Preços dos azulejos e vidros com aumento superior a 20% num ano
Os preços dos materiais de construção estão a atingir níveis preocupantes para todos os intervenientes da fileira da construção. Azulejos, pavimentos e louças de cerâmica, vidros, aglomerados e ladrilhos de cortiça e o aço voltaram a registar, em março e pelo segundo mês consecutivo, um aumento homólogo acima de 20%, revelou ontem o Instituto Nacional de Estatística. Construir uma casa nova ficou 11,6% mais caro do que há um ano e nada aponta para que a tendência sofra uma inversão no curto prazo. Os custos energéticos são a grande causa desta escalada e as consequências estão a refletir-se na suspensão das produções e na travagem de projetos de investimento.
Segundo José Sequeira, presidente da Associação Portuguesa das Indústrias de Cerâmica e Cristalaria (APICER), o setor enfrenta "uma situação tão gravosa" que não consegue repercutir os aumentos da energia no produto final. Como adianta, "uma empresa - e isto é um caso real - pagou uma fatura de quatro milhões de euros de gás natural, em 2021, e, este ano, se não houver alterações, irá pagar 15 milhões". Com este nível de aumentos, os produtos cerâmicos "só não estão mais caros, porque o mercado não consegue acomodar os custos" que a indústria está a suportar.
O presidente da APICER sublinha mesmo que "não é possível às empresas fazerem a sua atividade normal, mesmo tendo que penalizar os consumidores, e por mais cuidadosa que seja a eficiência ao nível energético". E, nesta situação, há cerâmicas a parar as produções por duas, três semanas e um mês. Como revela, o setor já contabiliza "15 empresas que suspenderam a atividade e há uma grande indústria que está em lay-off total há cerca de um mês". Segundo José Sequeira, "o receio é muito" e já há vozes de outros empresários a admitir que também irão parar e, inclusive, a ponderar "decisões mais drásticas, de encerramento definitivo", caso os custos energéticos se mantenham.
As contas estão há muito feitas. No setor da cerâmica, a energia tem um peso entre 25 e 40% - só o gás natural responde por um mínimo de 18% - num volume de negócios anual de 1300 milhões de euros. Como aponta José Sequeira, "se a fatura normal de 220 milhões/ano em gás natural for multiplicada por cinco, esse aumento pode absorver o volume de negócios do setor". O responsável não tem dúvidas que a cerâmica está a viver uma "situação de emergência, incomportável". A esperança reside no lançamento de novas medidas para mitigar os custos da energia a nível europeu e nacional. As decisões que o Executivo de António Costa tomou "são manifestamente insuficientes", pois "o apoio máximo de 400 mil euros pode dar para um mês". Todo este contexto, está também a provocar ruturas de stocks no mercado, o que não ajuda à estabilização dos preços.
O aumento dos custos de construção de casas novas está ainda a pôr em causa o lançamento de novos projetos residenciais. É "com bastante preocupação" que Hugo Santos Ferreira, presidente da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII), analisa a evolução. "Para quem está a desenvolver empreendimentos para a classe média, a situação é dramática", porque há um teto orçamental que é preciso cumprir. Neste momento, "há grandes reticências para avançar" com novos investimentos. Os planos de negócios levam dois a três anos a ficarem concluídos e esta "imprevisibilidade da construção conduz à suspensão ou paragem" dos projetos, frisa.
Na sua opinião, "se antes já se justificava - até porque os preços dos materiais de construção estão a subir desde a primavera de 2021 - agora é premente criar uma task force entre os agentes do setor e o governo focada nas matérias legislativas e fiscais para dinamizar a habitação" no país. Hugo Santos Ferreira não tem dúvidas que "para resolver o problema da falta de casas e mitigar estes aumentos brutais é preciso uma série de medidas nestas áreas". E exemplifica: o fim do AIMI, agilização dos processos de licenciamento e o IVA à taxa reduzida para habitação.