Polícia segue a pista da Al-Qaeda

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A polícia britânica lançou uma vasta operação para identificar e deter os responsáveis pelos atentados de Londres, numa caça ao homem que inclui um apelo a todos os cidadãos para que mantenham a vigilância. As quatro explosões mataram mais de 50 pessoas (o balanço final ainda não foi divulgado) e feriram 700. Até à hora do fecho desta edição, não havia notícia de algum português figurar entre as vítimas.

Por enquanto, as autoridades mostram-se prudentes e pedem a paciência do público. Os atentados no metropolitano causaram estragos na estrutura dos túneis, sobretudo entre King's Cross e Russel Square. Ali, o tecto não está seguro e torna-se difícil recolher indícios e recuperar os corpos. Não há sequer certeza sobre o número de vítimas que permanecem no local.

A polícia pediu, entretanto, a ajuda dos londrinos e continua a recolher todas as pistas possíveis. Tendo em conta a dimensão das bombas e os estragos, tudo indica que os terroristas usaram explosivos plásticos (talvez de origem militar).

Pelo menos um dos atentados, no autocarro de dois andares que explodiu na Praça Tavistock (total de 13 mortos), pode ter envolvido um suicida, havendo relatos algo contraditórios de um homem, muito nervoso, com uma mochila, subindo e descendo as escadas interiores do veículo, um pouco antes da explosão. Estas informações foram ontem referidas pela Imprensa, mas ainda não estão confirmadas pelas autoridades.

Em resumo, acumulam-se provas de uma assinatura da Al-Qaeda, a rede terrorista de Ben Laden, o que coincide com a reivindicação, via Internet, de um autodenominado (e desconhecido) Grupo Secreto da Al-Qaeda da Organização da Jihad na Europa. Num pequeno texto, os militantes "regozijam-se por ser tempo da vingança contra o Governo cruzado e sionista britânico". Ali pode ler-se que o Reino Unido "está agora a arder com medo, terror e pânico". Na mensagem são lançados avisos explícitos contra a Dinamarca e a Itália, pela manutenção de tropas no Iraque.

Apesar de algum regresso à normalidade na circulação londrina, as áreas atingidas pelos rebentamentos ainda estão isoladas pela polícia, enquanto se procede ao exame do mais pequeno indício deixado no local. Esta será uma das bases da investigação, mas a polícia procura depoimentos de testemunhas, imagens de câmaras de vigilância e até registos nos movimentos das chamadas de telemóvel.

O chefe do departamento anti-terrorista da Scotland Yard, Andy Hayman, explicou que as bombas não tinham mais de cinco quilogramas cada. Hayman disse também que os engenhos estavam colocados sob os assentos, no caso do metro, e provavelmente no chão do autocarro, na explosão de Tavistock.

No rescaldo dos atentados, surgem também críticas em relação a eventuais falhas das acções preventivas da polícia. No entanto, os responsáveis pela segurança da cidade afirmam que nenhum indício prévio foi ignorado. O ministro do Interior, Charles Clarke, considerou que a detecção de potenciais terroristas é equivalente a "procurar uma agulha num palheiro". Mas, em Junho, o Governo decidiu reduzir o nível de alerta da ameaça terrorista, acção que Clarke reconheceu ontem ter sido "um erro".

Confrontado com uma declaração de Abril do responsável máximo da Scotland Yard, sobre a forma "clara" como membros da Al-Qaeda então "visavam a Grã-Bretanha", Charles Clarke mencionou a preocupação com a segurança em torno da reunião do G8, em Gleneagles, concluindo que não existira "qualquer aviso deste ataque" a Londres.

exemplar. No que se refere às vítimas das acções terroristas, a polícia informou ontem que a lista de pessoas em estado crítico é agora de 22. No próprio local das explosões foram tratados 350 feridos ligeiros e todos os relatos elogiam a atitude exemplar dos serviços médicos e de segurança. Muitos dos feridos tiveram membros mutilados ou extensas queimaduras. A dificuldade no acesso a alguns dos locais torna incerto o número de mortos, que se calcula ser acima de 50.

Alguns dos testemunhos são horrendos e evocam cenas de heroísmo de outros tempos. Um entre muitos exemplos é a história de Helen Long, contada pela AFP. Esta funcionária do metropolitano, durante duas horas ajudou a manter vivo um jovem chamado Paul, que tinha perdido a perna esquerda na explosão de King's Cross. Segurando a mão do homem, impedindo-o de perder os sentidos, a socorrista improvisada ainda ouviu os gracejos de Paul sobre a sua participação nos jogos paralímpicos de 2012.

Ontem, na hora do rescaldo, havia ainda confusão. Muitas pessoas procuravam desesperadamente, de hospital em hospital, os seus familiares desaparecidos. Pessoas como Yvonne Nash, de 30 anos, em busca do companheiro, Jamie Gordon, cujo último contacto foi um telefonema às 9 e 47, de Bloomsbury, não longe de Tavistock. Os casos dos desaparecidos são todos semelhantes, dramáticos, mencionam contactos telefónicos pouco antes das explosões, perto dos locais atingidos.

A Rainha de Inglaterra, Isabel II, tentou ontem animar os londrinos, em visita ao Hospital Real de Londres. "As atrocidades como estas", disse a monarca, "só reforçam o nosso sentido de comunidade".

Entretanto, decorrem reuniões de alto nível para coordenar as políticas de segurança. Na quarta-feira, os ministros do Interior da UE vão discutir em Bruxelas as consequências dos atentados de Londres e estudar medidas contra a ameaça terrorista. Em causa, há três pacotes legislativos harmonização da forma como as autoridades policiais dos 25 retêm dados telefónicos, troca de informação policial e mandato europeu de obtenção de provas.

As consequências políticas dos atentados não se limitam ao mundo ocidental. O grande mufti da Arábia Saudita, xeque Abdelaziz al-Sheikh, disse num sermão que todos os atentados que "visam pessoas que vivam em paz são proibidos pelo islão". Esta crítica não foi acompanhada por todos os religiosos do mundo árabe, mas foi repetida, talvez em tom mais suave, por outros líderes muçulmanos, mesmo de meios considerados radicais.

* Com Fernando de Sousa

em Londres

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