Por um referendo
Faz algum sentido que se tente impor discretamente e nas costas dos povos europeus, em relação ao futuro da UE, muito mais do que aquilo que já rejeitaram em referendos? Não, mas é isso que está a ser tentado.
A UE é um projeto extraordinário, que trouxe paz e autonomia alimentar, permite um mercado único a 27 países, financiamentos, investimentos, conhecimento, progressos científicos, livre circulação de bens, pessoas, serviços e capitais, com respeito pelos princípios democráticos e do Estado de Direito, num quadro institucional com deputados eleitos ao Parlamento Europeu, representação plena na Comissão e uma dimensão intergovernamental através do Conselho.
Mas se assim é, a rejeição de um caminho para o federalismo foi muito clara, quando franceses e holandeses chumbaram em referendos realizados em 2005, a Constituição para a Europa.
Na expressão feliz de Carl Bildt, o que os povos da União querem, é "mais Europa e menos Bruxelas." Não encontram motivo para um hino, ou outra bandeira que não a sua e veem nos contrastes do mosaico que nos forja uma vantagem a preservar e não a esbater. Querem que a UE se mantenha um projeto de Nações soberanas, e não que se transforme numa espécie de Estados Unidos da Europa.
É por isso que é inaceitável que, à boleia da ideia de futuros alargamentos, tantas vezes argumentados em quadros emocionais, mais do que racionais, se tentem agora mudanças radicais, com gravíssimas consequências para os países mais pequenos e menos poderosos, um dos quais Portugal.
No passado dia 19 de setembro, a Alemanha e a França apresentaram no Conselho de Assuntos Gerais um documento - Sailing on High Seas: Reforming and Enlarging the EU for the 21st Century - que, entre outras alterações, propõe o fim do direito de veto e a opção pela votação por maioria qualificada em matéria de recursos próprios, política externa e de segurança comum, o fim da regra "um Estado membro - um comissário", transferências de poderes de tributação para Bruxelas, e a redução significativa do numero de eurodeputados a eleger por um grupo de países (Portugal incluído).
O CDS-PP, fique claro, opõe-se e combaterá a deriva em curso.
O direito de veto surgiu em 1965, na sequência da "crise da cadeira vazia", quando a França se recusou a participar nas reuniões do Conselho, por estar em causa a defesa dos respetivos interesses vitais. Só por absurdo é que Portugal, menos influente, poderia prescindir da possibilidade de dizer "não" a decisões de política externa, segurança ou de natureza tributária, que afetassem gravemente os interesses estratégicos do país.
Por seu lado, numa UE criada como "projeto de iguais", aceitar-se que a Comissão tenha representantes de alguns países apenas, com os demais sem voz, nem poder próprio, submetidos ao arbítrio alheio, seria crime de lesa-pátria.
Já permitir-se a criação de uma máquina tributária em Bruxelas - área de soberania por essência -, com a possibilidade de lançamento de impostos ou encargos com impactos necessariamente assimétricos, tendo em conta a diferente realidade dos países, escaparia à racionalidade.
Finalmente, admitir-se uma representação insignificante de deputados portugueses no Parlamento Europeu traduziria um exercício de estupidez.
Alterações assim lesivas ou restritivas da soberania dos Estados, dando a franceses e a alemães uma posição inevitável de (ainda maior) predomínio, com o condão de reforçarem pelo sentimento de revolta todos os extremismos, não podem ser decididas sem uma ampla discussão e decisão dos povos, expressa em referendo. O CDS-PP não exigirá menos do que isso.
Líder do CDS-PP