Psiquiatra Nuno Madeira vence prémio da FLAD para investigação em saúde mental
O psiquiatra e investigador Nuno Madeira venceu o prémio FLAD Science Award Mental Health 2023, promovido todos os anos pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD). O médico irá fazer um ensaio clínico em que irá testar uma técnica de estimulação cerebral para ajudar nas dificuldades de cognição social de pessoas com esquizofrenia.
O projeto vencedor, BS2C - Non-invasive Brain Stimulation for Social Cognitive impairment in Schizophrenia, foi desenvolvido por uma equipa multidisciplinar do Centro de Imagem Biomédica e Investigação Translacional (CIBIT) e do Instituto de Psicologia Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Este prémio da FLAD é um apoio a jovens investigadores portugueses para desenvolver novas linhas de investigação clínica em saúde mental em colaboração com centros de investigação americanos. Com este prémio de 300 mil euros, Nuno Madeira e a sua equipa vão trabalhar em parceria com o Biological Affect Modulation Lab da University of Pittsburgh, School of Medicine.
Nuno Madeira, de 42 anos, além de investigador é professor na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e há mais de 10 anos que se dedica, com a sua equipa, a uma intervenção dirigida às pessoas recentemente diagnosticadas com esquizofrenia. "Neste contexto fomos desenvolvendo alguns projetos de investigação, incluindo o meu doutoramento, que estudou as alterações cerebrais subjacentes às dificuldades sociais presentes em pessoas com esquizofrenia", conta Nuno Madeira ao DN.
A esquizofrenia é considerada uma das doenças mais graves do foro psicológico e que pode ser bastante incapacitante para quem a tem. Uma das suas dimensões mais prejudiciais é a dificuldade na cognição social. "Neste projeto vamos fazer um ensaio clínico em que testaremos uma técnica de neuromodulação cerebral, a estimulação magnética transcraniana (EMT). A nossa hipótese, suportados na nossa investigação e em resultados de equipas internacionais, é que a estimulação de uma determinada região do nosso "cérebro social" pode diminuir as dificuldades na cognição social enfrentadas pelas pessoas com esquizofrenia", explica o investigador. A estimulação magnética transcraniana recorre a um dispositivo que é colocado durante alguns minutos sobre a cabeça, de forma segura, indolor e sem necessidade de anestesia, que emite impulsos eletromagnéticos como os de uma ressonância magnética para estimular determinadas partes do cérebro.
O CIBIT é a instituição que vai acolher o ensaio clínico, tendo todo o aparato técnico necessário, tanto a máquina de estimulação magnética transcraniana como o know-how humano para a sua aplicação terapêutica e estudo científico. Esta instituição tem ainda uma unidade especializada na condução de ensaios clínicos, sejam eles medicamentos ou tratamentos de neuroestimulação. "Ao fim de alguns meses estaremos preparados para começar a aplicar este tratamento na esquizofrenia, mais provavelmente em pessoas que estejam a ser acompanhadas no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Os potenciais candidatos serão doentes com dificuldades no seu funcionamento social e que não tenham melhorado suficientemente com os tratamentos habituais, nomeadamente medicamentos".Nuno Madeira conta que os especialistas em psiquiatria contactam desde o início da carreira com a esquizofrenia e as consequências especialmente quando não é tratada. "Verifiquei que quando intervimos em fases iniciais da doença, ainda é possível minimizar muita dessa potencial incapacidade, devolvendo às pessoas uma maior normalidade nas suas vidas". Os novos medicamentos antipsicóticos que surgiram nas últimas décadas permitem aliviar sintomas psicóticos como os delírios e as alucinações, ter efeitos secundários cada vez menores e ter uma maior qualidade de vida. "Contudo, há ainda muito a descobrir relativamente aos mecanismos da esquizofrenia, sendo também necessárias novas e melhores armas terapêuticas. Por isso senti que era importante dedicar-me ao estudo e tratamento desta doença".
O psiquiatra revela a sua satisfação em ser escolhido pela FLAD para receber este prémio dedicado à saúde mental. Nuno Madeira afirma que este é um prémio de valor muito significativo, sobretudo tendo em conta a realidade nacional em que o investimento público em ciência ainda é inferior à média europeia. "Sinto também que foi valorizado um trabalho que não é apenas de hoje, nem apenas meu: resulta de um esforço coletivo de quase 10 anos, levado a cabo por uma equipa multidisciplinar e que reúne não só clínicos, mas também investigadores".
Os próximos passos incluem o registo do ensaio clínico e a sua avaliação e aprovação por vários organismos, mesmo tratando-se de uma técnica segura que à partida poderá ser aplicada em quase todas as pessoas.
sara.a.santos@dn.pt