Previsões da Comissão: Portugal vai crescer mais do que 10 dos 11 países de leste
As previsões da Comissão de Europeia de outono trouxeram a ideia de que a Roménia poderá ultrapassar o PIB per capita português em 2024 para o centro do debate nacional. No entanto, quando se olha para as mesmas previsões, está lá escondida outra notícia: pela primeira vez em muitos anos, Portugal deverá ter um período de três anos em que cresce mais do que a média dos países de leste.
A Comissão apresentou previsões para 2022, 2023 e 2024. De acordo com estas, nestes três anos, Portugal deverá crescer mais do que a Bulgária, Chéquia, Croácia, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia e Polónia. Isto é, vai crescer acima de todos os países de leste, exceto a Roménia - ver gráfico 1. Portugal pode ser ultrapassado pela Roménia em 2024, mas também é possível que ultrapasse o PIB per capita da Polónia e a Hungria, já em 2023. Previsões que devem ser feitas com reserva, num momento de tanta incerteza não só sobre o PIB, mas também sobre os preços que afetam as comparações em paridade de poder de compra.
Desde 2001, Portugal cresceu, em geral, menos do que os países de leste. Na maioria dos anos cresceu menos do que todos e cada um dos países de leste. Mas a diferença de crescimento tem vindo a atenuar-se - ver gráfico 2. Nos anos do alargamento (2002-2005), estes países tiveram um crescimento anual entre 4,5 e 5 pontos percentuais (pp) acima do de Portugal. Entre 2005 e 2015, a diferença foi entre 2,5 e 3 pp. Entre 2015 e 2022, já foi de apenas um ponto percentual.
Nas previsões da Comissão para 2022 a 24, Portugal surge a crescer entre 0,5 e 1 pp acima do valor previsto para os países de leste. Será um ponto de viragem, ou apenas um efeito do abrandamento do crescimento causado pela guerra se poder refletir de forma mais forte nos países mais próximos do conflito? É difícil de dizer. No entanto, usar as previsões de outono para concluir que Portugal está cada vez a ficar mais para trás em relação aos países de leste, como alguns têm feito, é extrair destes números exatamente o contrário do que estes dizem.
Muito se tem escrito sobre o ciclo de baixo crescimento dos últimos 20, 25 ou mesmo 30 anos. Neste período há evidência de: a) um crescimento inferior à média europeia; b) próximo de zero; c) inferior a 2% na maioria dos anos; d) com anos consecutivos de crescimento negativo. Mas onde começa e onde acaba o período de baixo crescimento?
A evidência sugere que se pode delimitar um período de baixo crescimento de 13 ou 14 anos a começar em 2001 ou 2002 e a terminar em 2015 ou 2016, em que Portugal em média cresceu próximo de zero, em que cresceu sempre abaixo dos 2% e da média da UE27 - ver gráfico 2. No período anterior a 2001 e no posterior a 2015, estas condições não se verificam. Entre 2001 e 2015 verificam-se em todos os anos menos 1.
Aplicando um teste à comparação de médias, testando a probabilidade de uma amostra de três anos pertencer à amostra dos 14 anos anteriores a 2016, obtemos com um grau de confiança de mais de 99%, que a média de 2016 a 2018 é significativamente diferente. Isto é verdade também para 2015-17 ou para 2017-19. Mas, se aplicado a quaisquer 3 anos entre 2001 e 2015, nunca obtemos a mesma validação.
Este período de baixo crescimento abrangeu vários governos, incluiu choques externos, como o fim da maioria das barreiras comerciais da UE (fim do acordo multifibras e China na OMC), o alargamento da UE, a crise financeira internacional e das dívidas soberanas, e ainda um esforço de reequilíbrio das contas públicas e da balança de pagamentos. Estes fatores externos e de reequilíbrio ajudam a explicar o baixo crescimento.
É importante reconhecer que este período existiu. Negar a sua existência corresponde a não assumir os problemas que a economia portuguesa enfrentou. Mas afirmar que nos mantemos na mesma situação, quando nos últimos sete anos o país registou seis com crescimento acima dos 2% e cresceu mais do que a média da UE27, significa não reconhecer a evolução positiva que o país teve, que resultou do esforço da sociedade e de diferentes governos, nas qualificações, na capacidade de inovação, no reforço das exportações, na atração de investimento, no crescimento das empresas tecnológicas e em vários outros aspetos.
Na tertúlia dos 158 anos do DN, na semana passada, tive o prazer de ouvir António Horta Osório a defender que para acelerar o crescimento do país devíamos estar particularmente atentos a quatro áreas: à inovação, às exportações, à concorrência e à imigração. Concordo com Horta Osório, que a inovação, a capacidade exportadora e a promoção da concorrência, são determinantes para que Portugal, com a dimensão que tem e o nível de desenvolvimento a que aspira, tenha um crescimento sustentado. Concordo também que, num contexto em que a quebra de natalidade, que aconteceu há 20 ou 30 anos, se vai continuar a refletir na diminuição da população ativa, o país tem de ter uma política de atração de pessoas ativa e inteligente.
É por isso importante salientar que em todas estas áreas há sinais positivos.
Na inovação, a evolução do número de patentes, que quase triplicaram em menos de uma década, o peso dos gastos em I&D no PIB, que depois de recuarem, têm crescido todos os anos desde 2015, e a evolução das empresas tecnológicas, mostram uma evolução interessante.
Nas exportações, que tiveram um período de estagnação antes e no início do ciclo de baixo crescimento, aumentaram de 27% do PIB para 50% do PIB, entre 2005 e 2022. No final de 2022, deverão estar quase 70% acima do valor de 2015.
Nas migrações, o país conseguiu ter saldos líquidos de entrada positivos nos últimos seis anos, depois de seis anos em que as saídas superaram as entradas de trabalhadores em Portugal.
Neste sentido o crescimento que se está a verificar parece ser sustentado por fatores estruturais. É também um crescimento equilibrado, tendo sido conseguido num período em que, em geral, predominou um maior equilíbrio externo e orçamental, do que nos períodos de crescimento dos Anos 80 e 90.
Podemos questionar se estes sinais são suficientemente fortes para colocar o país a crescer de acordo com as nossas ambições na próxima década. Sabemos que não poderão impedir a desaceleração do crescimento, que a situação de guerra, aumento da inflação e das taxas de juro vai trazer já em 2023.
Reconhecer estes sinais abre esperança de que se possa continuar a convergir, mesmo num contexto desfavorável. Em nenhum caso nos deve levar a dizer que está tudo feito, mas antes a exigir um reforço das políticas de apoio à inovação, à internacionalização e à atração de imigrantes e retenção dos nossos jovens, que em conjunto com outros aspetos de que o país precisa, como o aumento do investimento, a continuação dos esforços de melhoria dos serviços públicos e de simplificação administrativa, podem ajudar a reforçar o crescimento económico.
Professor da Universidade do Minho.
Ex-ministro da Economia.