Por uma melhor qualidade da vida

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Temos assistido nos últimos dias, ou melhor, andamos a assistir há já algum tempo a conversas quase burlescas.

O tema dessas conversas parece ser economia e finanças, ou mais especificamente sobre formas mais ou menos criativas de as praticar, mas para lá de muitas dessas criatividades há quase sempre negócios, esses sim bem lucrativos, envolvendo construção civil e imobiliário. Um imobiliário que se exprime apenas em metros quadrados dos terrenos e das construções, mais-valias obtidas, por autorizações nem sempre muito claras, e nos modos de multiplicar por muitas vezes aquilo que devia ser o justo lucro pelo investimento feito, mas que surge travestido numa espécie de milagre da multiplicação.

Todos sabemos que, pela sua própria estrutura, estas são atividades propiciadoras de grandes lucros, muitas vezes de difícil escrutínio.

Estranho é que nunca se tenha ouvido por parte destes investidores uma palavra, uma manifestação de intenções, mínima que fosse, de com estas práticas contribuírem para a resolução de um qualquer problema, ou mostrar a mais leve intenção de fazer bem e com qualidade.

Pode argumentar-se que a resolução dos problemas cabe ao governo e não aos particulares-negociantes-investidores. Menos desculpável é que a despreocupação para com a qualidade destes projetos seja total, e menos desculpável porque são muitas e gravosas as consequências para todos nós.

Sabemos bem como a banalização da construção, a não consideração para com a sua sustentabilidade, ou o uso indiscriminado e irresponsável dos terrenos disponíveis nos conduz à degradação da qualidade da vida que temos. Uma degradação de que posteriormente nos queixamos, causadora dos muitos problemas sociais, económicos, mas também de saúde pública com que periodicamente somos confrontados.

Problemas cuja solução deve passar pela melhoria das condições de vida. Uma melhoria que só pode ser atingida pela atenção a uma herança cultural, expressa pelo correto equilíbrio entre os aspetos culturais, sociais, económicos, ambientais e técnicos do planeamento e da construção.

Um esforço que passa por uma ação interdisciplinar envolvendo autoridades públicas e privadas, iniciada na educação, mas que deve refletir-se numa melhor qualidade do uso dos terrenos e dos processos construtivos, pois só assim poderemos aproximar-nos de uma sociedade mais inclusiva e sustentável. Uma sociedade com uma melhor qualidade de vida, diversidade cultural, justiça, coesão social e eficácia económica.

Voltamos assim à melhoria da eficácia económica que, ao que parece, é a preocupação das conversas referidas no início deste texto.

Importa ainda referir que todas as propostas, ideias e princípios aqui expressos estão longe de ser uma novidade. Foram expressos num documento-síntese, mais abrangente, chamado Declaração de Davos, assinado em 2018, também pelo então ministro da Cultura de Portugal.

Ex-presidente da Ordem dos Arquitetos

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