PIB brasileiro desilude. Quais os motivos e o que há a fazer em 2019?
Desempenho tímido, crescimento morno, retomada lenta, resultado aquém do esperado. As reações dos economistas espalhadas pela imprensa aos dados da economia do Brasil em 2018, divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, vão todos no mesmo sentido: o crescimento do PIB, de 1,1%, igual ao de 2017, desiludiu. Quais as explicações? E qual a receita para que daqui por um ano não se fale, novamente, em deceção?
Comecemos por aí: os analistas são unânimes a apontar a aprovação da reforma da previdência, já em discussão, que se prevê longa e aos solavancos, no Congresso Nacional, como primeiro passo. Depois, criar condições para atrair investimento. De resto, é ter fé numa conjuntura internacional favorável.
Por exemplo, esperar que no possível acordo comercial entre China e Estados Unidos, a primeira não decida comprar mais commodities dos segundos, porque isso pode diminuir o volume de bens deste tipo (matérias-primas ou produtos de produção em massa) que os chineses adquirem do Brasil.
"Estados Unidos e Brasil competem no mercado de commodities. Pode ser que haja uma guerra comercial menor mas pode ser que a China tenha que comprar mais do EUA para ter acordo. Dependendo de como for acordo, pode ser bom ou mau para as exportações brasileiras", afirmou Sílvia Matos, coordenadora do Boletim Macro, do Ibre-FGV, do Instituto Brasileiro de Economia, à edição brasileira da BBC.
Para ela, uma solução seria estabelecer mais parcerias. "Há espaço muito grande para o Brasil ter um papel mais relevante em relação à abertura comercial. O mundo hoje depende das cadeias globais de valor".
Todos os economistas veem como principal medida para colocar as contas do governo em ordem a reforma na previdência, por mais difícil que seja aprovar mudanças nas regras das reformas e das pensões. "Temos um elefante enorme na sala, que é a previdência. A solvência orçamental ainda não foi resolvida e há carência de recursos para outras áreas", diz Silvia Matos.
Para a fazer aprovar - maior teste ao governo de Jair Bolsonaro - são necessários três quintos dos deputados. Para já, o partido do presidente, PSL, parece ainda isolado e distante de conseguir seduzir os 308 parlamentares de um universo de 513 necessários, muitos em representação de lóbis que não desejam mudanças.
Mas a previdência, que se for aprovada nos termos em que o ministro da economia Paulo Guedes a apresentou ao Congresso poderá poupar cerca de 40 mil milhões de euros ao país em quatro anos, não resolve tudo. O investimento é a outra metade da equação.
"O investimento caiu 30% durante a recessão e só na guerra isso acontece. É uma queda brutal em país que já tem baixo investimento. O investimento tem a ver com a capacidade de crescer sem gerar muita inflação", diz Sílvia Matos.
O governo quer leiloar, ainda no primeiro semestre, 24 projetos de infraestrutura, como aeroportos, terminais portuários e a ferrovia Norte-Sul. Segundo Marcelo Portugal, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, processos de concessão na área de infraestrutura são capazes de injetar confiança na economia, mas demoram para serem revertidos em investimentos. "Isso leva tempo a representar crescimento efetivamente. É importante que o calendário comece este ano, mas o efeito seria para o futuro, já que são investimentos de longo prazo".
Economista-chefe da Rosenberg Associados, Thais Zara tem uma previsão de 2,8% para o PIB de 2019, mas diz que já sabe que terá de revê-lo após analisar o resultado de 2018. Entre outros fatores, ela destaca que deve haver um impacto negativo no início deste ano decorrente da tragédia em Brumadinho (MG), onde houve rutura de barragem da mineradora Vale, que deixou 171 mortos e 139 desaparecidos. "Isso deve afetar a indústria extrativa mineral e até os serviços relacionados àquela indústria", disse a economista, à BBC.
Marcelo Portugal também não espera nada de "fantástico" para 2019, mesmo que a reforma previdenciária seja aprovada. Diz acreditar em um resultado um pouco acima de 2% e que qualquer crescimento abaixo disso seria uma desilusão.
"Não existem vetores para o PIB crescer mais", afirma entretanto Antônio de Lacerda, professor da PUC ao portal UOL. Para ele, até mesmo a aprovação da reforma da Previdência, não será suficiente para fazer o Brasil crescer, porque isso depende de "políticas macroeconómicas e setoriais que impulsionem a economia". Ele cita medidas para baixar os juros ao consumidor, melhorar os níveis de emprego e salário do trabalhador, aumentar a produtividade na indústria e incentivar o investimento público.
Marcelo Muinhos, coordenador de estudos macroeconómicos da FGV, volta a focar no peso dos investimentos no PIB. "Está próximo a 16%, muito aquém de países como a China (40%) e de alguns latino-americanos, em torno de 25%". O investimento, defende o académico, é um dos indicadores mais importantes do PIB porque mostra a capacidade do país de continuar a crescer no futuro: "Quando uma empresa planeia aumentar a produção, ela investe em máquinas, transporte e infraestrutura, por exemplo, e esse índice cai, isso indica que os empresários não estão confiantes e, portanto, não pretendem ampliar a produção e se as empresas não crescem, deixam de contratar trabalhadores e de produzir mais, fazendo com que a economia desacelere no longo prazo...".
E para o mau resultado de 2018, sob o governo do impopular Michel Temer, o que contribuiu afinal? A crise cambial na Argentina, terceiro maior comprador de produtos brasileiros, os juros altos nos EUA, a desacelaração e as incertezas europeias, com o Brexit à cabeça, no plano internacional.
Além da greve dos camionistas, no fim de maio, que gerou paralisações e desabastecimentos nas maiores cidades do país. "Nem todos os efeitos eram recuperáveis e há estimativas de perdas capazes de ter roubado 1,2 ponto percentual do crescimento do ano", aponta Sergio Vale, econonimsta-chefe da B Associados, à revista Exame.
Outro fator foram as eleições, com a perspetiva a dado ponto de vitória de Fernando Haddad, o mais temido pelos mercados, e até pelo temor com Bolsonaro, cuja carreira política sempre foi pautada mais pelo estatismo do que pelo liberalismo económico.
Em São Paulo