Presidentes de junta, um poder que é tu cá, tu lá
Feijão, o autarca que é pau para toda a obra
Hoje foi dia de se começar a abrir uma azinhaga da Calçadinha ao Morgadinho e o presidente da Junta, Joaquim Feijão, não se ficou pelas ordens aos funcionários. Voltou a "saltar" da cama pelas 06.30 - como é habitual - pegou na velha carrinha de caixa aberta - que já acumula 382 mil quilómetros - para transportar a equipa de dois elementos ao local. Mas também por ali ficou de forquilha em riste para ajudar na desmatação do troço.
"Faço de tudo, aqui temos de ser assim. Ainda há pouco fomos recolher uns monos. O frigorífico e os móveis passam o fim de semana na junta mas não estão a incomodar as pessoas", justifica o presidente da junta de freguesia de São Braz e São Lourenço, onde o urbano e o rural se misturam no concelho de Elvas. Não é autarca a tempo inteiro por causa do número de eleitores e dos quilómetros quadrados, mas é como se fosse. Está desempregado depois de ter trabalhado no setor dos transportes, mas não desanima. Aliás, conhece todos os moradores da freguesia, onde funciona como uma espécie de 112 para todo o serviço, tendo mesmo optado por dar o contacto de telemóvel a grande parte da população. "Ligam-me a qualquer hora e atendo sempre. Ninguém fica sem resposta desde que a solução do problema esteja ao nosso alcance", ressalva.
Exemplos? O cão desconhecido que apareceu numa quinta, a erva que cresce junto à estrada, a falta de água nas torneiras ou o candeeiro da rua que tem a lâmpada fundida. "Há sempre muito para fazer, sobretudo na limpeza do espaço público, e acabo por me dedicar a isto 24 horas. Mas tenho gosto em servir as pessoas, sobretudo depois de 30 anos de associativismo na coletividade da terra", diz Joaquim Feijão, eleito pela primeira vez há quatro anos na lista do PS. Recandidata-se agora ao cargo com o sonho de conseguir construir um lar para idosos, lamentando dirigir a única freguesia de Elvas que não o tem. E o envelhecimento atinge por ali cerca de metade dos 1684 habitantes que vivem dispersos por 13 aglomerados urbanos ao longo de mais de 47 quilómetros quadrados. "Para varrermos uma frente de 20 casas chegamos a andar dois quilómetros", exemplifica Joaquim Feijão, tendo sido já visto de vassoura da mão a ajudar o seu "pessoal".
Jovem de 23 anos quer ser o presidente da Junta
Diogo Jacob, um jovem de 23 anos a frequentar o último ano do curso de Ciência Política e Relações Internacionais na Universidade da Beira Interior, quer ser presidente de Junta de Freguesia da Fatela, terra onde nasceu e onde vive. Por estes dias, a equipa do movimento independente "É tempo de mudança" está em campanha para mostrar o que vale aos 498 eleitores inscritos. Diogo é o mais jovem da lista. A idade dos restantes elementos ronda 30 anos. Estão nestas autárquicas sem apoios partidários, "foi tudo pago do nosso bolso" garante o candidato. O maior desafio, reconhece, é convencer o eleitorado sobre as capacidades da candidatura de grupo, todos jovens e residentes na aldeia. "Queremos ser atores da mudança na Fatela. É verdade que não temos experiência política", admite, mas "as pessoas conhecem-nos, sabem da nossa entrega a esta terra". Prova disso, indica, está a escolha que o próprio fez há alguns anos. "Os meus pais emigraram e eu fiquei cá, para seguir os estudos e porque não queria, e não quero no futuro, sair do Fundão".
Uma nova capela mortuária, a ampliação do cemitério, a instalação de sanitários públicos, a construção de um jardim-de-infância, a requalificação do campo de futebol, são algumas das necessidades da freguesia, a oito quilómetros de distância do Fundão. "Somos uma candidatura de jovens, pois os jovens têm sido esquecidos pelos anteriores executivos, consideramos que é tempo de nos fazermos ouvir."
Diogo Jacob está a dar os primeiros passos na política. "Desde os 15 ou 16 anos que sigo a atualidade, quer do concelho ou do país. É através da política que podemos alterar para melhor a vida das pessoas e isso apaixona-me." Fazer disto uma carreira é o seu projeto de vida, com o apoio da namorada, que aceita a escolha. Sempre como independente, embora partilhe os ideais de esquerda. "Eu acho que é possível fazer política em territórios pequenos sem apoio dos partidos, nos meios maiores ainda vejo muitas dificuldades. Os partidos e o sistema político ainda fecham muito o caminho aos independentes."
Para além de Diogo Jacob, à Fate-la concorre também Anabela Fiens, como independente com o apoio do PSD.
Até hoje venceu sempre as eleições, por qualquer partido
Não há eleição que assuste um candidato como Manuel Henriques Nogueira Matos, 63 anos, metade dos quais na função de presidente de junta. De modo que ontem, no auge da campanha eleitoral, conversou sem pressas com o DN enquanto à mesma hora milhares de candidatos se desunhavam a entregar esferográficas, porta-chaves, brindes diversos e muita papelada. "Só logo à noite é que vamos fazer alguma ação de campanha, à saída das missas vespertinas", revela o presidente da União de Freguesias de São Simão de Litém, Santiago de Litém e Albergaria dos Doze (Pombal), uma das duas fusões que aconteceram naquele concelho do distrito de Leiria, um processo ainda não completamente sanado para a população. No-gueira Matos era contra a agregação, e não mudou de opinião. Mas já que ela existe "temos de fazer o possível para trabalhar da melhor forma, próximo das populações, que é o mais importante", sublinha.
Há quatro anos, quando o PSD o convidou (de novo) para encabeçar a lista à junta, o empresário do ramo imobiliário descansava da vida política. Tinha feito seis mandatos de quatro anos, passara o testemunho a Isabel Costa, que o acompanhava na Junta de São Simão de Litém, de onde é natural. "Entendia que era preciso dar lugar a outros." E deu, estendendo o tapete à única mulher presidente da autarquia em toda a sua história, uma das poucas naquele concelho. Só que veio a agregação, e juntaram-se duas freguesias vizinhas, que hoje perfazem um total de 5400 eleitores. Nogueira Matos agarrou então nesse desafio, vencendo as eleições por mais de 50% dos votos, uma votação ainda assim longe dos 60 e 70% a que estava habituado. Sem falar naquele ano em que concorreu sozinho, e arrebatou os votos de 80 por cento dos eleitores. Dessa vez era também pelo PSD, mas foi igualmente candidato pelo PS, em 1993, a convite do presidente da câmara e socialista Armindo Carolino. Poucos sabem que começou nestas lides ainda mais à esquerda, através do PCP, no pós-25 de Abril, quando tinha 26 anos. Em 1985, aos 31, tornou-se um dos mais jovens presidentes de junta do país.
Uma vida a ouvir e (tentar) resolver os problemas aos cidadãos permite-lhe concluir das enormes diferenças que hoje o cargo acarreta. "Nestes últimos anos somos muito mais escrutinados, as pessoas são muito mais exigentes, porque são também muito mais esclarecidas", salienta, ele que no seu programa para estas eleições pensou sobretudo na forma de as fixar. "Incide muito na criação de emprego, em trazer empresas, porque nos últimos anos perdemos nesta região cerca de 25 por cento da população, e isto sem contar com os muitos que emigraram nos anos recentes e que eram a nossa população ativa". Longe vai o tempo em que era autarca nas horas vagas, pois que atualmente desempenha o cargo a tempo inteiro. "Nem podia ser de outra maneira."