Pranchas com alma
De tronco nu e rosto marcado pelo sol, Nick Uricchio, 54 anos, alcunha «Nicotina», fuma um cigarro à porta da fábrica da Semente, que fundou, com Miguel Katzenstein, há trinta anos. A história começa antes, mas aquele que é considerado um dos melhores shapers de sempre em todo o mundo, prefere deixá-la para depois. Com um português carregado de sotaque gringo, o californiano que se apaixonou por Portugal em 1978 prefere primeiro convidar-nos a entrar no lugar onde o surf começa: a sala de shape.
No espaço retangular, a luz azulada que sai das duas paredes laterais incide no bloco de poliuretano que ocupa o centro. Antigamente, o processo era todo manual, só o shaper, o bloco atravessado longitudinalmente por um fio de madeira (o stringer, para dar resistência), a plaina e muito pó. Hoje, a prancha é desenhada no computador, o bloco é cortado numa máquina e o shaper apenas acaba de a esculpir aqui, entre a luz e a sombra. A plaina e o muito pó mantêm-se. Para a forma final, há que saber as caraterísticas do surfista: peso, altura, há quanto tempo faz surf, que tipo de surf faz, que ondas vai surfar, etc. Acabado o shape, assinada a prancha - Nick Uricchio - e «carimbado» o logótipo da Semente, passa-se para o quarto de fibragem, ao fundo, onde o cheiro a resina dificulta a presença de estranhos ao ofício. Ali é dada a fibra de vidro e a resina de poliéster. Na divisão do lado dá-se outra camada de resina com parafina e são abertos os buracos para as quilhas e os copos e, se o cliente não a quiser pintada, como acontece quase sempre, só falta a lixa a seco, que é o acabamento final.
«A maioria das nossas pranchas são brancas, mas quando as querem pintadas há um artista que vem fazê-lo antes do acabamento. Normalmente, os putos gostam de ser eles a pintar», explica Nick, que shapou a sua primeira prancha na Califórnia, onde começou a fazer surf, com pouco menos de vinte anos. «Não ficou nada de especial. Aliás, uma vez, eu e cinco amigos, depois de uma festa, fomos num Carocha para um sítio chamado Ventura County Line, para surfar. Chegámos às cinco da manhã, cansados, e dormimos no carro. Quando acordámos tinham-nos roubado as pranchas. Só lá estava a minha. Primeiro fiquei contente, mas depois pensei: porque é que não levaram a minha?» No seu país não fez mais nenhuma, mas no nosso já as faz há 33 anos. Em 1978, com dois amigos, partiu numa viagem de três meses pela Europa. A última paragem foi Portugal, que nem sabia onde era - «geograficamente, os gringos são péssimos». E foi amor à primeira onda. No ano seguinte, voltou para ficar. «Foram as altas ondas, o vento à maneira e o bom tempo que me chamaram. Na Califórnia, às vezes, não havia ondas durante um mês ou mais. Cá, havia todo o ano e pouca gente a surfar. Além disso, era uma época pura em Portugal, a seguir à revolução, toda a gente deixava a chave na porta e eu gostei da simplicidade do país e das pessoas.»
Em 1979, Uricchio fez do surf vida e iniciou-se na aventura das pranchas, na Costa de Caparica, com o incentivo de Nuno Jonet, um dos grandes nomes da história do surf português, e a parceria de António Caldas, que tinha ido aprender a shapar em Inglaterra, com Roger Cooper, e que foi o seu primeiro sócio, na Lipsticks. As ondas acabariam, no entanto, por levar Nick até Ribamar, na Ericeira, onde criou a tal «coisa nova a nascer», em 1982, com o sócio de uma vida, Miguel Katzenstein. Não foi fácil para a Semente, a primeira grande marca de pranchas portuguesa, vingar. «Naquela altura não havia os carros nem as estradas que há hoje. Ribamar era muito longe de Lisboa. Fazíamos umas oito ou nove pranchas por mês. Mas foi uma altura bonita, bom surf e grande qualidade de vida.»
