Portugal, entre Espanha e Grécia

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1 Há uma semana a Espanha pediu ajuda para a banca. Amanhã a Grécia vai a votos, sem a certeza de eleger um governo pró-assistência. Entre um e outro momento, a Europa agita-se com a subida dos juros permanente em que a Espanha vai fazendo as suas emissões de dívida. O caso do Chipre é insignificante, embora mais um. E a Itália, neste caso, parece ser a fronteira do não retorno.

Nunca o euro, a sua zona política e mesmo o resto da União viveram algo semelhante.

O momento é de alarme absoluto, e uma parte da Europa, a que está em crise, vira-se para a Alemanha com o mesmo sentimento com que um jogador caído na ruína é capaz de parar à porta de um banco murmurando com ressentimento: "Estes, se quisessem, resolviam-me o problema." Pois resolviam. E se calhar até resolvem. Mas pelo menos precisam da certeza de que o homem se quer recuperar, que volta ao trabalho e deixa o vício.

2 A Europa sabe agora que cometeu um erro quando criou a moeda e não aprofundou logo de seguida o federalismo, pelo menos em matéria orçamental e fiscal. Criou-se a maior economia mundial mas o euro ficou entregue a 11 políticas diferentes, hoje 17 - e daí ao descontrolo foi aquilo que se sabe.

Em Portugal pode e deve haver divergências que radicam em diferentes conceções de sociedade, como em todo o lado. Mas não deveria haver dúvidas quanto ao trabalho que nos cabe na reorganização do Estado, nas reforma estruturais que tornem a economia mais competitiva, no controlo do défice e da dívida.

O País tem de fazer aquilo a que se comprometeu, e o que é necessário, sem desfalecimentos nem jogos políticos, pelo menos na área que vai do PSD-CDS ao PS. De resto, já sabemos com o que podemos contar: o quanto pior melhor.

O Bloco de Esquerda anda deslumbrado com o fenómeno Syriza, que promete na Grécia, sob uma crise tremenda, os resultados que Francisco Louçã imaginou para si há dez anos. E, por isso, o PCP, para não largar a vanguarda do descontentamento das ruas, lança esta moção de censura-surpresa. Só não é grave porque Portugal já interiorizou que estes partidos, sendo verdade que têm as mãos limpas em relação ao estado a que chegámos, na verdade também não querem ser parte de uma solução. Bloco e PCP são úteis como contrapeso à política de interesses que emana da cumplicidade negócios-poder, empresas-partidos e da relação capital-trabalho. Mas são absolutamente dispensáveis quando se fala da estratégia de governação e de soluções para o País.

3 O momento é delicado e pode piorar se as eleições gregas não servirem de base para uma solução política que forme um governo minimamente estável. Isso pode acontecer, e será legítimo. E se os gregos, como é seu direito, optarem por um caminho que não passe pela salvaguarda do seu lugar no euro, isso não pode afetar as convicções daqueles que entendem, como os portugueses sempre entenderam, que o nosso lugar é por aqui, na União e no euro. Só com essa convicção, alicerçada num sólido compromisso entre os três partidos que têm tido responsabilidades governativas, Portugal pode, e deve, passar a um plano de intervenção internacional que mostre que o País politicamente existe quando se discute a necessidade de mutualização da dívida ou o reforço do papel do Banco Central Europeu - tudo coisas que, de facto, nos interessam e ajudariam.

Esse papel apagado na cena europeia, que já foi o de Sócrates e hoje é o de Passos Coelho, é que de facto tem de ser ultrapassado, e depressa. Não interessa, não prestigia, nem sequer contribui para o jogo político europeu, no qual novas forças estão em movimento, e apouca o esforço que os portugueses continuam a fazer no dia a dia.

Vítor Constâncio até pode achar que Oliveira Costa, quando fundou o BPN, tinha de facto um extraordinário perfil para banqueiro. Só que dizer isso agora não é coragem. É falta de senso político. E cheira a desculpa, o que é pior...

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