Património

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Os especialistas da UNESCO que visitaram Sintra ficaram satisfeitos com a preservação do património da vila, mas muito preocupados com a selva de betão que ameaça sufocá-lo. Se visitarem o Douro, outro sítio declarado Património Mundial, a preocupação não será menor, logo a começar pelo facto de a cultura em socalcos, característica principal da paisagem daquela zona e factor fundamental para a classificação, estar a ser progressivamente abandonada. E, é claro, nem vale a pena falar do resto, do que nunca poderá ser classificado, ou simplesmente preservado, porque já foi irremediavelmente destruído. Quase toda a faixa litoral do país está nessas condições, ou sob forte ameaça, havendo igualmente outras zonas que merecem preocupação.

A serra da Estrela tem constituído um relativo oásis na destruição da paisagem portuguesa. Relativo, porque a pressão, nomeadamente nos principais centros urbanísticos que a rodeiam, é bem evidente. E relativo, ainda, porque é igualmente evidente o enorme impacto dos incêndios das últimas décadas.

O Governo prepara-se agora para desclassificar algumas áreas do parque natural, o instrumento que tem impedido o avanço do betão. Em causa estão, fundamentalmente, áreas contíguas às zonas já urbanizadas, as chamadas áreas de transição. Algumas dessas áreas estão já irremediavelmente perdidas por causa dos incêndios - uma assinalável coincidência entre a eclosão das chamas e o avanço do betão.

Os autarcas da Estrela têm razão, quando se lamentam da desertificação, do desemprego, da falta de oportunidades. E até o mais distraído turista compreende que o turismo do passeio de carro pela serra, além de nenhuma riqueza trazer à terra, ainda contribui para o seu empobrecimento, por causa da poluição que causa e pela fraca exigência (e correspondente mau comportamento) deste tipo de turistas.

Entre a posição dos ambientalistas, que desatam a disparar quando ouvem falar em turismo ou investimento, e a dos autarcas, para quem essas palavras são sinónimo de sobrevivência (própria, é certo, mas também das populações), há-de haver possibilidade de compromisso aceitável.

É possível construir, com qualidade, sem ferir a paisagem. É possível conciliar a preservação da natureza com a exploração turística. Mas a experiência portuguesa não é das mais recomendáveis. O caso da serra da Estrela merece ser acompanhado com toda a atenção nos próximos anos.

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