E continua a ser, pelo menos para Nick Uricchio, que tanto pensa na língua de Camões como na de Steinbeck e já se sente meio português: além de ter conseguido fazer da Semente uma marca de sucesso, vive junto do mar que adora, surfa sempre que pode, mergulha e faz pesca subaquática e tem quatro mulheres lindas, a Marina, as filhas Jackie e Zoe e agora a neta, «que é uma joia». Faz pranchas para muita gente, mas é com especial orgulho que diz que tem a «casa» cheia de campeões - Vasco Ribeiro, Ruben González, Guilherme Fonseca, Nicolau von Rupp, Tomás Fernandes, «entre outros. Não quero esquecer ninguém, mas são muitos. Todos grandes amigos, grandes pessoas e grandes surfistas. É um desafio fazer pranchas para atletas profissionais. Por exemplo, há anos que trabalho com o Vasco Ribeiro - era um miúdo, hoje está gigante - e fui fazendo as pranchas à medida dele. É esse o segredo do shaper: a hipótese de moldar a prancha e de a ir modificando, para conseguir a melhor performance. A pouco e pouco, chega-se à prancha mágica.»
Pranchas mágicas
Pranchas mágicas são também aquelas que saem das mãos de Nico, da Wavegliders. Com 38 anos, decidiu há três regressar às antigas pranchas de surf e moldá-las segundo os tempos modernos. Após 19 anos a trabalhar em fábricas de alta performance, criou a sua própria onda e com ela pretende fazer uma revolução pacífica. Na sua oficina não há máquinas, é tudo feito à mão, do corte ao shape, laminagem, fibragem e pintura, resultante da junção de um corante à resina. O acabamento é feito pelo Carlos, lixador e polidor.
«Onde quer que te encostes vais sujar-te», avisa, «mas o incrível é que desta espécie de lixeira saem pranchas bonitas, para surfar bonito». A paixão pelo surf aconteceu-lhe aos 13 anos, quando os amigos da rua, na Damaia, onde vivia, o levaram a apanhar ondas na Costa de Caparica. O mar, no entanto, não lhe era estranho. O pai, velejador, fazia regatas e Nico era parte da tripulação. «Cresci nesse ambiente. A história começa aí e continua na Costa quando vi o Lufi shapar na praia e percebi que se podia fazer pranchas de surf. Pensei: também quero fazer uma. E fiz, na garagem dos meus pais. Olhava para o shaper como o detentor do saber e do conhecimento, aquele que permite às pessoas surfarem as ondas. Eu queria ser esse gajo. Aos 14, 15, meti isso na cabeça e pronto.»
Vinte e dois anos depois, grande parte dos quais «ligado a uma máquina de CNC, mas sendo sempre aquela cabeça que viaja e quer aprender» aqui o encontramos, no Magoito, na sua fábrica-oficina, quase uma segunda casa, já que é aqui que passa a maior parte das horas do dia, com a sua marca, dando curso ao seu sonho. «Sou um shaper old school, nada em computador, tudo à mão. O meu prazer é shapar a prancha: sai da cabeça passa para o braço, a mão e a plaina fazem o trabalho delas e eu faço uma prancha para "aquela" pessoa. É feita por mim, para ti. É isso que é ser shaper, no meu entender. Fazer pranchas à mão é a minha forma de expressão. Se calhar o meu ego é muito grande.»
A revolução, inscrita no ADN da Wavegliders, tem que ver com o ressurgimento do espírito americano do do it your self e a redescoberta de outras formas de andar na água com uma prancha nos pés. «Estivemos quarenta anos sob a ditadura dos shortboards e longboards de alta performance e agora abriu-se uma caixinha de Pandora que revelou os designs de outras eras, dos anos cinquenta e sessenta. E há gente nova que quer modernizar esses designs e trazê-los para os dias de hoje, recuperando a antiga cultura de deslizar na onda, de a acompanhar simplesmente e desfrutar do que ela nos dá. Não é melhor nem pior do que a competição, é diferente.»
