Possíveis consequências da eleição de Trump na ordem mundial

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O mundo está a deixar de ser unipolar, liderado pelos EUA, e a tornar-se multipolar com a Rússia, a China, a Europa e o mundo islâmico a posicionarem-se de forma a terem um papel mais interveniente numa nova ordem mundial que se está a construir.

Desde o final da Guerra Fria que para os EUA a Europa tem deixado progressivamente de ter importância, dado que os seus objetivos estratégicos foram atingidos, com recurso à NATO e à UE, consubstanciados no alargamento da fronteira leste europeia até a fronteira da Rússia, deixando esta de ter Estados-tampão para defesa do seu território.

Para se reposicionar na nova ordem mundial em construção a Rússia tem investido muito em termos dos orçamentos de Defesa; ao sentir-se cercada aquando da aproximação da Ucrânia à UE reagiu e tomou pela força a Crimeia, e parte do território ucraniano; tomou parte ativa no conflito sírio na defesa de Assad; e movimentou tropas e mísseis nucleares para perto da fronteira europeia ameaçando diretamente a Europa e a NATO.

Por sua vez, os EUA no consulado de Obama, para se manterem como a única superpotência mundial: têm desvalorizado as ameaças de Putin; estabelecido alianças estratégicas, militares e comerciais em várias áreas do globo, nomeadamente na região da Ásia-Pacífico, para conter a China, e na região do Médio Oriente, para estabilizar a região e lutar contra o terrorismo e o fundamentalismo islâmico.

Donald Trump durante a campanha, e no seu primeiro discurso como presidente eleito, referiu que o seu consulado será primordialmente dedicado ao desenvolvimento de políticas no plano interno, fazendo crer que os EUA irão isolar-se no plano internacional. Esta posição isolacionista é recorrente na política americana, que normalmente oscila entre o isolacionismo e o expansionismo.

Relativamente a segurança e defesa, Trump não teve nenhum discurso coerente dizendo repetidas vezes uma coisa e o seu contrário, no entanto, quando questionado numa entrevista sobre a sua posição em relação à NATO, referiu, e ainda não desmentiu, que os EUA nunca atuariam diretamente em defesa de nenhum aliado que não pague as contas, que não contribua para o orçamento de defesa da Aliança com 2,5% do seu PIB (Portugal raramente cumpre este acordo), referindo que a Europa tem de pagar mais para assegurar a sua defesa. Esta posição, se se mantiver durante a presidência, colocará em causa pela primeira vez o cimento da NATO, o seu artigo V, que refere que o ataque a um dos aliados é sempre considerado como um ataque a todos.

Ao colocar em causa o artigo V, Trump tornou-se o melhor aliado de Putin, que desde que tomou o poder sempre viu a organização como inimiga, e que desde sempre a pretendeu enfraquecer, razão pela qual foi libertando, durante a campanha, alguns mails comprometedores de Hillary que estavam na posse de Snowden.

Os EUA são uma democracia há centenas de anos, bem consolidada com vários pesos e contrapesos, pelo que nos parece que o Congresso, o Senado e os outros poderes eleitos não deixarão, felizmente, que Donald Trump possa concretizar a maioria das propostas efetuadas durante a campanha.

Caso os EUA se isolem do mundo, como pretende Trump, rapidamente outro ator tomará o seu lugar, uma vez que o vazio é inimigo da estratégia, tornando o mundo que se está a reorganizar completamente diferente do atual. Bismark, a propósito do posicionamento das potências europeias na ordem internacional do seu tempo, afirmava que se és uma entre duas ou três potências tenta ser a única. Certamente os EUA não querem deixar de ser a única que efetivamente ainda são.

Coronel

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