, e o Parlamento, dividido entre a Assembleia e o Senado. Em 2017, Emmanuel Macron conseguiu uma maioria larga de deputados, muitos dos quais contribuíram pouco para a relação com as populações e a redução dos erros da sua governação. A contestação dos gilets jaunes [coletes amarelos] e a crispação social podiam ter sido amenizadas com deputados bem implantados e credíveis para fazer a ponte. O meu partido, Les Républicains [Os Republicanos], que reforçou a sua maioria no Senado, e numa proporção menor o Partido Socialista, mantiveram o essencial das câmaras municipais, distritos e regiões. Vai ser muito interessante verificar se Macron consegue novamente ganhar uma maioria dos deputados, ou se vai ter de pedir aulas para gerir uma "geringonça" francesa.
Presidente do Conseil Consulaire (Portugal)