Mas não se pense que a funcionalidade não é uma das grandes preocupações deste shaper de olhar perscrutador e têmpera perfecionista. Não, não se trata de fazer pranchas cool, mas sim pranchas que, de acordo com as caraterísticas do surfista, lhe permitam ter performance e glide, ou seja, ir na onda, perfeitamente na onda. «A maior parte dos comuns surfistas começam pela prancha errada e isso reflete-se na forma como surfam. O que nasce torto tarde ou nunca se endireita. Daí ser tão importante começar com a prancha certa», conclui Nico, que tem como referência o shaper brasileiro Paulo Mandacaru, que em Portugal trabalhou para a Polen.
Na Polen, em Cascais, o rosto sério de Álvaro Costa pede um tempo. O de acabar a conversa com uns clientes, pai e filho, orientar outros tantos e resolver uma questão com Nuno «Surdo» Cardoso, o shaper residente da Polen. Quando enfim se senta, o dono de uma das mais importantes marcas de pranchas em Portugal abre um sorriso. E conta a sua história. Filho de uma algarvia e de um natural de Vila do Conde, nasceu há 49 anos no interior de Angola, a mais de mil quilómetros do mar, que só conheceu aos 2, numa viagem de barco à metrópole. A relação distante aprofundou-se aos 10 anos, quando a família se mudou para o Recife, no Brasil, para uma casa bem em frente à praia. Aí a paixão aconteceu, muito pela cálida temperatura da água e pela mão dos irmãos Melo, vizinhos que o levaram a fazer surf pela primeira vez. Nunca mais parou e é por ser surfista que trabalha no desporto que nos anos setenta era visto como vadiagem: «A praia era lugar de vadios. E de certa forma éramos nómadas, porque o surf era uma descoberta: tínhamos de descobrir onde havia ondas, onde havia vento, não havia mapas de surf nem windgurus... Hoje, ninguém olha mais para a Lua para saber se a maré vai virar.». Álvaro, moreno, grisalho, não deixou de olhar. A sua ligação ao surf é cutânea e por isso a criação da Polen, em 1988, com o shaper Fernando Horta, foi natural. «Fazer pranchas é o trabalho mais ligado ao surf, sem pranchas não existem surfistas. E, quando feitas por um shaper, não existem duas pranchas iguais, porque também não existem duas ondas iguais ou duas pessoas que surfem da mesma maneira. As pranchas feitas por um shaper têm alma, sente-se dentro e fora de água.»
Em 1986, Álvaro saiu do Brasil com destino à Austrália. Parou em Portugal para visitar os irmãos, mas a paixão por uma «princesa» e as boas ondas fizeram-no mudar de rumo e ficar. Pelo menos dez anos, durante os quais criou a sua marca, trabalhou com shapers de outras paragens, surfou, teve um filho e não foi feliz para sempre, o que o levou a partir, em 1996, para os EUA. O primeiro ano passou-o em San Diego, na Califórnia, a fazer surf e a entregar pizas, das cinco às dez, trabalho que lhe rendia 3500 dólares por mês. «Foi espetacular. Andava entre a Califórnia, México e Costa Rica a surfar que nem um maluco e sem pensar em nada. Fiz grandes amigos e conheci outras maneiras de estar. No ano seguinte, fui para o Havai e aí foi só surf e capoeira, com o dinheiro que juntei na Califórnia.» As saudades do filho Gustavo arrancaram-no à boa vida. Na semana em que decidiu voltar, soube que ia ser pai outra vez. O filho Malaika ficou lá e graças a ele todos os anos Álvaro passa uma temporada no arquipélago do surf.
