O cenário já há muito tinha ficado assente, mas agora a FIFA confirmou as datas do próximo Mundial de 2022, a realizar-se no Qatar em plena época de outono no hemisfério norte: de 21 de novembro a 18 de dezembro. Vinte e oito dias que farão desse o mais curto campeonato do mundo desde o Argentina 1978, que teve a duração de 25 dias..As razões para este calendário inédito são conhecidas: o extremo calor que se faz sentir nos meses verão no Qatar, com temperaturas que podem atingir os 50 graus. Pouco depois da polémica atribuição do Mundial 2022 àquele país do Médio Oriente em dezembro de 2010, foi um comité médico da própria FIFA a aconselhar a realização do torneio fora da tradicional época de verão no hemisfério norte, para salvaguardar a saúde dos jogadores envolvidos..Liga e FPF têm grupo de trabalho conjunto.A alteração ameaça, contudo, revolucionar os calendários das diversas competições do futebol mundial, afetando especialmente os campeonatos europeus bem como as provas da UEFA. E levantará desafios extra aos clubes do Velho Continente na preparação de uma época que será interrompida a meio para a realização do campeonato do mundo. Desafios logísticos, de calendário e também de ciclos de forma para equipas e jogadores..Os críticos não demoraram a fazer-se ouvir. "O Campeonato do Mundo sempre foi um espetáculo bem-vindo num longo verão livre de futebol, e não uma interrupção da época futebolística. Infelizmente vamos ter de esperar oito anos por isso", escreveu, por exemplo, o antigo internacional inglês Gary Lineker, no Twitter. As principais ligas europeias também já tinham feito chegar o seu protesto ao longo do processo, mas de nada valeu.."Em novembro e dezembro os jogadores estão bem preparados, porque é quase o início da temporada. As federações estão informadas e terão de adaptar os seus calendários", resumiu nesta sexta-feira Gianni Infantino, presidente da FIFA, em Moscovo..A Liga Portugal e a Federação Portuguesa de Futebol têm um grupo de trabalho conjunto que já está a estudar o assunto e, a seu tempo, anunciarão quaisquer alterações aos calendários, disse ao DN fonte da Liga..Mas que dificuldades se colocam a um treinador que tem de planear uma época que provavelmente começará mais cedo, acabará mais tarde e terá entre mês e meio e dois meses de interrupção? E aos preparadores físicos que terão de gerir a forma física dos jogadores numa época tão atípica? Foi o que o DN procurou perceber junto de experientes técnicos do futebol português..Treinadores alertam para importância de manter equipas em competição.Manuel José, treinador com mais de 500 jogos na I Liga, não esconde uma visão crítica sobre o próximo Mundial. "Não faz sentido nenhum disputar-se no Qatar, mas foi uma decisão que fez entrar dinheiro nos bolsos de muita gente. As federações deviam ter reclamado, agora têm de se adaptar", começa por dizer.."Para os jogadores que vão ao Mundial, há essa saída do ambiente dos clubes para um mês ou dois meses na seleção com outros métodos e outros hábitos, mas continuam a competir. Os que ficam nos clubes veem-se obrigados a uma interrupção, como acontece nos países onde já há paragens de inverno", acrescenta o veterano técnico..Para Manuel José, "os clubes vão ter de ter competição, para não haver uma quebra de forma abrupta a meio da temporada". "Torneios, provas que estimulem competição e intensidade, não pode ser só amigáveis nesse tempo todo", refere. "Eventualmente, a Taça da Liga, noutro formato", sugere, dizendo que um treinador "não tem outro remédio se não adaptar-se", como ele próprio o fez no Egito das quatro vezes que teve de disputar o Mundial de clubes a meio da temporada, embora aí a interrupção fosse "mais curta". Também Manuel Machado perspetiva que o problema maior que se coloque "seja o preenchimento de sete a oito semanas sem competição", embora ressalvando que "ainda não se conhecem todos os dados objetivos de análise". "Pode aparecer aí nesse período uma Taça da Liga, umas eliminatórias da Taça de Portugal", exemplifica. "Mas se houver uma paragem efetiva e total naquele período, os clubes e treinadores terão de ser criativos para não haver acentuadas quebras de rendimento", acrescenta o técnico, que já orientou diversas equipas na I Liga (Moreirense, V. Guimarães, Nacional, Braga, Arouca)..Ainda assim, lembra Manuel Machado, esta é uma realidade com que se confrontam já atualmente campeonatos do outro hemisfério. "Na