Puigdemont apela à união após o adiar da investidura
Milhares de Carles Puigdemonts protestaram ontem contra o adiamento da sessão de investidura no Parlamento catalão, mas do verdadeiro só havia sinal nas redes sociais. O ex-presidente da Generalitat lançou um apelo à união dos independentistas, depois de os deputados do Junts per Catalunya (JxC) e de os da Candidatura de Unidade Popular (CUP, radicais) terem criticado a decisão do presidente do Parlamento, Roger Torrent, da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), de adiar a sessão. "A democracia não se adia ou suspende", lançou Puigdemont.
Munidos de máscaras com o rosto do ex-presidente da Generalitat, os manifestantes romperam o cordão policial em redor do Parlamento catalão e entraram no Parque da Cidadela, gerando momentos de tensão com os Mossos d"Esquadra (polícia catalã). Pelo menos três manifestantes tiveram de receber tratamento médico, assim como vários agentes. Os principais movimentos sociais independentistas, a Assembleia Nacional Catalã e a Òmnium Cultural cancelaram a meio da tarde o protesto, mas outros grupos decidiram acampar no parque durante toda a noite e os deputados não independentistas precisaram de escolta policial para deixar o Parlamento.
"O plenário de investidura não se vai desconvocar, mas é adiado" até que possa realizar-se "com valor real e efetivo", afirmou Torrent logo pela manhã, ainda antes de se reunir com o resto da Mesa do Parlamento. O presidente não indicou uma nova data, dizendo estar pendente da decisão final do Tribunal Constitucional sobre a investidura à distância de Puigdemont. Os magistrados decidiram no sábado que esta não era possível e que o ex--presidente da Generalitat tem de pedir autorização ao juiz Pablo Llarena, do Supremo Tribunal, para poder assistir pessoalmente à sessão. Deram ainda dez dias para o Parlamento catalão e o próprio Puigdemont apresentarem os seus argumentos, antes da decisão final.
Torrent e o resto da Mesa do Parlamento arriscavam processos legais caso avançassem com a investidura à distância. O presidente do Parlamento criticou contudo o Tribunal Constitucional e o governo espanhol, recusando propor outro candidato à investidura, lembrando que Puigdemont é quem reúne mais apoios. Se voltar a Espanha, o ex-presidente arrisca ser preso, já que é alvo de um mandado de detenção ao abrigo da investigação por rebelião, sedição e peculato na organização do referendo de 1 de outubro e consequente declaração unilateral de independência.
A decisão de Torrent não foi contudo recebida com bons olhos pelos deputados da lista de Puigdemont. O JxC considerava que estavam reunidas "as condições políticas" para realizar ontem a sessão de investidura , lamentando o facto de os seus representantes não terem sido informados ou consultados sobre o que Torrent queria fazer. Contudo, segundo os media catalães, o presidente do Parlamento terá tentado contactar pelo menos cinco vezes Puigdemont por telemóvel, sem sucesso. A CUP foi ainda mais crítica, alegando que não devia ser feita "qualquer concessão ao Estado" porque "a democracia não se adia". Os quatro deputados desta formação radical apresentaram-se no plenário às 15.00 (14.00 em Lisboa), hora prevista para a sessão de investidura, em sinal de protesto.
Pelo contrário, a ERC congratulou-se com a decisão de Torrent. O ex-vice-presidente da Generalitat Oriol Junqueras enviou uma mensagem da prisão madrilena onde se encontra detido, ao abrigo do mesmo processo judicial que Puigdemont. "Obrigado, presidente, por garantires a defesa dos direitos de todos os deputados eleitos democraticamente. Obrigado pelo teu compromisso em defesa da Catalunha, da democracia e da recuperação das instituições", lia-se no Twitter.
Foi também através das redes sociais que Puigdemont reagiu, ao princípio da noite, apelando à unidade para acabar com a aplicação do artigo 155.º da Constituição, que na prática suspende a autonomia da Catalunha. "Chegou o momento do soberanismo dar uma resposta coordenada e unitária", disse num vídeo de quase oito minutos no YouTube. "O que nos levou até aqui foi a união, não a podemos perder. Mantenhamo-nos unidos porque virão outros desafios", acrescentou, lamentando que não tenha havido investidura, mas dizendo que é preciso respeitar a decisão de Torrent. "Não há outro candidato possível, nem outra maioria", reiterou.
O adiamento da sessão de investidura deixa o Parlamento catalão num limbo legal, já que as regras estabelecem que uma primeira votação tem de ocorrer no prazo de dez dias úteis após o início da legislatura. Caso o candidato a presidente da Generalitat não consiga ser eleito (na primeira votação por maioria absoluta e na segunda, 48 horas depois, por maioria simples), começa a contar o prazo de dois meses até ser necessário convocar novas eleições. A dúvida é se este prazo já está a contar ou não. Os juristas do Parlamento catalão foram chamados a pronunciar-se sobre o tema.