No regresso a Portugal, Álvaro encontrou a Polen a atravessar tempos difíceis. Precisou de uns meses para se identificar novamente com tudo - «são registos muito diferentes», mas foi incentivado a relançar a marca através da roupa e fê-lo. Não podia era ficar por aí. «A minha cena são as pranchas. Apesar de nunca ter shapado, sei o que é preciso para um surfista ser feliz com uma prancha.» Como não havia dinheiro, foi na Costa de Caparica, num anexo atrás da casa da avó de Nuno Matta, o escolhido para a parceria, que a Polen recomeçou, com um conceito caro a Álvaro Costa, o de trazer à marca shapers convidados do mundo inteiro: Xanadu, Paulo Mandacaru, Almir Salazar, Peter Daniels ou Ricardo Martins foram alguns deles. «Esta ideia tem que ver com a minha forma de ver a vida. A oportunidade que tive de viajar deu-me essa abertura e penso que a evolução está no intercâmbio. Não existe nenhuma universidade de shape nem de fibragem, mas existem pessoas a fazer pranchas nos EUA, no Brasil, no Havai, na Austrália, em Portugal, em França, e é a partir desta troca de ideias, experiências e técnicas que se pode evoluir.»
Em 2010, Matta e Costa «divorciaram-se» amigavelmente. Não porque se dessem mal, mas por uma questão geográfica. A Polen mudou-se para Cascais e Costa não conseguiu convencer Matta a deixar a Costa. «Com o Surdo [Nuno Cardoso], que também é um grande shaper, de talento enorme, com muito trabalho e uma equipa fabulosa, construímos esta fábrica e conseguimos manter a Polen nas bocas do mundo. Neste momento temos um círculo fechado de shapers definidos em vários pontos do mundo - Ricardo Martins, no Brasil, Jon Pyzel, no Havai, Timmy Patterson e Bill Jonhson, na Califórnia, e o Nuno Surdo aqui. É o chamado Glocal - think global, act local. Globalizar, mas localmente.» Os resultados estão à vista, nos pés de grandes surfistas como Frederico Morais, João Guedes, Miguel Blanco ou Francisca Santos. «Mas não só. O John John Florence ganhou uma prova do WCT no Rio de Janeiro com uma prancha nossa», remata Álvaro Costa, antes de nos apresentar à fábrica da Polen que, em constante busca da excelência e da inovação, recentemente deu à luz pranchas iluminadas, para surfar à noite.
Nas bocas do mundo
Depois da Polen, Nuno Matta não ficou parado. Com o o seu talento e credenciais foi bater à porta da marca americana Superbrand e espetou uma lança na Europa. Há dois anos que faz corpo com a Shapers Collective, um coletivo de shapers de vários pontos do mundo que trabalham em conjunto para a Superbrand. Encontram-se, trocam ideias e experiências, mas cada um tem o seu território demarcado e só aí (e para aí) pode fazer pranchas. Nuno Matta representa a marca no velho continente e em Israel.
Sem certeza na idade - «Gonçalo, tenho 42 ou 43?», pergunta ao filho, que está noutra sala, «43» - orgulha-se de pertencer à primeira geração de surfistas profissionais em Portugal. Na Costa de Caparica, onde sempre viveu, fez vela durante cinco anos, classe Optimist, mas quando passou para a classe 420, o proa vendeu-lhe uma prancha de surf. Tinha 15 anos e nunca mais apareceu aos treinos. «Experimentei surfar e a minha vida mudou. No momento em que fiz a primeira onda, decidi que era aquilo que queria e a partir daí lutei para conseguir fazer surf todos os dias.» E conseguiu. Competiu e o dinheiro dos patrocínios e das competições davam para surfar e viver. Aos 27 ou 28 retirou-se e encontrou no shape outra forma de vida.
«Eu era patrocinado da Polen e uma vez, para experimentar fazer umas pranchas, troquei uma bicicleta por dez blocos de poliuretano com o irmão do Álvaro [Costa], mas não é uma coisa que se aprenda de um dia para o outro, é um trabalho degrau a degrau. Já faço pranchas há mais de 15 anos e tem de haver muita dedicação e amor. Se alguém se mete nas pranchas a pensar que vai ficar rico, esqueça. Dá para viver e para fazer aquilo de que se gosta, que é o mais importante.»
Aprendeu com vários shapers, mas é ao brasileiro Ricardo Martins que reconhece o estatuto de «padrinho». «Estar-lhe-ei sempre agradecido para o resto da vida pela força que me deu. A minha experiência na Polen foi muito importante, havia este intercâmbio com shapers lá de fora, eles vinham cá e eu também cheguei a ir às fábricas deles - como a do Timmy Patterson, na Califórnia - e isso impulsionou-me bastante. Mas o meu maior passo, mesmo a nível internacional, foi com a Superbrand, graças à qual faço pranchas para surfistas do WCT e de renome, como o Travis Logie e o Tiago Pires.»
