"Polícia das polícias" quer aceder a escutas para investigar agentes
A inspetora-geral da Administração Interna - a "polícia dos polícias" - quer aceder a escutas e aos dados das comunicações para investigar polícias no âmbito de processos disciplinares. A juíza desembargadora Margarida Blasco, que dirige a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) há seis anos, defende que esses meios de prova, quando recolhidos no âmbito de um inquérito criminal sobre a mesma pessoa, devem ser partilhados com os seus inspetores.
"Entendo que, considerando a coincidência entre objetos processuais (criminal e disciplinar) dever-se-á autorizar o instrutor a solicitar, diretamente, à autoridade judiciária, esses meios de prova", afirmou esta quarta-feira num seminário sobre "Direitos Humanos e Controlo Externo das Forças e Serviços de Segurança - uma reflexão sobre a experiência da IGAI". Esta conferência realizou-se no âmbito das comemorações dos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos 40 anos da adesão de Portugal à Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
Segundo a magistrada esta medida seria dirigida aos "processos de natureza disciplinar que entram na esfera de competência da IGAI, especialmente os casos de violação grave de direitos fundamentais por força da intervenção de elementos das forças de segurança (em que os factos praticados desencadeiam tambéma responsabilidade criminal dos respetivos agentes)" e, por isso, "deve ponderar-se a admissibilidade do recurso ao resultado da utilização no processo criminal dos novos métodos de obtenção de prova.
Margarida Blasco não escondeu as dificuldades da IGAI para desempenhar a sua missão - assegurar as funções de auditoria, inspeção e fiscalização de todas as entidades, serviços e organismos tutelados pelo MAI - principalmente devido ao número reduzido de inspetores (cerca de uma dezena) para um universo de mais de 40 mil polícias.
"O reforço de quadro de inspetores afigura-se fundamental para o desempenho adequado das tarefas que são legalmente confiadas à IGAI", sublinhou, adiantando que "muito brevemente" a IGAI vai passar a ter menos de 10 inspetores, "o que consubstancia um constrangimento efetivo do exercício da sua atividade".
Apesar de esta questão poder ficar resolvida com a aprovação de um novo quadro normativo da IGAI, em que será possível o desbloqueio das limitações ao recrutamento de novos funcionários, Margarida Blasco defendeu um quadro com pelo menos 17 lugares de inspetor.
"A vasta diversidade processual existente, sobretudo na área da auditoria e a manter-se a tendência de ligeiro aumento, considero que o quadro de inspetores deverá contemplar até, pelo menos, 17 lugares", sustentou a responsável pelo organismo que fiscaliza e controla as polícias.
No seu último balanço anual relativo ao ano de 2017, a IGAI revelou ter recebido 772 queixas contra a atuação das forças de segurança, o valor mais alto dos últimos quatro anos, revelam dados daquele organismo. No entanto, das 1380 queixas analisadas (algumas que transitaram também do ano anterior) apenas seis foram convertidas em processos de natureza disciplinar.