América do Sul, por exemplo, alguns campeonatos interromperam agora para o campeonato do mundo. Nós é que estamos habituados a olhar para o nosso pequeno universo. Mesmo na Europa, os países nórdicos ou do Leste também vivem já essa realidade, com as paragens de inverno.".Assim é, de facto. O Brasileirão parou na véspera do arranque do Mundial, com 12 jornadas completadas, retomando agora na próxima quarta-feira (18 de julho). Na China aconteceu o mesmo, o que trouxe por exemplo o Shanghai SIPG de Vítor Pereira até Portugal, para um estágio..Uma segunda pré-época.Esses estágios, que na prática funcionam quase como uma segunda pré-época a meio da própria temporada, serão provavelmente o recurso mais utilizado pelos clubes europeus durante o Mundial do Qatar 2022. Pelo menos assim o vê, a esta distância, o preparador físico Fidalgo Antunes, atualmente a trabalhar no Vitória de Setúbal, depois de uma longa carreira que já o levou também a trabalhar em países do Médio Oriente.."O que posso dizer é que não há outra hipótese de fazer um Mundial no Qatar que não seja nos meses de outono/inverno. Já trabalhei na Arábia Saudita e aquilo eram 50 graus durante o dia no verão", avisa, desdramatizando depois as consequências desse campeonato entre novembro e dezembro para as diversas competições do futebol europeu.."Não é assim uma coisa tão trágica. Acontece em vários sítios e aqui no nosso cantinho vamos ter de nos adaptar também. É como uma segunda pré-época, há que fazer alguns jogos particulares, torneios, arranjar maneira de se manter uma forma competitiva aceitável", descreve, relativizando a quebra de rendimento dos jogadores que terão de ficar quase dois meses sem competição. "Haverá sempre alguma, mas como é igual para todos não é dramático." E para quem vai ao Mundial "a época não será mais longa, será apenas mais intensa, mas isso também se gere"..O melhor, portanto, parece ser mesmo relativizar e abraçar a nova experiência com o melhor espírito possível. Até porque, e aí todos coincidem, "os jogadores que forem ao Mundial vão aparecer numa fase de exaltação de forma", diz Manuel Machado. O que pode proporcionar um Mundial inesquecível no Qatar. Diferente será, pelo menos.
O cenário já há muito tinha ficado assente, mas agora a FIFA confirmou as datas do próximo Mundial de 2022, a realizar-se no Qatar em plena época de outono no hemisfério norte: de 21 de novembro a 18 de dezembro. Vinte e oito dias que farão desse o mais curto campeonato do mundo desde o Argentina 1978, que teve a duração de 25 dias..As razões para este calendário inédito são conhecidas: o extremo calor que se faz sentir nos meses verão no Qatar, com temperaturas que podem atingir os 50 graus. Pouco depois da polémica atribuição do Mundial 2022 àquele país do Médio Oriente em dezembro de 2010, foi um comité médico da própria FIFA a aconselhar a realização do torneio fora da tradicional época de verão no hemisfério norte, para salvaguardar a saúde dos jogadores envolvidos..Liga e FPF têm grupo de trabalho conjunto.A alteração ameaça, contudo, revolucionar os calendários das diversas competições do futebol mundial, afetando especialmente os campeonatos europeus bem como as provas da UEFA. E levantará desafios extra aos clubes do Velho Continente na preparação de uma época que será interrompida a meio para a realização do campeonato do mundo. Desafios logísticos, de calendário e também de ciclos de forma para equipas e jogadores..Os críticos não demoraram a fazer-se ouvir. "O Campeonato do Mundo sempre foi um espetáculo bem-vindo num longo verão livre de futebol, e não uma interrupção da época futebolística. Infelizmente vamos ter de esperar oito anos por isso", escreveu, por exemplo, o antigo internacional inglês Gary Lineker, no Twitter. As principais ligas europeias também já tinham feito chegar o seu protesto ao longo do processo, mas de nada valeu.."Em novembro e dezembro os jogadores estão bem preparados, porque é quase o início da temporada. As federações estão informadas e terão de adaptar os seus calendários", resumiu nesta sexta-feira Gianni Infantino, presidente da FIFA, em Moscovo..A Liga Portugal e a Federação Portuguesa de Futebol têm um grupo de trabalho conjunto que já está a estudar o assunto e, a seu tempo, anunciarão quaisquer alterações aos calendários, disse ao DN fonte da Liga..Mas que dificuldades se colocam a um treinador que tem de planear uma época que