Deplora a mentalidade tão portuguesa de que o que é feito no estrangeiro é melhor, mas só aí encontra explicação para esta sensação de que a sua assinatura - Nuno Matta - é mais valorizada no resto Europa do que em Portugal. «Gonçalo, a nossa produção é oitenta a noventa por cento para fora, não é?» Números e questões que desaparecem no momento em que entra na sala de shape. A fábrica, na Sobreda, não se tem ressentido com a crise e encomendas não faltam. «Tem muito que ver com o marketing, mas se as pranchas não forem boas não chegamos a lado nenhum. Por exemplo, um surfista de nível mundial pode escolher qualquer prancha. Se usa uma minha, esta tem de estar ao nível das melhores do mundo, porque o shaper é a alma da prancha e a prancha é a alma do surfista. Quanto melhor for a prancha, melhor será o seu desempenho e mais ele se diverte dentro de água.»
Lufi é reconhecido como um dos melhores shapers do mundo em longboard. Entre a loja, na Costa de Caparica, onde o encontramos, a fábrica nova, que «poderá vir a ser uma das melhores da Europa, com a tecnologia mais moderna neste domínio», a escola de surf, as viagens e o surf propriamente dito, Lufi, aliás Luís Filipe Bento, o surfista que mais títulos de campeão nacional arrecadou em longboard, não tem muito tempo, mas deixa-se ficar à conversa. Tinha 19 anos quando fez a sua primeira prancha, depois de ver um dos filhos do patrão do seu pai, carpinteiro de profissão, recuperar uma prancha de windsurf. Percebeu que talvez fosse por aí o seu futuro e foi fazendo experiências, mas a certeza de que era disso que queria viver teve-a quando conheceu um shaper brasileiro que o apresentou à verdadeira arte do shape. Partiu então para o Brasil, na primeira de muitas viagens de aprendizagem e aperfeiçoamento que foi fazendo ao longo da carreira. «Estive lá dois meses, visitei e trabalhei em várias fábricas, e quando voltei, montei uma marca, a Blue Point. E depois todos os anos ia para um sítio diferente - Havai, Califórnia, Austrália, África do Sul - sempre no sentido de melhorar. Hoje, são eles que me convidam para ir lá.»
O seu spot era em São João da Caparica, onde fazia as pranchas, e foi lá que, em 1992, dois amigos o convenceram a fazer uma longboard. Resistiu, não queria, não gostava, mas lá acedeu. E tornou-se especialista. No ano seguinte, nova etapa, com a entrada em campeonatos de surf. Mais uma vez por insistência dos amigos, resolveu-se a participar num que teve lugar no Porto. Ficou em terceiro, o que lhe deu alento para continuar. Entre o fim dos anos 1990 e o início dos anos 2000, foi cinco vezes campeão nacional de longboard. «Quando comecei a viajar pelo mundo, já não só para trabalhar, mas também para competir, isso trouxe-me muito know-how. As pessoas acham que faço pranchas incríveis e, como as minhas, só eu consigo fazer. Temos um distribuidor na Austrália, outro no Brasil e outro na África do Sul e os modelos estão no computador, mas o certo é que os atletas estão sempre à espera de que eu chegue porque ninguém as shapa exatamente como eu.» Porquê? Nem Lufi sabe explicar, serão os pormenores, os seus olhos, as suas mãos, a forma como olha para as pranchas. «Acho que foi importante ter começado logo a viajar e a trabalhar com shapers de todo o tipo, em fábricas gigantes e nas mais pequenas. Ao mesmo tempo, estar presente nas competições com os melhores permitia-me absorver o surf de cada um deles e perceber que tipo de pranchas se adapta melhor.»
