Pessimismo
O mundo está perigoso. Por via democrática, isto é, através do voto popular, temos assistido nos últimos tempos à ascensão de personagens políticas de perfil tenebroso. Nas Filipinas, por exemplo, o novo presidente eleito é um populista de meter medo, como todos os populistas, sejam eles de esquerda ou de direita. Propõe-se reintroduzir a pena de morte abolida há dez anos e enforcar "duas vezes" os condenados até que "a cabeça se separe do corpo". E é um adepto ferrenho da justiça popular e do atirar primeiro e perguntar depois. Nos Estados Unidos, Donald Trump e o seu discurso misógino e xenófobo está na pole position para assegurar a nomeação republicana às presidenciais americanas e, dizem as sondagens, ameaça chegar à Casa Branca prometendo, entre outras coisas, acabar com o controlo de armas e deportar os imigrantes. Na Europa, os austríacos deram a vitória à primeira volta das presidenciais ao candidato da extrema-direita que, sem qualquer pejo, faz afirmações racistas e assume um discurso que raia o nacional-socialismo alemão de outros tempos. Em França, Marine le Pen e as suas posições atentatórias do mais elementar humanismo são cada vez mais populares. Pelo caminho, figuras como o húngaro Viktor Orbán e outros responsáveis políticos europeus têm investido em derivas ideológicas ameaçadoras da dignidade humana e de liberdades elementares que põem em causa os mais básicos valores europeus como a solidariedade e a tolerância. Estes são apenas alguns exemplos. E nada disto é surpreendente. Os povos europeus, como os do resto do mundo, sentem-se desiludidos e descrentes com o presente que o destino lhes reservou. As economias estão anémicas, o desemprego é elevado e as oportunidades são escassas, e os políticos desbarataram todo o seu capital de credibilidade com promessas vãs de amanhãs que cantam e contradições absolutas entre aquilo que se diz e aquilo que se faz. Este caldo é terreno fértil para os demagogos e os inimigos da liberdade e da civilização. Portugal ainda é, apesar de tudo, um oásis neste mundo perigoso. Mas não tenhamos ilusões, o sucessivo défice de participação eleitoral é sintoma de um país entorpecido e alheado à espera de um qualquer D. Sebastião vindo da bruma. Sabemos, pelas lições da história, que não há nada pior para as democracias do que o sebastianismo messiânico. E de duas, uma: ou acordamos todos ou, um dia destes, entramos num pesadelo sem saída. Não é pessimismo, é realismo.