"Patrões dizem aos estagiários: vai ali ao multibanco e levanta 35% do salário"

O presidente do Conselho Nacional da Juventude, Hugo Carvalho, diz que há jovens que são forçados pelos patrões a devolver parte do salário que é depositado na conta
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Veio a uma atividade da JSD. As jotas tentam influenciar e pressionar a atividade do Conselho Nacional da Juventude (CNJ)?

Sim. Mas fazem-no de forma completamente legítima porque na direção do CNJ estão eleitas as juventudes partidárias da JSD, da JS, da JCP e da JP. É natural que sempre façam por fazer vingar as suas agendas e ainda bem que assim é.

Denunciou que os jovens pagavam a taxa social única em vez das empresas. Como está esse processo?

Denunciámos uma fraude. Basicamente, um estagiário licenciado deve receber 691 euros. E a empresa, se for com fins lucrativos, é apoiada pelo Estado em 65% deste valor, e há muitas empresas e entidades empregadoras de Portugal, nos setores da advocacia, na arquitetura, na psicologia, em que os estudantes têm de, forçosamente, fazer um estágio da ordem para aceder à profissão - as empresas não estão habituadas a pagar estágios. O que acontece? A empresa diz: muito bem, mas não gasto nem um cêntimo contigo. Portanto, todos os meses vais, se fazes favor, ao multibanco, levantas os 35% que faltam. E há ainda casos em que levantavam os 35% mais os encargos da Segurança Social para dar aos patrões. Tudo em numerário. É dinheiro que fica nas mãos dos patrões que não é sequer contabilizado. Estes casos são muito graves e são em número preocupante.

Qual a ordem de grandeza destes casos?

Centenas.

O Instituto do Emprego e Formação Profissional ouviu-vos para acabar com a fraude?

Nós imediatamente pedimos reunião ao secretário de Estado e ao IEFP. Ao secretário de Estado já foi a segunda vez e estamos há meses à espera. Sobre o IEFP o que conseguimos foi compilar seis ou sete situações diferentes de casos: uns têm a ver com as empresas e outros com o próprio IEFP. O IEFP demora, em média, quatro ou cinco meses a apresentar uma candidatura de estágio. E a candidatura é isto: a empresa faz o recrutamento, escolhe a pessoa, entrega a documentação e o plano de estágio ao IEFP. O IEFP só tem de dizer que sim e validar que está ali a criação de um posto de trabalho. Mas demora cinco meses a dar um sim. Assim, a pessoa fica cinco meses a trabalhar sem receber nada e, depois, a determinada altura o IEFP aprecia favoravelmente a candidatura e começa então o estágio que vai durar mais nove meses.

O IEFP acaba por promover um trabalho não remunerado?

Exatamente. E é uma decisão que não é nada de mais. Isto é um problema gravíssimo. Levei todos estes casos ao IEFP numa reunião com o presidente. Queria conhecer o lado do IEFP, mas o IEFP só quer que o CNJ denuncie as empresas. Mas nós representamos os jovens que vieram ter connosco e não os vamos trair. As pessoas estão verdadeiramente assustadas. E eu sentei-me na reunião com o presidente do IEFP, que me disse, basicamente, que ou estava lá para lhe entregar as empresas ou não estava lá a fazer nada. Disse-lhe que queria uma solução de sistema, que passe por ter segurança de que os jovens não sofrem consequências. O IEFP podia trabalhar nisto, mas não quer.

Continuam a lutar para que o Conselho tenha assento na concertação social?

Isto já dura há duas legislaturas. Já deram entrada projetos de lei do PS, do PSD e do BE, de incluir o CNJ na concertação social. Mas não foram votados e os projetos caducaram. São metidos na gaveta.

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