Pita, o tronco nu mais famoso do Rio 2016, quer brilhar nos Jogos Olímpicos de inverno
A galeria de protagonistas improváveis da história dos Jogos Olímpicos de inverno (onde até figura um quinteto português) está em vias de ganhar mais um nome, que já brilhou - literalmente - na vertente de verão. Pita Taufatofua, o tronco nu e besuntado mais famoso do Rio 2016, quer voltar ao palco olímpico: apesar de ser lutador de taekwondo e viver num clima tropical, o atleta tonganês anunciou que quer tornar-se esquiador e participar em Pyeongchang 2018.
"Passei toda a minha vida a perseguir o sonho de me tornar atleta olímpico e alcancei-o em 2016. Agora, chegou o momento de levar esse sonho olímpico um passo mais à frente", revelou Pita, num vídeo divulgado pelo Comité Olímpico Internacional. A sua nova fasquia é participar nos Jogos Olímpicos de 2018, em esqui cross-country (prova de longa distância). "O objetivo é mostrar às pessoas que, se eu o conseguir, eles também podem conseguir", sublinhou o lutador do reino de Tonga, um arquipélago da Polinésia (no Pacífico Sul).
Tamanha ambição - alguém natural de um país sem tradição nos desportos de inverno a alimentar a utopia de participar nos Jogos Olímpicos - não é inédita. Ficou célebre a participação de uma equipa jamaicana de bobsleigh em Calgary 1988, a mesma edição em que cinco portugueses (António Reis, João Poupada, João Pires, Rogério Bernardes e Jorge Magalhães) se aventuraram nessa difícil arte de deslizar um trenó por uma estreita pista de gelo. No entanto, Pita Taufatofua é um fenómeno à parte, pois já se tornou famoso desde os últimos Jogos Olímpicos de verão.
O lutador, de 33 anos, foi o porta-estandarte de Tonga na cerimónia de abertura do Rio 2016 e a sua imagem logo correu mundo. O visual de Pita - 100 quilos e 1,90 metros de altura, vestido com uma saia tradicional tonganesa e com o tronco nu e besuntado com óleo - tornou-se um tema viral nas redes sociais da internet. E "o besuntado de Tonga" (como ficou conhecido) até foi convidado para talk shows televisivos com momentos insólitos, como aquele em que a apresentadora Jenna Bush Hage (filha do antigo presidente dos EUA, George W. Bush), lhe espalhava óleos pelo corpo enquanto gabava os seus atributos físicos.
Ofuscado por essa fama súbita, o desempenho desportivo de Pita no Rio 2016 quase passou despercebido (foi afastado pelo iraniano Sajjad Mardani, por 16-1, na eliminatória do torneio de +80 kg). Contudo, o lutador, filho de um tonganês e uma australiana-britânica, já tinha conseguido o mais importante: a participação olímpica, ao fim de quase duas décadas de sacrifícios - seis ossos partidos, três lesões nos ligamentos, três meses numa cadeira de rodas, ano e meio de muletas e muitas horas de fisioterapia - e após promover uma recolha de fundos para custear a caminhada até ao Rio de Janeiro. E ainda voltou a brilhar na cerimónia de encerramento, ao surgir em palco durante a atuação da cantora Julia Michaels.
Tonga tem outro candidato
"A verdade não é glamourosa nem brilhante. A verdade é que tenho sofrido inúmeras lesões, que perdi mais combates do que ganhei, que passei por dificuldades financeiras e perdi amizades na busca pelo meu sonho. O que me orgulha não é a minha habilidade - existem tantos outros melhores do que - é a minha persistência: não paro", disse depois, nas redes sociais. E o mundo comoveu-se com a história do primeiro lutador de taekwondo a representar nos Jogos Olímpicos aquele pequeno reino da Polinésia com cerca de 100 mil habitantes e uma incipiente história desportiva - Tonga apenas tem tradição no râguebi e só conquistou uma medalha no maior evento desportivo mundial (prata de Paea Wolfgramm no boxe, em Atlanta 1996).
Agora, depois do pioneiro Bruno Banini (que se chamava Fuahea Semi e mudou de nome como parte do acordo de patrocínio de uma marca alemã), 32.º no luge em Sochi 2014, o arquipélago do Pacífico Sul prepara-se para voltar a ter um representante nos Jogos Olímpicos de inverno. Falta saber se será mesmo Pita: Makeleta Stephan, tonganês radicado na Alemanha, já participou nos mundiais de esqui no ano passado (ficou em último lugar) e também corre pela vaga no cross- country.