Política à parte, o grande confronto eleitoral de ontem na Guiné-Bissau trava-se entre um balanta (Kumba Ialá) e um biafada (Malam Bacai Sanhá). Ambos muçulmanos, embora Ialá seja convertido, o que até pode jogar a seu favor junto da comunidade islâmica, pois sempre é considerado um "iluminado" que veio das trevas e abraçou a luz. Uma das razões pelas quais nunca houve um forte candidato muçulmano eleito por todos os que professam esta religião na Guiné-Bissau, sobretudo fulas e mandingas, prende-se com um acontecimento histórico que remonta aos anos 1863/69, altura em que os fulas que viviam no Império Mandinga de Gabú pedem ajuda ao Império Fula de Futa-Djalon para se sublevarem perante estes no que ficou conhecido como a batalha de Cansalá, incompatibilizando assim para sempre estas duas etnias. Ora segundo as estatísticas, a etnia fula é a segunda maior do país, sendo a maioritária a balanta de Kumba. Os fulas, geralmente considerados os mais instruídos, são também os que estão mais pulverizados em termos de presenças por todos os partidos guineenses, bem como os mais flexíveis em termos de canalização e/ou fidelização de votos. Os fulas apenas são inflexíveis quanto a um detalhe, jamais votarão num mandinga, em consequência do facto histórico descrito. Os balantas são, por outro lado, das etnias mais inflexíveis quanto à canalização do seu voto, pois só votam em candidatos da sua própria etnia. Ialá não contará certamente com os votos das etnias papele, bijagós e mandinga, pois consideram que foram balantas que assassinaram os generais Ansumane Mané, Veríssimo Seabra e Nino Vieira. Mas, por outro lado, receberá o voto de grande parte da estrutura militar, cuja maioria está balantizada..Malam Bacai Sanhá é biafada, pelo que receberá em massa os votos da etnia mandinga, o que significa também dizer os votos dos próprios biafadas, da etnia jacanca e da etnia saranculé, já que estes foram todos islamizados pelos mandingas, havendo entre estas quatro etnias uma aliança cultural, social e religiosa.