Foi, aliás, depois de uma dessas competições, um mundial nas Canárias, que as pranchas com a assinatura Lufi começaram a correr mundo mais depressa. «Depois do campeonato, combinámos todos acordar cedo e ir para uma ilha surfar. Ao entrar no barco, o Jason Ribbink bateu com a quilha da prancha e partiu-a. Emprestei-lhe a minha e quando entrou na água era incrível vê-lo. Era uma prancha branca, com o símbolo da Polen, onde eu trabalhava na altura. Saiu da água e perguntou-me quanto queria por ela. Disse que não lha vendia... oferecia-lha. Passado um mês ligou-me a perguntar se eu queria ir à África do Sul shapar, que eles pagavam tudo. Com as minhas pranchas ficou em quinto no mundial e a partir daí passei a fazer pranchas para grandes nomes de vários países, que venceram campeonatos mundiais, europeus, brasileiros, australianos e sul-africanos.»
Sim, as pranchas também vencem campeonatos: «O surfista pode ter um talento incrível, mas se não tiver a prancha certa quando chega a hora H entre ganhar ou perder um heat, vai perdê-lo», afirma Lufi. E como se sabe que é a prancha certa? «Não falha nas manobras, dá-te velocidade quando queres velocidade, dá-te estabilidade quando queres aterrar.» Al Merrick, «que era um iluminado» e Matt Biolos, da Lost, com quem tem trabalhado, são as referências deste shaper que, com os filhos, a Raquel, de 12 anos, e o Bruno, de 18, já correu mundo e tem muitos projetos a correr por lá. Entristece-o sempre voltar e ver tanta gente com tão pouco ânimo em Portugal, mas é aqui que está ancorado. «Tenho uma escola de surf, tenho a loja, tenho a minha marca, a Lufi, tenho campeões e divirto-me imenso a fazer surf. Sou dos poucos que podem dizer que fazem aquilo de que gostam e ganham dinheiro com isso.»
O que dizem os surfistas
Vasco Ribeiro, campeão nacional, vice-campeão europeu júnior e vice-campeão mundial de sub-20, em 2011, sobre as pranchas de Nick Uricchio: «As pranchas do Nick para mim (e comigo) funcionam muito bem. Temos feito um grande trabalho ao longo destes últimos três anos e posso afirmar que a cada remessa que vou buscar à Semente quase sempre tiro uma mágica para o lado. Gosto imenso do Nick e fica aqui um muito obrigado a toda a equipa da Semente.»
João de Macedo, surfista português radicado nos EUA, que integra o Campeonato Mundial de Ondas Grandes (BWWT) e é ativista da Save the Waves, sobre as pranchas de Nico, da Wavegliders: «É esse o espírito: deslizar nas ondas, voltar à fonte, sentir a dinâmica de uma onda debaixo dos nossos pés. É essa grande parte da magia que o Nico cria! Muitos anos a shapar na fábrica da X-Cult Surfboards [antes Energia Tropical] deu ao Nico um know-how incrível sobre hidrodinâmica, shape, materiais, surf de alta performance. As pranchas do Nico não são só rétro - ele nem gosta que as chamemos assim! -, são back to the future, modernas com história.»
Francisca Santos, a mais internacional das surfistas portuguesas, sobre as pranchas Polen: «Desde que comecei a surfar, sempre tive o apoio da Polen. Há três anos comecei a trabalhar com o Nuno [Surdo] Cardoso, shaper residente, e tem sido muito bom para a minha evolução como atleta. São pranchas leves e resistentes, feitas com materiais atuais, que me ajudam na minha performance. Obrigada.»
Travies Logie, surfista sul-africano, que compete no WCT, sobre as pranchas de Nuno Matta: «A 5.8 do Nuno Matta é a melhor prancha que já tive. É perfeita. Vai bem em qualquer onda.»
Picuruta Salazar, o surfista com mais títulos no mundo, uma lenda do surf brasileiro e mundial, sobre as pranchas de Lufi: «Falar do Lufi é um prazer pois para mim os seus longboards são os melhores do mundo. Todos querem ter um. Nós brasileiros ficamos muito gratos em receber o Lufi na nossa terra. Aloha!»