Políticas de desenvolvimento: o país pode esperar?
Os episódios políticos da última semana, relacionados com os casos políticos que envolveram diversos membros do Governo - alguns pela sua gravidade ao nível da governação, outros pela incompetência e mesmo imponderação ou insensatez - geram enorme inquietude acerca da capacidade para implementar estrategicamente boas políticas públicas. Desde logo, porque nesta governação, de forma algo inexplicável, não têm emergido políticas públicas sectoriais capazes de responder aos grandes problemas e desafios socioeconómicos do país. Por exemplo, os dados recentemente divulgados pela Pordata acerca do mercado de trabalho indicam que, em 2021, os trabalhadores por conta de outrem ganhavam, em média, 1294 euros ilíquidos. Face a 2011, e descontando o efeito da inflação, o aumento foi de apenas de 118 euros. Também como indicam outros dados da Pordata, Portugal apresentou um PIB per capita 23% inferior à média europeia.
Acresce que Portugal é o sexto país, dos 27 da União Europeia, com o mais baixo PIB per capita (atrás de países como a Estónia, a República Checa, Chipre ou a Eslovénia). Ora, estes dados não podem deixar de inquietar, tanto mais que muitas famílias de classe média suportam uma forte pressão fiscal. Cabe ainda referir que, pela primeira vez desde 2014, a economia portuguesa caiu no Innovation Scoreboard 2021, ranking que mede a inovação das empresas da União Europeia, descendo da 12.ª posição para a 19.ª posição. Em 2021 a economia nacional deixou de ser considerada "fortemente inovadora" para passar a ser classificada como "moderadamente inovadora", uma categoria que partilhava com a Lituânia, a República Checa, Espanha, Eslovénia, Malta, Chipre e Itália. Em 2022 manteve-se "moderadamente inovadora", recuperando duas posições mas, ainda assim, ficando no 17.º lugar.
Dado que em política é crucial que se assegure junto dos cidadãos a confiança subjacente ao exercício do poder político democrático, não se pode reduzir a democracia a uma simples dimensão institucional, baseada na prática do sufrágio universal. A cada momento da sua história, a democracia desenvolve-se, exigindo permanentes respostas que assegurem credibilidade aos atores políticos e a respectiva implementação das políticas públicas. Assim, o Governo deve saber seleccionar para si, assim como para os cargos dirigentes da Administração Pública, as pessoas mais qualificadas, com ideias novas e que respondam às exigências do interesse público, promovendo uma renovação imprescindível e eficaz. Só assim mostrará capacidade para defrontar os desafios da dinâmica da democracia, simultaneamente evitando desnecessários escândalos associados a casos de nepotismo em cargos públicos.
A verdade é que, além da sucessão destes casos políticos, denota-se uma ineficaz implementação de políticas públicas aptas a responder aos problemas estruturais do país, assim como a um crescente aumento da opacidade da vida pública. Ora, a erosão deste elemento de confiança política pode ter efeitos muito nefastos a curto prazo no funcionamento da nossa democracia. Realçava o ensaísta português do século XX, António Sérgio, que a democracia "é o sistema em que se deseja para o cidadão o máximo da consciência" e é esta ideia dinâmica de Democracia que deve ser salientada.
Daí que embora se realce no discurso político o valor maior da "estabilidade" para a economia, é crucial não ignorar que a "transparência" (através da sujeição ao escrutínio público), assim como a "ponderação e a sensatez" na governação serão os valores mais relevantes da atividade política institucional. E perante estes episódios de degradação institucional - que podem prejudicar a implementação das políticas públicas para o desenvolvimento do país - a pergunta não pode deixar de ser: o país pode esperar?
Professora universitária e investigadora