PERFIL: Zelinsky, um Presidente virtual que pode tornar-se chefe de Estado real

Redação, 19 abr 2919 (Lusa) -- A televisão projetou a sua imagem, na função de comediante, mas agora afirma com pose séria que o seu país, Ucrânia, tem de fazer a opção entre permanecer no passado ou apostar no futuro, elegendo-o para Presidente.
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A popularidade de Volodymyr Zelensky, 41 anos, ator, humorista, o candidato mais votado na primeira volta das presidenciais ucranianas e que segue à frente das sondagens, reflete o desejo da população por um líder que não possua ligações com a "corrupta elite política" ucraniana.

E com capacidade em propor um novo caminho para solucionar os cinco anos de conflito com os separatistas pró-russos do leste da Ucrânia (13.000 mortos desde 2014).

Nos seus programas na televisão, Volodymyr Zelensky não hesita em se qualificar de "comediante", sem qualquer experiência política, mas surge agora em posição de se tornar no líder do país na vida real.

A sua candidatura, anunciada durante a celebração da passagem de ano em 31 de dezembro passado, foi de início interpretada como uma brincadeira, mas três meses mais tarde os resultados tornaram-se muito sérios.

Perante uma surpresa quase generalizada, Zelensky esmagou os seus rivais na primeira volta presidencial em 31 de março com mais de 30% dos votos, quase o dobro do Presidente cessante Petro Poroshenko que vai defrontar domingo, na segunda volta do escrutínio.

O popular humorista não se envolveu numa campanha tradicional, e preferiu continuar a surgir em palco com a sua equipa de apoio e exprimir-se nas redes sociais, em detrimento das televisões e jornais. Acabou por aceitar um único debate com o rival, que decorrerá hoje em Kiev.

A rejeição das elites, uma atual tendência internacional, é particularmente acentuada na Ucrânia, onde a população é confrontada com incessantes escândalos de corrupção.

E os ucranianos parecem decididos em apostar num "mágico" que com a sua varinha resolva os graves problemas desta ex-república soviética.

O ator, que promete aos ucranianos uma "nova vida sem corrupção" é natural da cidade industrial de Kryvy Rig (centro da Ucrânia), e filho de pais judeus. Licenciado em Direito, com dois filhos, foi na carreira artística que Zelensky acabou por ficar conhecido.

Diretor artístico do estúdio "Kvartal 95", os 'media' locais referem que é cofundador de um conglomerado de empresas especializadas em diversão, conhecida na Ucrânia e na Rússia pelos seus espetáculos e séries televisivas.

Assim, na série "Servidor do povo", interpreta um professor de História que se tornou Presidente após um vídeo viral no qual critica a corrupção.

Alguns analistas referem que, inconscientemente, pretende desempenhar uma função que já desempenhou no ecrã. E uma parte importante da população acredita nele, e dispôs-se a dar-lhe o voto.

O ator foi acusado, incluindo pelo chefe de Estado cessante, de ser uma "marioneta" do polémico oligarca ucraniano Igor Kolomoïski, o segundo ou terceiro homem mais rico do país, também de origem judaica, que mantém más relações com Poroshenko e cujo canal televisivo 1+1 seguiu com particular atenção e de forma positiva a campanha do humorista. Volodymyr Zelensky rejeitou estas acusações.

O vencedor da primeira volta rodeou-se de reformadores e assegurou pretender manter a opção pró-ocidental do seu país, mas também promover negociações com a Rússia, envolvendo Estados Unidos e Reino Unido, para resolver o conflito no leste do país.

Após diversos encontros políticos considerados desastrosos pelos seus participantes no início da campanha, Zelenskiy acabou por se demonstrar mais convincente face a diversos patrocinadores e apoiantes ocidentais de Kiev, ao descrever as grandes linhas da sua futura política económica.

Desta forma decidiu endurecer o discurso contra a Rússia, referindo pretender pedir ao Kremlin compensações pela anexação da península da Crimeia e o sangrento conflito no leste do país com os separatistas, que segundo Kiev e os ocidentais são apoiados militarmente por Moscovo.

No decurso da intensa campanha para a segunda volta, o gabinete de Zelensky acusou os responsáveis da campanha de Poroshenko pela divulgação de um vídeo no qual o comediante é atropelado por um camião pesado. O vídeo foi considerado uma clara ameaça que implicou medidas de segurança adicionais.

A campanha de Poroshenko negou a responsabilidade pela divulgação do vídeo, e a polícia ucraniana disse que foi iniciada uma investigação criminal sobre o incidente.

Após a anexação da Crimeia pela Rússia e um pouco antes do início da guerra no leste do país, Zelensky tinha optado por um tom conciliatório ao referir estar disposto a "ajoelhar-se" para evitar um "conflito militar" entre os dois "povos irmãos".

Ao mesmo tempo que endureceu o discurso, defendeu a realização de um referendo para a adesão da Ucrânia à NATO.

A sua abordagem face a um conflito que não pode ser resolvido militarmente parece manter-se um dos seus maiores trunfos, face ao "belicista" Poroshenko.

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