provavelmente começará mais cedo, acabará mais tarde e terá entre mês e meio e dois meses de interrupção? E aos preparadores físicos que terão de gerir a forma física dos jogadores numa época tão atípica? Foi o que o DN procurou perceber junto de experientes técnicos do futebol português..Treinadores alertam para importância de manter equipas em competição.Manuel José, treinador com mais de 500 jogos na I Liga, não esconde uma visão crítica sobre o próximo Mundial. "Não faz sentido nenhum disputar-se no Qatar, mas foi uma decisão que fez entrar dinheiro nos bolsos de muita gente. As federações deviam ter reclamado, agora têm de se adaptar", começa por dizer.."Para os jogadores que vão ao Mundial, há essa saída do ambiente dos clubes para um mês ou dois meses na seleção com outros métodos e outros hábitos, mas continuam a competir. Os que ficam nos clubes veem-se obrigados a uma interrupção, como acontece nos países onde já há paragens de inverno", acrescenta o veterano técnico..Para Manuel José, "os clubes vão ter de ter competição, para não haver uma quebra de forma abrupta a meio da temporada". "Torneios, provas que estimulem competição e intensidade, não pode ser só amigáveis nesse tempo todo", refere. "Eventualmente, a Taça da Liga, noutro formato", sugere, dizendo que um treinador "não tem outro remédio se não adaptar-se", como ele próprio o fez no Egito das quatro vezes que teve de disputar o Mundial de clubes a meio da temporada, embora aí a interrupção fosse "mais curta". Também Manuel Machado perspetiva que o problema maior que se coloque "seja o preenchimento de sete a oito semanas sem competição", embora ressalvando que "ainda não se conhecem todos os dados objetivos de análise". "Pode aparecer aí nesse período uma Taça da Liga, umas eliminatórias da Taça de Portugal", exemplifica. "Mas se houver uma paragem efetiva e total naquele período, os clubes e treinadores terão de ser criativos para não haver acentuadas quebras de rendimento", acrescenta o técnico, que já orientou diversas equipas na I Liga (Moreirense, V. Guimarães, Nacional, Braga, Arouca)..Ainda assim, lembra Manuel Machado, esta é uma realidade com que se confrontam já atualmente campeonatos do outro hemisfério. "Na América do Sul, por exemplo, alguns campeonatos interromperam agora para o campeonato do mundo. Nós é que estamos habituados a olhar para o nosso pequeno universo. Mesmo na Europa, os países nórdicos ou do Leste também vivem já essa realidade, com as paragens de inverno.".Assim é, de facto. O Brasileirão parou na véspera do arranque do Mundial, com 12 jornadas completadas, retomando agora na próxima quarta-feira (18 de julho). Na China aconteceu o mesmo, o que trouxe por exemplo o Shanghai SIPG de Vítor Pereira até Portugal, para um estágio..Uma segunda pré-época.Esses estágios, que na prática funcionam quase como uma segunda pré-época a meio da própria temporada, serão provavelmente o recurso mais utilizado pelos clubes europeus durante o Mundial do Qatar 2022. Pelo menos assim o vê, a esta distância, o preparador físico Fidalgo Antunes, atualmente a trabalhar no Vitória de Setúbal, depois de uma longa carreira que já o levou também a trabalhar em países do Médio Oriente.."O que posso dizer é que não há outra hipótese de fazer um Mundial no Qatar que não seja nos meses de outono/inverno. Já trabalhei na Arábia Saudita e aquilo eram 50 graus durante o dia no verão", avisa, desdramatizando depois as consequências desse campeonato entre novembro e dezembro para as diversas competições do futebol europeu.."Não é assim uma coisa tão trágica. Acontece em vários sítios e aqui no nosso cantinho vamos ter de nos adaptar também. É como uma segunda pré-época, há que fazer alguns jogos particulares, torneios, arranjar maneira de se manter uma forma competitiva aceitável", descreve, relativizando a quebra de rendimento dos jogadores que terão de ficar quase dois meses sem competição. "Haverá sempre alguma, mas como é igual para todos não é dramático." E para quem vai ao Mundial "a época não será mais longa, será apenas mais intensa, mas isso também se gere"..O melhor, portanto, parece ser mesmo relativizar e abraçar a nova experiência com o melhor espírito possível. Até porque, e aí todos coincidem, "os jogadores que forem ao Mundial vão aparecer numa fase de exaltação de forma", diz Manuel Machado. O que pode proporcionar um Mundial inesquecível no Qatar. Diferente será, pelo menos.