Um esforço estrutural que "foi dos mais significativos", uma alteração na forma de contabilizar o défice e a resolução de um banco (o Banif) são os argumentos de Pedro Passos Coelho para criticar o castigo que Bruxelas decidiu aplicar a Lisboa. "O défice de 4,4% deve-se no essencial à resolução de um banco. Sem isso, Portugal não teria tido mais de 3% de défice. Então não devia haver sanções", explica o ex-primeiro-ministro, numa entrevista ao DN e à TSF, que será publicada e transmitida amanhã..O Ecofin decidiu nesta semana seguir a orientação da Comissão e multar o país por ter violado o défice em 2015, mas o valor da multa - que também foi decidida para Espanha - ainda está por definir. E pode ser zero. Muito dependerá do esforço de ajustamento estrutural feito pelo governo de António Costa e das medidas adicionais incluídas no Orçamento do Estado para 2017 - que Bruxelas queria ver antes mas o governo decidiu que só lhe faria chegar quando o documento fosse apresentado no Parlamento português..[destaque:Processo das sanções "diz bastante da desorientação que existe em Bruxelas face a estas matérias"].O líder social-democrata considera "incompreensível" a decisão de aplicar sanções a Portugal e ataca a Comissão Europeia pela dualidade de critérios demonstrada em relação às economias de Lisboa e Madrid, por oposição, por exemplo, à de Paris. "Portugal foi dos países que mais esforço estrutural fizeram, um esforço muito superior a França. Como é possível dizer que França fez esforço efetivo quando o nosso foi muito superior? Há qualquer coisa aqui que não é transparente.".Esta diversidade de tratamento foi assumida pelo próprio presidente da Comissão Europeia - e provocou uma forte reação do presidente do Eurogrupo. Em junho, questionado sobre o tratamento preferencial dado a Paris - que tem mais dois anos para cumprir a meta do défice -, Jean-Claude Juncker afirmou simplesmente que França merecia maior indulgência "porque é a França". Jeröen Dijsselbloem pediu sensatez, mas um mês depois a realidade confirmou a retórica: nada de sanções para França, apesar de ser o pior transgressor, com 11 violações não autorizadas entre 2002 e o ano passado (contabilizou o instituto alemão Ifo)..Responsabilidade repartida.Ainda assim, Pedro Passos Coelho reparte as culpas pelo castigo que a Comissão decidiu aplicar a Portugal entre Bruxelas e o governo de António Costa. Na mesma entrevista, que teve lugar ontem nos estúdios da TSF, em Lisboa, o líder da oposição critica a posição do primeiro-ministro, que acusa de não ter sequer tentado convencer Bruxelas da influência de uma alteração na fórmula de cálculo do défice pelo INE..Com o esforço estrutural feito, "que foi dos mais significativos", o ex-primeiro-ministro garante que o défice teria ficado nos 2,8%. Porém, continua o ex-governante, "em 2015 houve uma retificação estatística que transformou uma melhoria numa degradação do esforço adicional - era o que era necessário para atingir o objetivo de médio prazo", assegura. "O governo [de Costa] tinha obrigação de ter discutido isso com a Comunidade Europeia, mas nem tentou. Antes aceitou que este fosse o ponto de partida para 2016", lamenta o presidente do PSD.."Dizer que não houve esforço efetivo, que tivemos um saldo estrutural pior do que tínhamos registado apenas porque houve esta alteração estatística (e nenhuma alteração de política), torna a decisão da Comissão Europeia incompreensível. E é incompreensível porque só pode acontecer com a passividade do governo português.".Com todos estes fatores ponderados, Passos considera que o processo das sanções "diz bastante da grande desorientação que existe em Bruxelas face a estas matérias e da prática seguida pelo atual governo", cuja retórica política diz ser "cínica"..Uma questão de tempo.O anterior primeiro-ministro faz ainda duras críticas aos argumentos da Comissão Europeia para justificar o castigo aplicado a Portugal por ter ficado duas décimas acima do limite do défice definido no Pacto de Estabilidade. O líder da oposição diz que não fazem sentido se o que se pretende é que funcionem como uma espécie de aviso para o país apresentar um Orçamento do Estado para 2017 que garanta cortes adicionais no défice e a manutenção da trajetória descendente.."Não é possível dizer que se está a sancionar o passado, mas que não há sanções se houver medidas que corrijam a trajetória deste ano", afirma Pedro Passos Coelho na entrevista ao DN e à TSF. "Não se entende. Ou a análise é sobre o passado e há multas, ou então o problema é a trajetória que está a ser seguida e não se vai invocar o passado." E conclui: "Não entendo o que se está a passar."