Quando Portugal mandar
Segundo um mito urbano, a terceira segunda-feira de janeiro (o próximo dia 21, neste caso) é o dia mais triste do ano porque, além do clima (no hemisfério norte), é quando a maior parte de nós descobre que afinal não deixou de fumar, não passou a ir ao ginásio quatro vezes por semana, a fazer dieta e tudo o mais que são resoluções de Ano Novo. Esta historieta, criada há uns anos por um agente de viagens, embora seja falsa, tem qualquer coisa de verdade: ao fim de pouco tempo de resoluções de última hora descobrimos que nenhuma se cumpre. Ou seja, e é este o pretexto desta conversa, o melhor é tomar resoluções de Ano Novo com boa antecedência. No caso que aqui interessa, esta é uma boa altura para estarmos a preparar a presidência portuguesa da União Europeia, que vai acontecer no primeiro semestre de 2021. Coisa que, reconheça-se, o governo já começou a fazer. Mas esta preparação, apesar de ser uma responsabilidade do executivo, merece ser um tema nacional.
Durante aqueles seis meses, Portugal não vai, de facto, mandar na União Europeia, mas vai dirigir as reuniões, escolher os temas a que quer der mais atenção e aqueles que quer que fiquem resolvidos. Para se ter sucesso num tão curto espaço de tempo, é necessário pensar com antecedência e estratégia.
Esta já não é a primeira vez. Será a quarta presidência portuguesa da UE. E, além do histórico, temos gente. Temos um ex-presidente da Comissão Europeia e gente que trabalhou nas instituições com e no tempo de Durão Barroso. Seria inteligente aproveitar este conhecimento. E temos (ou devíamos ter) temas que fazem parte da nossa agenda tradicional.
Daqui a dois anos é uma boa altura para começar a recuperar a relação da União Europeia com o Reino Unido. As feridas do Brexitpodem ter começado a sarar e finalmente temos um pretexto real para dar significado à nossa tão falada "mais antiga aliança".
A relação da Europa com África, onde há uma óbvia competição com a China, e onde Portugal tem recursos e conhecimentos, devia ser outra das nossas prioridades. E, exatamente na mesma lógica, mas por antecipação, com a América do Sul.
Mas o mais importante, mesmo, é como gerir a integração que aí vem. Quem presta atenção aos temas europeus sabe que as uniões monetária, bancária, energética e por aí fora são, sobretudo, sinónimo de maior integração e de coordenação de políticas entre Estados membros. O resultado desse processo pode muito bem ser a criação de grandes players europeus, para terem escala mundial, e o definhar dos atores nacionais. Se não é isso que queremos, temos de saber usar a presidência portuguesa da UE para contrariar e também fazer parte da gestão dessa dinâmica.
Ninguém, muito menos um país médio a presidir, manda sozinho na União Europeia. Mas há uma quota-parte de poder que tem de ser exercida, e que tem de estar alinhada com a agenda nacional. É por isso que é agora, com dois anos de antecedência, que se tem de começar.