Património revê regras de uso de monumentos
O inquérito realizado pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) aos acontecimentos revelados por uma reportagem da RTP sobre danos provocados no Convento de Cristo, em Tomar, pela equipa de filmagens de O Homem que Matou D. Quixote conclui que as situações descritas no referido programa, emitido a 2 de junho, "carecem de rigor, outros são falsos e revelam desconhecimento científico", lê-se no relatório, a que o DN teve acesso.
Apesar de desvalorizar as denúncias apresentadas pela reportagem do Sexta às Nove, e considerando a DGPC que o inquérito a este caso concreto "atesta que as filmagens foram antecedidas de uma avaliação criteriosa", a direção-geral liderada por Paula Silva anunciou ontem que irá rever as regras de utilização dos museus, palácios e monumentos sob a sua tutela, tendo em vista que "pode e deve ser melhorada".
Nesse sentido, revelou, foi já iniciada a revisão do Regulamento de Utilização de Espaços "com o propósito de uniformizar critérios de utilização e reforçar as exigências às empresas que solicitam o aluguer". A nota da DGPC adianta ainda outra medida: a criação de uma "unidade interna permanente nos serviços centrais" da DGPC, "que se pronunciará previamente sobre todos os aspetos de segurança relativos às pretensões de utilização dos espaços, tanto a nível patrimonial, como humano".
Auditoria às bilheteiras
A referida reportagem, para além de relatar estragos no Convento de Cristo em Tomar em consequência das filmagens, avançava também com a denúncia de uma alegada corrupção na bilheteiras do Convento de Cristo. Sobre esta questão, que não fazia parte do inquérito agora executado, a DGPC anunciou "que a Unidade de Auditoria Interna vai realizar uma auditoria à gestão da receita própria dos três monumentos Património da Humanidade localizados na região Centro do País (Convento de Cristo, Mosteiro de Alcobaça e Mosteiro da Batalha), com conclusão prevista para 31 de outubro próximo".
Recorde-se ainda que, tal como o DN noticiou a 6 de junho, também o Mosteiro dos Jerónimos está a ser investigado, neste caso pelo Ministério Público após auditoria da DGPC que detetou várias irregularidades na gestão do monumento.
"Não foi ateada uma fogueira"
O relatório do inquérito aos estragos provocados pela equipa de filmagens do realizador britânico Terry Gilliam, em abril, no Convento de Cristo, dá conta das diligências feita pela equipa, liderada pela jurista Maria Isabel Menezes, acompanhada por dois técnicos superiores da DGPC que se deslocaram ao Convento de Cristo a 8 de julho e refuta vários dos factos apresentados no Sexta às Nove. "Não foi ateada uma "fogueira" com cerca de 20 metros de altura", é a primeira conclusão apresentada pela jurista. Segundo o documento, entregue ontem na Assembleia da República, a alegada "fogueira" no Claustro da Hospedaria constituiu um efeito cénico especial, que teve a duração de 4/5 minutos, e foi realizado "a partir de uma estrutura piramidal tubular em aço com 8,04 m de altura e 6,4 m de base". No interior da estrutura metálica foi montado "um sistema do tipo "rampa de gás propano" constituído por 8 níveis de queimadores regularmente espaçados, guarnecidos com válvulas antirretorno de fecho rápido".
O relatório refere ainda que "o efeito cénico foi levado a cabo por uma empresa especializada, de seu nome Reyes Abades, referenciada na indústria dos efeitos especiais para cinema e experiente em filmar em monumentos históricos na Europa", referindo ainda que "foram instalados sprinklers (uma espécie de chuveiros de água) no Claustro da Hospedaria" e, "à medida que o fogo subia para o nível seguinte, o nível anterior era apagado, conforme descrição dos responsáveis dos Bombeiros". O documento refere ainda que "durante o efeito cénico de fogueira estiveram sempre presentes sete cameramen, atores e figurantes, o que indica que as temperaturas no local não eram muito elevadas".
Sobre as paredes supostamente enegrecidas pelo fumo, o relatório refere que "não corresponde a vestígios de fogo mas sim à proliferação severa de espécies biológicas" situação que já fora "identificada e analisada num estudo realizado pelo LNEC [Laboratório Nacional de Engenharia Civil] no ano de 2002".
O relatório refere ainda que "o valor de 2.900 euros apresentado pela empresa de restauro" CaC03, que avaliou os danos após as filmagens, é também uma prova de que os estragos constatados e assumidos pela produtora Ukbar Filmes "não são significativos": quebra de quatro fragmentos pétreos e de seis telhas.