Primeira loja já vende remédios
Dentro da loja, repetem-se as prateleiras de cremes, papas para criança, sapatos ortopédicos, brinquedos e dentífricos. À primeira vista, nada distingue este estabelecimento em Mem Martins de uma farmácia tradicional. Nem a cruz verde e azul fixada na parede, nem as batas brancas dos empregados. Apenas um papel fixado na porta "Medicamentos não sujeitos a receita médica." Aberta desde a passada semana, a Botica Fialho Vicente é uma das sete lojas licenciadas e tornou-se na segunda-feira a primeira em Portugal a vender remédios fora das farmácias. Algo que o seu proprietário nunca sonhou poder fazer.
Carlos Vicente é farmacêutico há dez anos e há dez anos que tenta, sem sucesso, abrir uma farmácia. Ele e a mulher, também farmacêutica, têm uma loja de higiene e beleza em Terrugem e, desde que souberam da possibilidade de vender remédios, aceleraram o processo para abrir uma nova loja.
A farmácia a menos de cem metros não gostou da concorrência, mas Carlos Vicente também não está apostado numa competição forte. A família é de farmacêuticos e ele, além de ser proprietário da Botica, trabalha na farmácia dos pais. "Eu sou contra a venda de medicamentos fora das farmácias, mas como surgiu esta oportunidade aproveitei", explica. Se pudesse, não pensava duas vezes e "trocava a loja por uma farmácia" tradicional. Ali dentro, promete um atendimento igual, mas tem dúvidas que "as ervanárias e outras lojas consigam" fazer o mesmo. "Temos duas funcionárias e damo-lhes formação sobre todos os remédios que vendemos", diz.
Aos muitos clientes que entram pela porta de receita na mão, explica que ali só se vendem medicamentos dos outros, daqueles que não precisam da prescrição do médico. "Tem ali uma farmácia à frente", repete. Antónia Lopes, reformada de 74 anos, é uma das doentes que entra por engano. "Como se chama botica, pensei que era uma farmácia. Acho bem que vendam estes medicamentos, assim é mais fácil, não tenho ficar à espera de ser atendida na farmácia", diz.
Ao contrário dos outros produtos da loja, os medicamentos estão todos dentro do balcão, longe das mãos dos clientes. Paracetamol, xaropes para a tosse, pastilhas para a garganta, pílulas do dia seguinte. Daqui a uns dias vão saltar para as montras, visíveis da rua. "Escolhi os que sabia que tinham mais saída, não conseguia ter os 1500 medicamentos permitidos", diz. Mas o stock está a crescer para responder aos muitos pedidos dos utentes que, até agora, têm procurado mais os remédios para as primeiras constipações de Outono. O primeiro fármaco vendido, na segunda-feira, foi um clister de bebé e a loja ainda não se estreou na venda de pílulas do dia seguinte.
Carlos Vicente diz que não teve dificuldade em encomendar os remédios porque foi directamente a um pequeno distribuidor. E são cada vez mais os laboratórios a procurá-lo. Sabe que tem comprado a preços mais altos mas, para não afugentar clientes, reduziu a margem de lucro de forma manter o custo anterior. "É só nos primeiros tempos, para que as pessoas não se queixem da diferenças, mas depois terei de aumentar as margens. Os preços vão subir", garante.
Ao contrário desta loja, vários postos de venda têm tido dificuldade em abastecer-se de remédios, porque os grandes distribuidores são detidos por farmácias. Fonte da Autoridade da Concorrência ouvida pela Lusa diz que se trata de uma grave violação da lei da concorrência. O organismo criou uma linha telefónica directa para receber queixas e denúncias.