Poeta da 'Pedra Filosofal' revela-se em exposição
Quem não se lembra da Pedra Filosofal, cantada pela primeira vez por Manuel Freire, em 1969, no programa Zip-Zip e tão repetida ao longo dos tempos? (Eles não sabem que o sonho/é uma constante da vida/tão concreta e definida/como outra coisa qualquer...).
'António é o Meu Nome. Rómulo de Carvalho', poderia ter sido a resposta para quem trauteou vezes sem conta a canção, mesmo sem saber o nome do autor. E que também serve de título à exposição organizada pela Biblioteca Nacional (BN) a propósito dos cem anos do seu nascimento (inaugura na quinta-feira e vai até 6 de Janeiro). A mostra parte do espólio do autor, doado por familiares, nomeadamente a viúva Natália Nunes que o organizou, e dá conta de um homem multifacetado (ver caixa).
Falar de Rómulo de Carvalho (1906-1997), ou do seu pseudónimo António Gedeão, não é apenas falar de poesia. Quem acompanhou a sua vida e obra recorda que ele deixou "uma mão-cheia de estudos marcantes", e uma vasta obra como historiador das ciências, tornando-as acessíveis à compreensão de um público vasto.
Licenciado em Físico-Químicas, Rómulo de Carvalho era apaixonado por este universo. Adorava dar aulas no ensino secundário, o que fez durante 40 anos, não trocando o lugar por outro mais prestigiante.
Paixão pela marcenaria
"Não aceitou ser assistente da Faculdade de Ciências do Porto, porque preferia dar aulas a gente mais jovem, para os entusiasmar", recorda, ao DN, o seu filho Frederico Carvalho. Com que imagem ficou do pai enquanto criança? "Com a imagem de uma pessoa extremamente organizada, rigorosa e trabalhadora que me dava muita atenção, levando-me a espectáculos e muitas vezes ao Jardim Zoológico". Mas a memória mais fina remonta talvez ao tempo em que o pai "construiu toda a mobília do seu escritório, desde a secretária às estantes". Frederico Carvalho assegura, o pai confessava-lhe que "se não fosse professor gostava de ser marceneiro".
Rómulo de Carvalho começou a escrever aos 11 anos, mas às escondidas. Queria "continuar" Os Lusíadas, tendo sido publicados poemas seus no Almanache das Senhoras. Mas só se revelou como poeta em 1956 com Movimento Perpétuo, a que se viriam juntar outras obras como Teatro do Mundo (1958), Máquina de Fogo (1961), Poema para Galileu (1964), Linhas de Força (1967)e Poemas Póstumos (1983).
Colaborou em várias revistas (Árvore, Seara Nova, Távola Redonda, Portucale e Colóquio-Letras). Publicou inúmeras obras na área da História das Ciências e da divulgação científica, mas nestes tempos de recordar quem foi Rómulo de Carvalho, a Fundação Gulbenkian decidiu reeditar O Texto Poético como Documento Social , onde o autor analisa a poesia ao longo dos tempos como reflexo do que se passava na sociedade.
Inéditas, estão para sair as suas Memórias, em fase de preparação, a partir de 1100 páginas manuscritas que cobrem quase o período de um século. "Será uma bomba", diz o filho. Mais do que lembrar António Gedeão/Rómulo de Carvalho, a exposição da BN revelará novas facetas do professor e autor.