PSD: não é tarde para voltar atrás
Há um conjunto de expressões populares que descreveriam na perfeição o comportamento do PSD na última semana. "Pérolas a porcos" talvez seja um tanto radical. "Deus dá nozes a quem não tem dentes", eventualmente injusto. "Não gastar vela com ruim defunto", ligeiramente mórbido. "Quem tudo quer tudo tudo perde" a mais avisada.
O facto é que perante duas débâcles do governo - o truque aos pensionistas e o desaparecimento do ministro da Economia - os sociais-democratas não souberam capitalizar. Antes pelo contrário. Descendo do proverbial para o desportivo, a baliza estava aberta e Luís Montenegro, coincidentemente um praticante de futebol, rematou na direção errada.
Quando António Costa mascarou um corte aos pensionistas, o PSD lançou um outdoor pelo país fora, prometendo "nenhum corte nas pensões". Confesso que fiquei à beira do acidente rodoviário ao contemplar tamanha jura. "Nenhum corte nas pensões", senhores automobilistas, garante o PSD. Quer isto dizer que diante da desonestidade do governo - que não quer assumir os cortes que preservariam a sustentabilidade da Segurança Social - o maior partido da oposição responde com irresponsabilidade, propondo indexar as pensões a uma inflação de 7,4%, o que levaria o défice para níveis incomportáveis, em crise ou fora dela.
Para o eleitor comum não deixa de causar um certo amargo de boca, perante a instabilidade que 2023 trará à Europa, ver os dois maiores partidos portugueses dedicados, respetivamente, a negar a realidade e a prometer o impossível.
No Partido Socialista, a opinião prolifera e a ação inexiste. No governo, isso é de tal forma evidente que António Costa Silva, que já havia sido desautorizado após propor a taxação de lucros extraordinários, foi desmentido pelos seus próprios secretários de Estado em relação à descida do IRC. Seja para cima, seja para baixo, as ideias do ministro da Economia teimam em não se cruzar com as do restante Conselho de Ministros. Em vésperas de crise, um Executivo sem coesão é um péssimo sinal.
Num momento de fragilidade do governo, que entra desestabilizado numa conjuntura de instabilidade, a liderança dos sociais-democratas concentrou-se numa futilidade cujos efeitos tóxicos eram mais do que previsíveis. Apesar disso, a direção parlamentar do PSD apelou ao voto na candidatura do Chega à mesa da Assembleia da República e Luís Montenegro veio pedir a Augusto Santos Silva que exercesse a sua influência nesse sentido. Felizmente, não me encontrava ao volante quando soube, porque nesse cenário o desastre seria inevitável.
Não cabe na cabeça de ninguém que, com um governo em sufoco, o maior partido da oposição se preste a servir de embaixador de uma força política concorrente e populista, que passou os últimos três anos a usar - quando não achincalhar - o PSD. Quando o governo não respirava, os laranjas escolheram o boca-a-boca ao Chega e o consequente, e óbvio, balão de oxigénio que o PS precisava em mais uma atribulada semana de maioria absoluta. Nem a normalização do Chega nem o alívio do Partido Socialista são - ou deveriam ser - prioridades do PSD.
O argumento democrático, de que o Chega tem direito a vice-presidir a Assembleia por ser o terceiro partido mais votado, não colhe. Por um lado, porque o Chega é vocalmente contra este Parlamento (quer um menor), contra este regime (quer um novo) e contra esta Constituição (quer outra). A Assembleia desta República ser representada por alguém que defende uma nova República seria, no mínimo, bizarro. Um partido fundador de todas essas instituições secundar esta pretensão ainda mais bizarro é. Abdicar do estado de graça que Luís Montenegro conquistara em congresso em nome do Chega, e inventar mais uma derrota de Miranda Sarmento na sua bancada, foi politicamente incompreensível.
Se o PCP, que tem ativamente veiculado propaganda de uma ditadura que invadiu a Europa, fosse terceira força política em Portugal, o PSD daria indicação de voto a uma candidatura sua à mesa? Não creio.
Durante quatro longos anos, o PSD foi liderado pelo político mais inepto, indolente e errático de que há memória. Rui Rio entregou a governação a António Costa, a oposição a André Ventura e o país a uma maioria absoluta incapaz de lidar com a crise que aí vem.
É cedo demais para a nova liderança do PSD se assemelhar a essa incompetência. Mas não é tarde demais para dar um passo atrás.
Ou mesmo dois.
Colunista